Cravinho, as SCUTs, os Comboios e o coitado do Capataz.

Encontrar hoje um político que após ter passado pelo governo, representado o país através de um cargo de ministro, e que se disponha a ir a uma comissáo de inquérito, explicar porque há uns anos atrás, a sua decisão em determinada matéria verteu por um determinado caminho, é coisa rara.

O país vive em alternância política numa lógica de bloco central, sem que haja alternância de políticas, acrescida de uma clara irresponsabilidade.

Neste Portugal, cada vez mais semelhante a uma república do Burundi, hoje foi a vez da voz que mais defendeu as SCUTS, e que iniciou o seu processo, se recusar a explicar o porquê da sua escolha. João Cravinho vá se lá saber porque, adianta que só assinou o primeiro contrato de SCUTS, os outros foram da responsabilidade dos que a seguir ocuparam a sua cadeira. Nada mais elementar e ainda que tenha sido ele a começar o processo e a dar luz verde, ele não é responsável.

A origem das SCUTS, adveio do advento socialista lançado por António Guterres à frente dos desígnios deste país. A ideia era , e relembro que estavamos em 1996, iniciar a construção de 3.000 kms de estradas sem financiamento do Estado, e sem pagamento pelo utilizador. Ora aquilo que Cravinho fez foi, passar a ideia para o papel, e na melhor teoria económica, definir que 10 anos após a adesão à União Europeia, o país, um rectângulo que muitos cada vez mais vão confundindo com uma província espanhola, precisava de 3.000 kms de auto- estrada. Não chegaram na época os fundos estruturais provenientes do 1º e do 2º Quadro Comunitário, ainda era necessário um endividamento futuro.

Sim porque o país sem estradas não produz e não se torna atractivo. Podem não haver hospitais suficientes, podem não existir clusters industriais, pode não existir um investimento em I&D, mas estradas tem que existir. Todos sabemos quão importante em termos eleitorais significa cortar a fita da estrada. E esse foi sempre um problema do nosso país, mais preocupado em cortar fitas do que em ter alunos que quando queimam as fitas estejam preparados para o mundo empresarial.

As SCUTS, não são mais que uma vã tentativa de se erguer obra sem possuir recursos financeiros para tal alongando no tempo esses custos, diluídos de uma forma que extravasa o modelo tradicional, através de um mecanismo de cobrança virtual com um ponderador de flutuação de tráfego no futuro.

Um dos argumentos que João Cravinho utilizou no processo SCUTS, é que o Estado não possuí fundos para realizar tais obras, e pasme-se o Estado , esse mesmo Estado enquanto ele era ministro, se for ele a construir , apresentará no final enormes derrapagens, algo que se entregue à iniciativa privada não acontecerá.

Ora era isto que João Cravinho deveria explicar ou será que eu, mero contribuinte , não posso almejar a ter um Estado que promova obras sem que estas apresentem derrapagens ? Ou será que ele, Cravinho assume que enquanto ministro havia clientelismo no Estado, esse mesmo Estado socialista. Felizmente que estas palavras estão num documento por João Cravinho elaborado.

E perante estas palavras, percebe-se o dilema da modernização da Linha do Norte. Percebe-se por exemplo os sucessivos atrasos de calendário, e percebe-se que o projecto de modernização da linha da Norte esteja a decorrer em completa ruptura com a linha de alta velocidade. Por outras palavras, a RAVE e a REFER, duas empresas com o mesmo presidente não se entendem, e por exemplo, tentam expropriar ambas o mesmo terreno. Neste dilema de que Cravinho foi apenas a pedra de toque de início, por que a culpa essa é dos que vieram a seguir, há apenas um detalhe, que por norma é adjectivado de reles, e que assume o seguinte vértice :

Porque mandou Cravinho efectuar estudos de Alta Velocidade, onde é imperativo a existência de pontos de conectividade com a linha do Norte, quando sabia que ambos são indissociáveis.

Em vez disso decidiu , meter mãos à obra, e modernizar uma linha, encomendar comboios pendulares que não andam mais que os cascos transformados ali na Sorefame, para por último chegar à conclusão que o tempo de viagem que é recuperado é apenas e só de 22 minutos numa viagem de Lisboa-Porto directa.

Obviamente que a culpa não foi dele. Ele só assinou o despacho das obras. A culpa foi do capataz que decidiu depois de olhar para o sol, que era dia de mandar abaixo a estação de Espinho.

Publicado por António Duarte 14:34:00  

1 Comment:

  1. irreflexoes said...
    Caro António,

    Só uma pequena precisão. Não são bem 22 minutos mas mais tipo 18.

    Nas suas contas não teve em conta que os troços em que não é possível a velocidade máxima são menores para velocidades de 220 (com perdas de velocidade máxima na casa dos 10% dos troços) do que para velocidades de 300 (em que as perdas de velocidade máxima andam na casa dos 20% dos troços).

    Podemos até arredondar para 20 minutos, para facilitar as contas. Com um custo de empreitada que andará na casa dos 600 milhões de contos, estamos a falar de 30 milhões de contos por minuto.

    Mais vale criar um shuttle para a lua :)

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