Vasco Pulido Valente
"Espírito Partidário"

Alberto João Jardim declarou que, se o dr. Cavaco desejava a maioria absoluta do PS, devia ser expulso do PSD. Portugal conhece o homem e não o leva excessivamente a sério. Mas, desta vez Jardim, na sua alegre inconsciência, tocou num ponto essencial. A saber: está ou não um militante ou dirigente de um partido, com muita ou pouca influência, obrigado a votar nele e, mais do que isso, a sustentar e apoiar qualquer política desse partido e qualquer candidato a primeiro-ministro, que o partido resolva apresentar? Ou, por outras palavras, quando um indivíduo se inscreve num partido, abdica por esse facto do seu juízo independente e da sua liberdade de acção, mesmo nas circunstâncias mais graves? Vejamos, por exemplo, o caso de Santana Lopes. Em primeiro lugar, Santana levou o PSD para um populismo que nega tudo, quase tudo, o que ele até agora foi. Não chega isto para lhe fazer uma oposição pública e tentar que ele sofra uma derrota definitiva e clara em 20 de Fevereiro, permanecendo fiel, e porque se permanece fiel, ao PSD "histórico"? Diz Marcelo, usando um argumento comum, que o PSD é a sua "família". Só que precisamente o PSD não é, e não pode ser, a "família" de ninguém que se reconheceu no PSD de Sá Carneiro ou de Cavaco. Nenhum princípio vale contra o interesse imediato da seita? Admitamos que não. De qualquer maneira, fica ainda a questão de saber se ajudar Santana, nem que seja pelo silêncio, serve a prazo o PSD. Não vale a pena insistir no descrédito pessoal de Santana Lopes e, no descrédito, que ele naturalmente trouxe ao Governo e, por implicação, ao país. Basta imaginar o futuro do PSD com ele à frente. Para primeiro-ministro (uma hipótese absurda) já não tem, e de facto nunca teve, a autoridade e o prestígio, que o tornem aceitável ou, pelo menos, respeitado. O circo iria fatalmente continuar. Como chefe da oposição, o seu total isolamento político (hoje consumado) deixava o PSD num beco sem saída. A lógica aconselha, portanto, um militante ou dirigente do PSD a não sustentar ou apoiar Santana e a não votar PSD. Parece paradoxal, mas não é. Nestas coisas não são raros comportamentos suicidas. Muitos partidos morreram por espírito partidário. O PSD não precisa de um "bom" resultado em 20 de Fevereiro, precisa de um resultado que o livre de Santana. E precisa de perceber isso a tempo.

in Público

Publicado por Manuel 08:16:00  

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