O Paradoxo da Educação em Portugal : 2ª Parte

Todos nós concordamos que a educação é uma vertente essencial do desenvolvimento, a sua importância é realçada em todos os discursos políticos, independentemente do quadrante de onde venham. Todos nós concordamos que a despesa com a educação tem tido um forte crescimento, tendo a escolaridade pública e gratuita generalizado-se.

No entanto os resultados desta generalização, medida pelo grau de literacia, são pouco animadores, pois a indisciplina e o laxismo de um sistema de ensino que fora de controlo do Estado, apesar de tutelado por este, leva a que em todos os sectores da sociedade civil se fale em falta de responsabilidade individual dos vários agentes que fazem parte. A verdadeira questão é que o aumento da intervenção governamental não tem trazido uma maior qualidade ao ensino, e á luz da teoria da escolha pública temos por isso, um excesso de Governo ajustado por um défice de resultados.

Em primeiro lugar, a liberdade de escolha das famílias não existe, uma vez que o Estado coercivamente, escolhe a escola onde os nossos filhos tem que estudar, este mesmo Estado, é assim manipulado por uma nomenclatura educativa especializada em gerar sucessivas reformas compulsivas, universais e gratuitas – mas com os custos a serem suportados pelo erário público – e rompendo completamente com as reformas passadas. No fundo trata-se de um ciclo vicioso, onde as sucessivas reformas ao produzirem sucessivos maus resultados, geram mais reformas. Sempre com os mesmos intervenientes, sempre com o Estado a suportar os custos, sempre sem resultados visíveis no grau de literacia.

Em segundo lugar, nós portugueses, não contentes com a situação vivida na escolaridade obrigatória, ainda por vezes somos levados a pensar, que a educação ou melhor a governamentalização da educação se deveria estender também ao pré-escolar, bem como alargar a escolaridade obrigatória, sendo assim fácil associar esta intenção ao facto de alguns agentes quererem assegurar clientes para um sistema com excesso de oferta e satisfazer os grupos de pressão do sector da educação, em vez de contribuírem para uma melhoria da educação.

Em terceiro lugar, não tenham dúvidas, que se achasse que a governamentalização da educação, fosse benéfica e trouxesse resultados, eu estaria hoje aqui a apoia-la. Mas o passado mostra-nos que não. Mesmo as reformas dos tempos de Roberto Carneiro como ministro de educação, que foram na altura, bastante inovadoras e talvez as mais moralizadoras que o sistema educativo já teve até hoje, rapidamente foram usadas como bandeira eleitoral pela oposição da altura. Mais estranho é como alguns supostos estudantes se deixam manipular pela intervenção política, e não percebendo que estão eles próprios a contribuir para a excessiva governamentalização da educação.Assim, ganham cada vez mais relevo na nossa sociedade, apesar de pouco discutidas, algumas soluções que iriam de certeza trazer, melhores resultados. Assim por muito que alguns sectores políticos possam espernear, para além da liberdade da escolha das famílias, deve existir responsabilidade financeira directa das famílias, ainda que salvaguardado o acesso as famílias de menores recursos através de mecanismos de apoio privados ou públicos. Só desta forma se poderá garantir que a oferta educativa respeitará as preferências das famílias, ou melhor dizendo, uma escola que não respeita determinados parâmetros de qualidade, será rapidamente esquecida pelos educadores e pais na altura em que escolherem a escola. Assim e se a tudo isto aliarmos a intervenção obrigatória que os pais terão na escolha dos programas e conteúdos, a escola não conseguirá sobreviver sem os pais, e estará desfeito um dos maiores problemas do actual sistema educativo, que passa pelo desinteresse dos pais na instituição-escola .

Desde que garantido o acesso universal a educação, estaríamos certamente a contribuir para uma melhoria da educação e com consequências futuras na qualidade dos nossos recursos humanos. Um dos sistemas mais falados são os cheques-educação. As famílias escolheriam livremente a escola onde queriam colocar os alunos, e o Estado pagaria directamente a escola o montante destinado a cobrir os custos das propinas. Outra virtude deste sistema passa pela equiparação entre escolas públicas e privadas.Associadamente ou não a possibilidade da dedução total das despesas de educação nos impostos- com uma elevada taxa de dedução -, e ou um crédito de imposto para particulares e entidades colectivas que financiassem bolsas de estudo. No entanto por outro lado, a obrigatoriedade de certificação das escolas por parte do Estado que poderiam receber esses mesmos cheques-educação, manteria, a agora indesejável governamentalização na educação. Uma coisa é a desejável regulamentação e a existência de um orgão regulador outra é o excesso de governamentalização. A não existência de uma orgão regulador implicará a procura das escolas pelo critério das notas atribuídas - leia-se facilistismo - e não pela qualidade e exigência do ensino.

Entre as duas soluções, propostas, os cheques-educação acarretam um enorme gasto público, ainda que inferior às dotações orçamentais actualmente existentes, enquanto que o crédito de imposto, não acarreta nenhum gasto do Estado. Depois tem outra enorme vantagem que sendo do senso-comum não pode ser menosprezada neste sistema, pois os consumidores são muito mais exigentes e criteriosos quando são eles a suportar os custos ainda que posteriormente reembolsáveis dos mesmos.

Ao que parece a primeira parte deste estudo sobre o paradoxo da educação em Portugal, teve o efeito desejado. Colocou um conjunto de pessoas aqui pela blogoesfera a pensar, o que já de si , é de saudar, pois ninguém é dono de uma qualquer verdade absoluta. Obviamente que os problemas do ensino superior em Portugal e da educação não se resumem apenas e só ao financiamento, pois subsistem problemas claros na colocação dos professores, subsistem problemas gravíssimos com os livros escolares, resistem ainda fortes vestígios da falta de vocação em alguns professores em leccionar ou professores que nunca pensaram em ser professores e porque o mercado não os absorveu nas profissões por eles escolhidasa a única saída foi o ensino.

É necessário que exista uma reformulação de todo o esquema de formação de professores, de acessos ao mercado de ensino no fundo, pois se os alunos são indispensáveis neste modelo, os professores são a pedra de toque e uma pedra de toque que não se sinta vocacionado para dar aulas vai emperrar o modelo.

Assim, resolver o problema da educação em Portugal e ao mesmo tempo do Ensino Superior, passa por afectar correctamente e em colaboração mais estrita do que actualmente é efectuada com o INE, um preenchimento das necessidades de mercado face aos númerus cláusulus, respeitando assim a lei de mercado. Depois , o nosso país, tem de uma vez por todas a ideia que todos temos que ter um canudo, e apostar de uma forma eficiente e em clara interligação com o mercado empresarial na realização de cursos de especialização de determinadas profissões técnicas, tidas como de segunda linha mas de importância extrema. Mais importante que tudo é definir hoje uma política supra-partidária, no que à educação diz respeito. Decidir hoje o que queremos ter daqui por 10 anos, e porque não olhar para o exemplo da educação irlandesa e o modelo adoptado.

Quanto ao financiamento, obviamente que aqui poderemos ter duas vias. As universidades podem ser financeiramente autonómas, dependentes do rendimento privado, como propinas, fees, doações e investimento privado ou assumirem-se como dependentes do financiamento estatal e funcionarem em função desse mesmo financiamento. No fundo e por muita volta que queiramos dar, significa quase assumir o princípio do utilizador-pagador contra o do Estado-Providência.


Para terminar e porque achei poder ser de relevância suprema, aqui vós deixo um gráfico onde se mostra tal e qual , a qualidade do dinheiro do gasto directamente do erário público. Outros com maiores rendimentos per capita que nós, gastam ao mesmo nível que nós e tem reconhecidamente melhores resultados que nós. Se por ventura a ideia que vigorar seja aquela que defenda o Estado como financiador, então pelo menos que o Estado seja mais cuidadoso na forma como gasta. No fundo este o verdadeiro paradoxo da educação em Portugal.

Não perceber isto, é querer continuar na cauda de todos os indicadores. Perceber isto significa continuar imediatamente continuarmos na cauda da tabela e talvez daqui por 10 anos apresentemos resultados.

Publicado por António Duarte 14:37:00  

6 Comments:

  1. Anónimo said...
    Portugal gasta, pelo teu gráfico, 5% do PIB em educação. O mesmo que o Japão? Não, claro que não, o Japão gasta 5% do seu PIB mas como tem um PIB muito maior do que o português, gasta muito mais.
    O problema é esta mania de agora se medir tudo em percentagem do PIB. É absurdo, há despesas que são independentes do PIB.
    Isto é como se eu comparasse alguém que ganha o ordenado mínimo e gasta, comendo mal, 80% do seu ordenado em alimentação, ao Belmiro de Azevedo que gasta uns 0,01% ou ainda menos dos seus gastos em alimentação e comendo bem, que o primeiro come que nem um bruto (imaginem, 80% dos seus rendimentos) e que um segundo é um cidadão bastante frugal!
    Anónimo said...
    Meu caro Raio:
    Os gastos têm (devem) ser sempre à medida dos rendimentos. Seja para o rico ou para o miserável. Se este não tiver não gasta!!!
    Meca said...
    Concordo com os cheques-educação, pois é a fórmula que mais se aproxima da igualdade das oportunidades, direccionando o financiamento directamente ao aluno.

    Outro projecto pertinente é a criação de "escolas-alvará", neste caso, o Ministério da Educação paga um valor por cada aluno que a frequenta, no final de cada ano lectivo é avaliada, se cumprir os objectivos, o alvará é renovado, senão é suspensa.
    JVC said...
    Independentemente de não concordar, em princípio, com o cheque-educação, pôe-se muitos problemas práticos e financeiros. O sistema só vigora, tanto quanto sei, em circunstãncias muito especiais: em alguns estados americanos, mas só para certos segmentos da população, como medida de discriminação positiva. Não é por acaso que, apesar da vaga de neoliberalismo na Europa, ainda nenhum país o pôs em prática.
    Sou mais favorável ao sistema de empréstimos a pagar na vida activa. Para os interessados, ecrevi dois artigos sobre isto em www.apesp.pt/opiniao/artigos1.htm e em /www.apesp.pt/opiniao/artigos1a.htm
    António Duarte said...
    Caro JVC

    Se não me engano é a Inglaterra que financia directamente o aluno através de empréstimos a pagar após a entrada no mercado laboral e com um % deduzida do rendimento.

    Penso que deveríamos pensar que o actual modelo não priviligia a escolha em consonância com a qualidade, uma vez que todos sabemos que quando somos nós contribuintes a escolher, escolhemos com um maior critério.
    Anónimo said...
    Existe em Portugal um bom modelo de financiamento ao aluno que funciona de há dois anos para cá: as escolas profissionais da Região de Lisboa e Vale do Tejo. Não se fala nem de cheques, nem de créditos, fala-se de bolsas, diferenciadas em função do tipo de curso. Não é preciso ir a Inglaterra ou aos Estados Unidos. Tentem informar-se.

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