Iceberg à vista ?

O título deste post deveria ser similiar ao título do filme " Eyes wide shut", mas porque uma análise económica nunca deve ser influenciada por um combate político, e porque ainda há quem veja "rosas", onde começam a surgir espinhos, nada como basear-nos em factos e deles e só apenas deles deduzirmos as nossas intuições de pensamento económico

1. Contribuição para Crescimento do PIB


Ao analisar esta série , desde o 2º trimestre de 2003 até ao 3º trimestre de 2004 ( 6 períodos ), é possível percebermos duas situações :

  • Quanto mais o PIB cresce, menor é a contribuição da procura externa líquida para o mesmo crescimento. Aliás o facto ocorrido no 3º Trimestre de 2004, demonstra que a curva da contribuição da procura interna, faz o mesmo trajecto que a do PIB.
  • A contribuição da procura interna para o crescimento do PIB, é de tal forma brutal, que em 2004 nos 3 trimestres já decorridos ela cresce acima do valor do crescimento do PIB. Descontando o efeito negativo da procura externa temos o crescimento do PIB.

Por muito que se pode querer dar a volta e sem colocar nada nem ninguém em cheque, nem sequer atribuir responsabilidades a quem quer que seja, ver neste modelo de crescimento algo que possa ser considerado como sustentável e desejado, é algo que me recuso a partilhar.

Primeiro porque quando a procura interna cresce acima do PIB, e é esta a variável que se assume em terreno positivo, falamos de imediato em aumento da taxa de endividamento. Algo que penso também concordarmos ser negativo para a economia.

Ora esta situação de a procura externa contribuir negativamente para o crescimento económico, é algo estrutural e não conjuntural. Não é um problema do governo A,B ou C, mas sim dos seguintes factos :

  • Falta de competitividade dos produtos portugueses de uma forma geral, sobretudo e associado com as históricas desvalorizações que o escudo sofria, por forma a induzir uma competitividade inexistente.
  • Falta de uma estrutura produtiva interna, capaz de suportar os choques assimétricos da procura interna na busca de produtos e serviços, aquando do aquecimento desta.
  • A razão pela qual as importações decaem quando o PIB diminui, explica este último ponto. Um diminuição da actividade económica, induz uma diminuição do consumo e como tal das necessidades de produção interna.

Depois, outra consequência de uma procura externa líquida negativa, leva a um aumento do défice comercial, e consequentemente a um aumento das necessidades de financiamento externo. Ou seja, a procura interna é satisfeita com financiamento interno. O aumento do défice comercial, com aumento das necessidades de financiamento externo.

Nada disto é empírico. São factos que a economia portuguesa têm. Ora aos Doutores Anónimos que pelas caixas de comentários nos têm presenteado com interpretações legítimas - ainda que usadas por Santana Lopes em debates televisivos recentes - , uma primeira pergunta : Concordam com o crescimento baseado á custa do financiamento interno e externo ?

2. O Estado e o défice

Não me vou alongar muito, porque os valores necessários ao cumprimento dos 3,00 % são sobejamente conhecidos. Os valores e a forma como os conseguir.

No entanto, não deixo de realçar o quadro abaixo, que reflecte o crescimento das despesas com pessoal em %, face ao crescimento do PIB. Quando as despesas com pessoal crescem acima do PIB, há algo que não está muito bem. Pior aumentam as necessidades de financiamento do sub-sector Estado.



3. O Investimento

O investimento rompeu pela primeira vez no 3º Trimestre de 2004, para taxas positivas.

Um bom sinal sustentado em três maus indicadores :

  1. O galope das obras públicas em ano de pré-eleições autárquicas.
  2. O recurso ao crédito para compra de habitação
  3. A diminuição drástica das previsões de encomendas de maquinaria



Por outras palavras, um investimento que não tem sido capaz de gerar emprego. Pior a taxa de desemprego aumenta, agora que está descontado o efeito sazonal do verão. Cifra-se em 6,8 % , o valor mais elevado nos últimos 2 anos. Por consequência aumentam as contribuições do Estado para o fundo de Desemprego e diminuem as contribuições dos assalariados para a segurança social e para os diversos fundos de pensões.

Os estabilizadores automáticos deixam de funcionar e entramos em ruptura orçamental.

Depois, ainda há quem se justifique com a história dos preços da gasolina com factor indutivo do aumento das importações. Se somarmos a diminuição no último ano das vendas da gasolinas que atingiu no 3º trimestre de 2004, quase 7,00 % a forte valorização do euro face ao dólar durante o ano de 2004 ( valia hoje mais 18 % o euro desde o início do ano ), e se a isto diminuirmos a subida do preço do petróleo em dólares, que hoje está em valores no mercado internacional ( 12 % mais caro que no início do ano ), rapidamente chegamos à conclusão que quem justifica as importações e o seu comportamento com as gasolinas, esqueceu-se que lá fora em Londres, o barril de Brent transacciona-se em dólares e em operações forward com completa cobertura câmbial do risco associado.

Depois, ainda há quem diga que está tudo bem e vamos no bom caminho...

Publicado por António Duarte 09:12:00  

14 Comments:

  1. Rui MCB said...
    Lá estás tu a estragar a gestão das expectativas António, ainda por cima com factos! Junta-te ao clube dos inimigos da pátria, dos que querem o mal do país :-)
    Amanhã passo por cá à espera de ler o troco dos Drs. Anónimos. Boas noites!
    Guilherme Oliveira Martins said...
    Parabéns! Claro, sistemático, não especulativo e incisivo - contra factos não há argumentos...
    Anónimo said...
    Meu caro dr. António, se análise económica não se compadece com intuitos políticos, então façamos análise económica com base em factos.

    Antes de mais, sejamos factuais. O dr. António está a analisar a actual retoma económica, sem ter em conta dados importantes. O primeiro, e voltamos a repetir, prende-se com a realização do evento desportivo Euro 2004, que “empolou” o consumo interno. Sendo assim, analisar o comportamento da procura interna neste período sem ter em conta a anomalia estatística derivada da indução da procura interna pelo evento, como pode ser taxativo nas suas conclusões?

    Aliás, a sua análise parece extirpar os efeitos do Euro 2004, e compreende-se o porquê. Porque ninguém, em bom rigor, consegue avaliar com seriedade quais os efeitos na procura interna do evento desportivo. Mas aqui até o perdoamos. O que não o perdoamos é quando afirma que o investimento se deve à realização das eleições autárquicas e as vendas de cimento continuam em queda, contrariando a sua ideia que este investimento é induzido pelas obras públicas. Mas mais curioso é quando afirma que as expectativas de investimento caiem precisamente na altura em que se aproxima o acto eleitoral. O que é contraditório, para quem afirma que este investimento é induzido pelo eleitoralismo autárquico.

    Depois podíamos tentar desfazer o seu equívoco, confundindo procura interna com consumo interno. Mas não vale a pena, que lendo esta resposta o dr. António fará a sua própria auto-crítica.

    O que não perdoamos, também, é o dr. António não estudar o valor médio do euro e do crude de petróleo, ao longo do período e se estacar no valor actual, ainda por cima no 4º Trimestre. Mas talvez fosse bom o dr. António analisar as importações de combustíveis minerais, disponibilizadas pelo INE. E verá que o preço do crude nos primeiros 9 meses do ano, em euros, repetimos, em euros sofreu uma forte valorização, e que está em consonância com o forte aumento da importação de crude, e até, por países, com a Rússia a assumir-se como principal fornecedor de crude. E lembramos ao dr. António, se não estiver atento a estas coisas da evolução cambial e do preço do crude, que o preço do crude em euros, este ano, foi sempre superior ao ano passado, por exemplo. E que só recentemente, mais concretamente nas últimas semanas, é que o preço do crude, em euros, repetimos, em euros, é que sofreu uma queda abrupta.

    E o dr. António, por exemplo, se diz que faz análise económica séria, quanto quantifica a valorização do euro na nossa balança de pagamentos? É que, lá está, o dr. António refere vários problemas estruturais da nossa economia, mas assume um tom de tal ordem pessimista, que o faz esquecer que o euro, sim o euro, valorizou mais de 50%, no período em análise. E quando diz que a nossa economia acelera logo as importações aumentam, não poderíamos antes dizer que as importações aumentam precisamente por causa da forte valorização do euro? E sabe porquê que devia ter em conta este importante facto? É que as economias europeias, a maior parte, estão a contrair pesados deficits comerciais, a começar pela nossa vizinha Espanha. Mas e a Alemanha? E a França? Não tiveram uma forte subida nas importações devido ao euro? Será problema interno, português, ou europeu? Já quantificou este dado, caro dr. António?

    Depois diz o dr. António que as importações caiem, quando o nosso PIB diminuiu, como sendo sinal de forte fraqueza. Mas, caro dr. António, quantos países conseguem aumentar as suas importações quando o seu PIB cai? Talvez o Japão? A Koreia do Sul? Por acaso as importações não caíram em França, na última recessão? E na Alemanha? E noutros países?

    Quanto ao deficit estatal, estamos de acordo, dr. António. Mas teve em conta a correcção monetária, no crescimento com as despesas com pessoal? Sim? Não? Assim-assim? Pois. E repare-se, caro dr. António. Não estamos a defender aumentos de custos com pessoal. Seria desejável cortar na massa salarial estatal. Mas estava disposto o dr. António a defender o despedimento de funcionários públicos? Ou estava a pensar em manter os seus salários em situação de congelamento ad eternum?

    E se defende o despedimento de funcionários públicos, o dr. António defende o despedimento no actual momento do ciclo? Ou mais adiante? Ou já deveríamos ter começado a cortar no número de funcionários públicos? É que se defende que deve ser agora, porquê o alarmismo com o aumento do desemprego em Outubro? Não defende o despedimento de funcionários públicos a mais? Onde está a coerência e o seu rigor, caro dr. António? Porquê o aumento a taxa de desemprego de 6,3% para 6,8%? Não deveria estar a elogiar o actual governo por ter tido a coragem de despedir funcionários públicos desnecessários? Neste caso, professores? Onde está a coerência, dr. António?

    E repare-se nesta coisa curiosa. O dr. António diz que este investimento positivo, dos últimos trimestres, não criou empregos. Mas se o dr. António diz que é por causa das obras públicas, o desemprego não devia ter caído? Onde está a coerência, caro dr. António? E sabe que investimento feito sem criação de emprego, no curto prazo, significa aumento da produtividade? E não é a falta desta um dos mais preocupantes factores para a nossa baixa competitividade, dr. António? Afinal em que ficamos, dr. António? É mau ou bom o investimento sem criação de empregos? Ou dirá, depende? Pois depende, depende.

    Vamos concluir, caro dr. António, como começamos. Esta retoma económica não é tão má como o dr. e seus colegas da GLQL pretendem. Esta retoma, como já lhe dissemos anteriormente, só deverá ser melhor analisada lá para o fim do primeiro semestre do ano que vem. Por dois principais motivos. O primeiro prende-se com o desvanecer completo dos efeitos do evento desportivo anómalo, que foi o Euro 2004. Nós sabemos que lhe custa a entender isto. Mas não faz mal. É para isso que existem os críticos aos críticos.

    O outro factor é tentar perceber a reacção da nossa economia e estrutura produtiva ao fim da forte valorização do euro. Porque, meu caro dr. António, esta foi a primeira retoma económica na nossa história em que a nossa moeda, em vez de desvalorizar, valorizou-se. E fortemente. E sabe quanto, não sabe? E se a economia alemã e francesa quase que entraram em recessão com esta última valorização do euro, imagine o quanto de estoicismo existe no nosso aparelho produtivo, quando consegue enfrentar condições adversas na nossa economia, apesar da sua falta de competitividade.

    Talvez, dr. António, o futuro lhe traga umas surpresas a valer. É que, sabe, nós também quando prevíamos o fim da recessão em Portugal, também muitos duvidaram das nossas previsões. É sempre mais bonito e faz parecer muito inteligente, ser crítico. As cassandras e os profetas da desgraça têm sempre mais mediatismo. No entanto a realidade é o que é. E quanto a isso, caro dr. António, nada poderá fazer. Excepto tentar entender melhor a nossa economia e a forte reestruturação que está a conhecer. E mais conhecerá com a liberalização que Portugal enfrentará, a partir de Janeiro. A ver vamos.

    Só desejaríamos, já agora, começarmos a debater sobre as suas medidas e correcções na actual política económica, que o dr. António preconizará. Se quiser, podemos discutir as suas medidas para enfrentar o problema que se debate a nossa economia, para aumentar as nossas exportações e o investimento produtivo. Se quiser, também, podemos discutir o famoso e agora na moda, “choque tecnológico”, e sabermos se isso elevará o nosso investimento produtivo, a produtividade e as exportações. Mas ficamos à espera das suas doutas medidas. E cá estaremos para as discutir. Vale, dr. António?
    Anónimo said...
    Quem é que gera riqueza num país?
    as empresas!
    Como é que as empresas podem ter sucesso?
    conquistando clientes!
    Como é que se conquistam clientes?
    sendo diferente da concorrência!
    Como é que se cria a diferença?
    formulando e executando uma estratégia!
    Quantas empresas em Portugal têm uma estratégia?
    ...
    Quantas empresas em Portugal têm uma postura proactiva?
    ...
    Quantas empresas em Portugal têm uma postura reactiva?
    ...
    Quantas empresas em Portugal assumem o futuro como uma realidade a criar, em vez de um acaso a enfrentar?
    ...
    Ao evoluir de um mercado dominado pelos produtores (até aos anos 70) para um mercado dominado pelos compradores, a concorrência nunca mais deixou de aumentar, ano após ano. As empresas portuguesas habituaram-se a uma batota, a desvalorização periódica do escudo como meio artificial de aumentar a competitividade.
    Enquanto não se re-estruturar o tecido empresarial português, a criação de riqueza no país continuará a diminuir.
    Rui MCB said...
    «É a economia, estúpido!»


    Ironia das ironias: a retoma económica foi interrompida no 3º trimestre de 2004. A visão optimista do PM Santana Lopes não correspondia à realidade. O efeito Euro 2004 (aumentando muito os números do 2º trimestre e distorcendo a comparação) não chega para explicar o desaire, pois a variação homóloga e a comparação com a restante UE também são desfavoráveis a Portugal.

    A economia vem dar uma razão adicional à decisão do Presidente da República de forçar eleições antecipadas - mas não à sua opção de viabilizar o Orçamento santanete.
    in Pura Economia (http://puraeconomia.blogspot.com/2004/12/economia-estpido.html)

    Os economistas do Jornal de Negócios, ou os que ouvi ontem na Sic Notícias são tão tontos como eu e o António.
    Anónimo said...
    Caro dr. Rui MCB, nestas questões a arrogânica nunca foi boa conselheira. O dr. ainda há-de engulir a expressão: "- É a economia, estúpido!" Depois não diga que não lhe avisamos.

    Sobre a comparação Portugal-resto da europa, basta-nos dizer que o crescimento francês e alemão teve um brusca derrapagem. Será necessário avisar v. exas. que a Alemanha e a França apenas cresceram 0,1% no 3ºTrimestre?

    Para completar a comparação, deixo-vos este dado, que parece haver poucos analistas atentos:

    " La Unión Europea ampliada a 25 países registró un déficit por cuenta corriente de 5.300 millones de euros en el tercer trimestre, frente a un superávit de 6.400 millones en el mismo periodo de 2003 y un déficit de 3.000 millones registrado entre abril y junio de este año, según los datos provisionales divulgados por la Oficina Europea de Estadísticas (Eurostat)."

    O resto não precisa de resposta. A arrogância combate-se com inteligência e dados factuais, à medida que o desenrolar do ciclo económico demonstrará a nossa posição. Depois veremos quem é o estúpido.
    Anónimo said...
    Fica aqui uma questão aos doutos sábios.

    O iceberg é português, ou europeu?

    "Concernant le déficit commercial, il se creuse de plus en plus. La France vient en effet d'enregistrer son septième déficit commercial mensuel (2 milliards d'euros en octobre, après un déficit de 794 millions d'euros en septembre). Ce déficit est alimenté par une hausse de 4,9% des importations, alors que les exportations n'augmentent que de 0,3%. Le schéma était inverse en septembre : les exportations françaises avaient alors augmenté de 5% et les importations de 0,7%, selon les Douanes. Sur les dix premiers mois de l'année, le solde français est déficitaire de 5,2 milliards d'euros, contre un excédent de 699 millions d'euros sur la même période de 2003."

    Parlez-vous français?
    Manuel said...
    Eu leio e releio, e pasmo. A bem da nação, e independentemente do que (não) ache da qualidade da actual equipa que giza as políticas económico-financeiras do rectângulo, espero sinceramente que os Doutos Anónimos que aqui ululam não tenham rigorosamente nada, mas nada, a ver com a condução da mesma. A dimensão do Reality Distortion Field é tão grande, tão grande que até o Eng. Pina Moura, o dos tempos do outro Eng. se deve sentir enciumado... Não quero acreditar que alminhas tão miopes, tão "crentes", tão contorcionistas, tão "astrais" tenham lugar na governação deste país. Por outro lado, embora seja díficil manter "séria" qualquer discussão com interlucutores do "além" cadê os dados que sustentam tão pungentes afirmações ? É tudo um acto de Fé ?

    P.S. No caso de terem tempo gostaria de saber o que os Doutores Anónimos acham dessa esmagadora vitória da politica e diplomacia portuguesea que foi o chumbo ao acordo com a Petrocer (via EDP/gás/ENI)... Terão sido eles que fizeram também o célebre acordo parasocial, de que ainda ninguém falou ?
    Rui MCB said...
    Lamento informá-lo caro Dr. Anónimo mas o "É a economia, estúpido!" não poderá servir de pretexto para a sua vitimização. Se seguir o link indicado no meu último comentário verá que se trata do título do post que aí reproduzi escrito por um blogger economista que provavelmente nem por aqui passa.

    Para encontrar mais arrogantes como eu, além dos já citados, recomendo também que passe pelo Diário Económico, Público, Diário de Notícias.
    António Duarte said...
    Caros Anónimos :

    Em primeiro lugar, acho engraçado "ustedes", falarem nesse plural, e referirem a "nossa" posição. Nossa qual ?

    Em segundo lugar, o efeito da forte valorização do euro, não chega aos 50 % como afirma face ao dólar. Consulte uma tabela histórica de câmbios EUR/USD.

    No entanto é um facto que para alguns países como a Alemanha e a França a valorização do EUR face ao dólar tenha o efeito que "ustedes" tentam imputar em Portugal.

    O que mais me espanta no Vosso discurso é a tentativa de fazer passar uma mensagem que está tudo bem cá dentro, e que os problemas estão todos lá fora. Se assim é então falamos de demagogia.

    Portugal tem como principal parceiro comercial, a Uniao Europeia que por sinal transacciona em EUR. Admito que em operações com países com moeda USD, o efeito descrito possa reflectir uma contracção nas exportações e aumento das importações em volume pagando o mesmo. Agora contra a UE não !

    Quanto à França, essa mesmo onde Raffarin afirmou ontem, que vai propor a alteração das 35 horas de trabalho semanais, porque o país para crescer precisa de mais trabalho, e que mais trabalho gera sempre mais emprego.

    Foi este o exemplo que viu em Portugal ?

    A França é apenas o país que se recusou a cumprir o PEC.
    Depois uma lições de frances não faziam mal nenhum :

    "En septembre : les exportations françaises avaient alors augmenté de 5% et les importations de 0,7%, selon les Douanes"

    O contrário do verificado em Portugal certo ?
    Anónimo said...
    Para compreendermos melhor e mais a eficácia de uma política económica importa compreender os seus mecanismos, para combater debilidades estruturais conhecidas e penalizadoras da nossa estrutura económica. Para entendermos melhor as necessidades do nosso tecido empresarial e produtivo é importante compreender que tipo de estrutura produtiva temos e, diagnóstico feito, aplicar medidas públicas e políticas que visem corrigir essas debilidades estruturais.

    Segundo a OCDE, no seu Science, Technology and Industry Scoreboard", 2003, com dados relativos ao ano de 2001, a nossa estrutura de exportações era composta maioritariamente por indústrias de baixa tecnologia, e de média-baixa tecnologia, com peso relativo correspondente de 43,8% no primeiro grupo e 13,3% no segundo grupo. Ou seja, cerca de 57% das nossas exportações estavam concentradas em indústrias que iriam sofrer alguns importantes choques exógenos. Uns previsíveis e evitáveis, outros não e pouco evitáveis.

    Para além disso, alguns factores importantes microeconómicos demonstravam que a nossa estrutura de exportações sofria de alguns males que penalizavam fortemente a nossa estrutura produtiva. Os choques previsíveis eram o Alargamento, com a entrada na UE de importantes concorrentes directos às nossas exportações e a Liberalização total das importações comunitárias de têxteis, vestuário e calçado. Neste dois choques exógenos, Portugal não tinha uma política económica que lhe permitisse enfrentar a concorrência do Leste, da Turquia e da Ásia, em especial China e Índia. Recorde-se que as exportações portuguesas destes sectores tradicionais da indústria portuguesa começaram a encolher e perder quota de mercado a partir de 1998. Focamos em especial do tradicional e importante mercado alemão, que mudou as suas encomendas para a Turquia, Roménia e Ásia, obrigando muitas empresas portuguesas a fecharem as portas, lançando no desemprego milhares de cidadãos, ou a reestruturarem-se, com vista a enfrentar as novas condições de mercado.

    Os choques não previsíveis e muito penalizadores para a nossa estrutura produtiva, foi a valorização muito rápida do euro, desde Março de 2002; e a subida extraordinária do preço do petróleo, em especial no ano de 2003 e 2004. O tipo de estrutura produtiva portuguesa foi directamente confrontado com estes dois factores penalizadores, que sofreram mais que outro tipo de indústrias produtivas viradas para a exportação.

    Outro factor que penalizou bastante a nossa estrutura produtiva foi o fim de vida dos produtos da Autoeuropa, que fez com que a exportações, directas e indirectas, tivessem sido penalizadas em cerca de 2%, devido ao elevado peso desta unidade na estrutura das nossas exportações.

    Em 2002, com a mudança de governo e decisores da política económica, a política económica também muda, desta vez com uma abordagem mais abrangente e forte, sobre os factores críticos de sucesso num ambiente económico fortemente competitivo. De um lado a abordagem macroeconómica, nas políticas de contenção orçamental da dra. Manuela Ferreira Leite; do outro, políticas de apoio ao fortalecimento microeconómico, mudando a política de apoio aos “patos coxos”, via subsídios a fundo perdido, para uma política pró-activa de apoio às empresas que apostassem numa visão mais integrada do corporate governance. Neste caso, apostou-se nalguns programas públicos que apostassem na Inovação, no Marketing, na Qualidade, na implementação e domínio de circuitos de distribuição próprios e na focalização no mercado e cliente e menos e apenas, no produto. Para o contentor e subcontrato.

    Esta nova abordagem da política económica, em especial a dedicada aos sectores tradicionais e responsáveis por cerca de 60% nas nossas exportações, teria como base económica e filosófica os modelos schumpeterianos, e uma espécie de imitação do célebre MITI do Japão.

    Esta política económica pública assentava em cinco pilares, no aumento dos factores de competitividade do nosso tecido produtivo. Seriam eles:

    - Produtividade do capital, muito dependente do capital investido acumulado;

    - Produtividade do trabalho, com uma aposta na formação profissional, especialmente pelas próprias empresas. Neste caso podemos destacar os acordos firmados com a Siemens, Infineon, Autoeuropa (a Academia que em breve entrará em velocidade cruzeiro) e outros programas, menos mediáticos;

    - O efeito experiência, que permite às nossas empresas acumular experiência e economias-de-escala, via Inv. & Des.; publicidade, logística, produção, baixando os custos unitários de produção, à medida que mais empresas apostavam na expansão de redes próprias de distribuição, marcas e, até, patentes.

    - A Inovação, envolvendo em sentido mais lato todo o corporate governance, para tentar rentabilizar melhor a nossa produção, via monopólio permitido pelo domínio da produção, distribuição e marketing, elevando o índice de Lerner no conjunto do nosso tecido produtivo;

    - A Qualidade, que implica a nossa capacidade produtiva de cumprir as suas promessas em termos de design, fiabilidade, serviço pós-venda e outros.

    Para cumprirmos este desiderato, foram criados vários programas públicos, como o Dínamo, Marcas, Portugal-Trade, Inovação, e outros, com o objectivo de mudar o paradigma da nossa competitividade, da vantagem dos baixos salários, que perdemos à medida que a Europa liberaliza as suas trocas comerciais; para a vantagem assente no domínio do mercado, via marcas próprias, circuitos de distribuição e focalização no cliente.

    Nesta nova abordagem, tal como fez o Japão no pós-guerra, teriam estas políticas públicas que definir mercados-targets, de relação de proximidade espacial, e foi escolhido o mercado espanhol e francês, como plataformas iniciais de mudança da nossa estrutura produtiva. Além da proximidade geográfica, importava aproveitar a proximidade cultural e política, no sentido de pôr em marcha esta nova abordagem da política económica pública.

    E quais os resultados? Os resultados estão à vista. Em 2004, nos primeiros nove meses do ano, Portugal conquistou quotas de mercado, apesar da forte valorização do euro, penalizando directamente a nossa produção e custos, face ao exterior. Em especial da Ásia, Leste da Europa e até Turquia e Magrebe.

    Nos primeiros nove meses do ano, a Espanha importou mais cerca de 11%. Ao passo que as nossas exportações aumentaram cerca de 16%, conquistando quota de mercado, apesar da forte valorização do euro.

    Nos primeiros nove meses do ano, a França importou mais cerca de 5%. Ao passo que Portugal exportou mais cerca de 11%, conquistando quotas de mercado no mercado francês. Até deve ser realçado que, pela primeira vez em muitos anos, Portugal equilibrou o seu deficit comercial com a França. E face à dinâmica actual, é previsível que Portugal obtenha uma superávit comercial no ano de 2005. O que é inédito.

    As mudanças de política económica dirigida ao tecido produtivo, parecem estar a resultar, como se pode observar pelo aumento do número de empresas, ditas de sectores tradicionais, que estão a conseguir interessantes resultados no mercado espanhol e francês. É certo que em termos globais ainda não tem tanta visibilidade a forte reestruturação do nosso tecido produtivo. Mas ela está a processar-se. Mais. Outros sectores, como a indústria de mobiliário, estão a conseguir reestruturar a sua estrutura produtiva e comercial, virando-se para o mercado externo. E mudando o seu corporate governance, tal como no sector do Têxteis, Vestuário e Calçado. Através do efeito imitação.

    E estamos convencidos que à medida que o tempo passa e estas reestruturações tenham mais sucesso e se solidificam, e sirvam de exemplo para o restante tecido produtivo, o nosso crescimento económico será cada vez mais assente no investimento e nas exportações. E é importante que empresas e marcas de sucesso sirvam de bom exemplo para toda a economia. Podemos falar da CIN, Renova, Nova Delta, Tiffosi, Vista Alegre, Compal e muitas outras, que são as nossas pontas-de-lança no mercado exterior, elevando também a nossa imagem como país, ajudando a mudar a percepção externa da nossa produção, dos nossos produtos e dos nossos serviços.

    Pena é que poucos entendam este tipo de política económica e filosofia que assenta no rigor, na inovação, na qualidade e mudança dos factores críticos de sucesso no nosso tecido produtivo. Esperemos que não destruam o excelente trabalho iniciado há dois anos, com resultados francamente animadores e que mais resultados trarão se a estratégia se mantiver e expandir para outros mercados externos, cada vez mais exigentes e competitivos. Falamos do mercado americano, japonês e alemão. Para partirmos à conquista do resto do mundo.

    Portugal pode e deve fazer melhor. O que não pode é dar ouvidos às cassandras, que quase sempre se limitam a criticar e não a sugerir. Mas destruir um bom trabalho feito é fácil. Difícil é implementar um outro de sucesso. A ver vamos o que nos reserva o futuro.
    Anónimo said...
    Caro dr. António, com tempo e temperança responderemos com mais detalhes às suas missivas. Como compreende, não temos, infelizmente, tempo para tudo, para lhe responder com detalhe.

    Fica desde já avisado que não somos governantes ou ex-governantes. Somos apenas adeptos de uma determinada política económica, baseada em conceitos que infelizmente pouco abunda em Portugal.

    Chamo-lhe à atenção para o artigo do dr. Manuel Pinho, no Expresso último. Pode ser que abra algumas perspectivas diferentes das suas.

    Em relação ao comércio externo francês aconselho-o a informar-se mais e melhor. Pode ser que não faça determinados comentários menos rigorosos. Em particular a cotação do euro e do crude em euros.

    Quanto ao resto fica para mais tarde, pode ser?
    Anónimo said...
    Rigor precisa-se, caro dr. António.

    Infelizmente o dr. António escreveu isto. O que denota a sua completa falta de rigor, na análise económica, caro dr. António. Factos são factos, e o resto díriamos empirismo e especulação, ironizando com algumas palavras suas.

    “Portugal tem como principal parceiro comercial, a Uniao Europeia que por sinal transacciona em EUR. Admito que em operações com países com moeda USD, o efeito descrito possa reflectir uma contracção nas exportações e aumento das importações em volume pagando o mesmo. Agora contra a UE não !”

    O dr. António conhece o nosso sistema produtivo e a sua estrutura? Não, não deve conhecer. E por isso fala de cátedra. É que a nossa estrutura produtiva não enfrenta directamente a concorrência externa? Têxteis, Vestuário, Calçado, Mobiliário, Produtos Metálicos, Componentes de Automóveis, Produtos eléctricos e Electrónicos são produtos que competem directamente com produção exterior à zona euro. E se o dr. António desconhece a nossa realidade produtiva, aconselho-o a sair do seu gabinete e visitar o país real. O que trabalha e se esforça para enfrentar a concorrência turca, tunisina, checa, romena, chinesa, brasileira, indiana e muitos outros países que beneficiam com a queda do dólar.

    E explicar isto ao dr. António… Até nos fica mal, tal é a diferença entre quem conhece o nosso tecido empresarial e quem só deve conhecer os grandes grupos económicos, como a EDP, Galp, CGD e outros, que deve ser o seu caso.

    Para rematar este debate sobre o euro, crude e impacto na nossa economia, seria bom o dr. António conhecer as cotações mensais, fim do período, do euro, do crude e do crude em dólares, referência WTI. Mas se fizer do Brent é semelhante, mudando apenas a base de cálculo mas com resultados relativos semelhantes.

    Cotação do euro contra o dólar, fim do período:

    Dezembro de 2003 - 1,2577
    Janeiro de 2004 – 1,2475
    Fevereiro de 2004 – 1,2491
    Março de 2004 – 1,2309
    Abril de 2004 – 1,1979
    Maio de 2004 – 1,2201
    Junho de 2004 – 1,2183
    Julho de 2004 – 1,2015
    Agosto de 2004 – 1,2178
    Setembro de 2004 – 1,2430
    Outubro de 2004 – 1,2796
    Novembro de 2004 – 1.3299

    Cotação do crude WTI, fim do período, em dólares:

    Dezembro de 2003 – 32,52
    Janeiro de 2004 – 33.05
    Fevereiro de 2004 – 36,16
    Março de 2004 – 35,76
    Abril de 2004 – 37,38
    Maio de 2004 – 39,88
    Junho de 2004 – 37,05
    Julho de 2004 – 43,80
    Agosto de 2004 – 42,12
    Setembro de 2004 – 49,64
    Outubro de 2004 – 51,76
    Novembro de 2004 – 49,13

    Cotação do crude WTI em euros, fim do período:

    Dezembro de 2003 – 25,86
    Janeiro de 2004 – 26,49
    Fevereiro de 2004 – 28,95
    Março de 2004 – 29,05
    Abril de 2004 – 31,20
    Maio de 2004 – 32,69
    Junho de 2004 – 30,41
    Julho de 2004 – 36,45
    Agosto de 2004 – 34,59
    Setembro de 2004 – 39,94
    Outubro de 2004 – 40,45
    Novembro de 2004 – 36,94

    Face a estes dados, importa reflectir.

    O preço médio do euro contra dólar, em 2003, foi de cerca de 1,15.
    O preço médio do euro contra dólar, em 2004 (até Dezembro), foi de cerca de 1,25.
    O preço médio do crude, em 2003, foi de cerca de 30 dólares.
    O preço médio do crude, em 2004 (até Dezembro), foi de cerca de 39 dólares.

    O preço médio do crude, em euros, em 2003, foi de cerca de 25 euros.
    O preço médio do crude, em euros, em 2004 (até Dezembro), foi de cerca de 31 euros.

    Agora importava estudar a correlação entre a cotação do euro contra dólar e os deficits comerciais portugueses e europeus, face à cotação do euro, no período homólogo. Se estudarmos com profundidade repararemos que quanto maior o preço do euro, menores as exportações europeias e maiores as suas importações.

    Podemos concluir com o seguinte. A nossa economia está a fazer uma retoma mais saudável do que os pseudo-analistas dizem. Se expurgarmos o efeito Euro 2004 e a cotação do euro e do crude, provavelmente temos uma retoma melhor do que aparentemente mostram os números, com especial incidência no investimento. Há analistas que dizem ser generalizada a opinião má e invoca a imprensa. Como se costuma dizer nos mercados financeiros, se os jornalistas fossem bons… Não eram jornalistas mas investidores ou profissionais da área de análise económica para a indústria de gestão de investimentos. Mas há muitos cegos guiados por outros. É natural, face à própria natureza deste sector económico.

    O resto é má análise e wishfull thinking.
    Rui MCB said...
    O António sabe defender-se muito bem mas já agora deixo-vos alguns números de ontem do INE relativos à relevância do comércio intracomunitário em relação ao total do comércio internacional de Portugal - trata-se de uma realidade estrutural com décadas, mas enfim cá vai a informação mais recente para que todos possamos falar com conhecimento do "Portugal real", e passo a citar:

    "Em 2004 [até Setembro], o peso relativo do comércio intracomunitário no conjunto do comércio internacional foi de 79,6% e de 76,6%, respectivamente, para a saída e a entrada de mercadorias (80,0% e 77,2% em 2003)."
    Fonte: INE (http://www.ine.pt/prodserv/destaque/2004/d041209/d041209.pdf).

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