um blasfemo autêntico...

Desde há uns tempos que o Blasfémias passou a contar com os préstimos de um liberal que se revelou agora um autêntico inquisidor em questões religiosas. Eu estou-me nas tintas para as crenças religiosas do sr. AAA, estou-me nas tintas que ele se ache "católico" mas não me estou nas tintas para o que ele assina, porque como católico me preocupa que haja quem passando-se por tal tudo faça para afastar terceiros da Igreja descredibilizando-a.

Ontem o inquisidor pretendeu denegrir a Fé de John Kerry por este frequentar missa católica de uma congregaãão perfeitamente legitima, católica, apostólica romana e como tal reconhecida pelo Vaticano, cujo único crime (a cobardia foi tão soez, que nem isso foi frontalmente assumido, é mais prático citar textos de outrem) é não excluir ninguém, nem divorciados, nem quem quer que seja que acredite na mensagem de Cristo, e nos principios basilares da Igreja Católica.

Eu, na minha boa fé, recomendei inocentemente a leitura daquele que é - concorde-se ou não com tudo o que ele escreveu - o maior teólogo vivo, pedra basilar do Vaticano II, Hans Küng. Como tréplica apanho com isto...

Em reacção à minha recomendação de leitura do artigo A Curious Kind of Catholic (publicado no insuspeito, em matéria de Catolicismo, Weekly Standard...), o Manuel, da Grande Loja, recomenda-me a leitura de Hans Küng.

Uma vez que vai para 25 anos que a personalidade em causa deixou oficialmente de ser teólogo católico (se alguma vez o terá sido na prática seria outra discussão...) não percebo o que poderá ter motivado tal recomendação.

Como sei que o Manuel faz os possíveis estar bem informado, para matérias desta índole recomendo-lhe maior atenção à actividade desta Congregação. Aproveito a oportunidade para recomendar como leitura de Verão uma ou outra obra de Rafael Termes, para ver se o Manuel alarga um bocadinho os seus horizontes sobre o liberalismo de forma a que os meus posts deixem de lhe causar tanta estranheza...

Em primeiro lugar regista-se a dúvida sobre se alguma vez Hans Küng foi católico, longe de mim discutir teologia com o sr. AAA, cuja suma teológica confesso na minha pobre ignorância e - apesar de me tentar manter bem informado sobre matérias de Fé - ainda não ví em nenhuma libraria ou citada por quem quer que seja.

Em segundo lugar registo a recomendação de visita à página da Congregação para a Doutrina da Fé, dirigida pelo Cardeal Karl Joseph Ratzinger, hoje considerado um duro - conterrâneo de Küng - que o contratou aliás para dar aulas de teologia no seu seminário.

Em terceiro lugar Küng, que é padre, não foi nunca suspenso a divinis como por exemplo o Monsenhor Lefébre cujo discurso o sr. AAA faz recordar, apenas, e por defender coisas "disparatadas" como o fim do celibato dos padres, um maior papel da mulher na Igreja, o uso de contraceptivos, "proibido" de ensinar teologia em nome da Igreja Católica Apostólica Romana.

Em quarto lugar a peça do Weekly Standard é tudo menos insuspeita ou inocente, é política. Defende implicitamente uma segregação objectiva de quem não se revê a 100% na ortodoxia proclamada e veio a pura e simplesmente a reboque da benção da recente convenção democrata por um padre católico acidentalmente membro da Congregação que gere a paróquia onde Kerry vai à missa e que cobardemente se ataca. Sobre a polémica benção ler apenas este admirável texto.

Dito isto não deve haver um único seminário católico no mundo onde pelo menos uma das inúmeras obras de Küng não seja usada como referência. Obviamente que os ensinamentos de Küng (o tal que o sr. AAA (!) tem dúvidas se é - ou alguma vez foi - católico) perdurarão no tempo enquanto que o fundamentalismo bacoco de quem trata teologia e matéria de Fé com a leviendade com que discute política num aviário se perdurasse era pelo rídiculo.

Curiosamente e apesar de estar proscrito "vai para 25 anos" Hans Küng aquando dos seus 70 anos foi felicitado pelo número dois do Vaticano, o Cardeal Angelo Sodano. Um pequeno detalhe certamente para um proclamado "católico".

P.S. 1. Apesar do fervor com que defendo certas causas não tenho por formação o hábito de embirrar com as crenças dos outros, embirro isso sim é com quem acha que sabe quais são as crenças certas ou erradas. Talvez o sr. AAA seja um profeta, eu não sou, sou apenas um humilde crente cheio de dúvidas e defeitos mas a quem foi concedida a Graça de ter Fé, a minha Fé! E nessa Fé, como na de John Kerry, o sr. AAA não tem nada que meter o bedelho...
P. S. 2. É também óbvio que ao contrário do sr. AAA - e no que decorre directamente da recomendação da leitura de Rafael Termes, ideólogo e eminência parda da moderna Opus Dei em Espanha (ex presidente da confederação patronal espanhola) a quem trata da mercearia- que não tenho qualquer simpatia por essa maçonaria batinada, prelatura pessoal, mais conhecida como Opus Dei... Mas a Igreja é feita por Homens, eu sei...

Publicado por Manuel 05:45:00  

5 Comments:

  1. Anónimo said...
    "A Igreja é feita de homens". É exactamente isso. Esse princípio aplica-se a todas as organizações humanas. Só os princípios, os valores e as ideias permitem trazer alguma luz.

    Mudando de assunto: excelente post. É pena que vocês se dediquem tão pouco a matérias de fundo e se deixem tanto levar com a discussão do acessório, das minudências e dos fait-divers, mas isso é uma opinião minha, subjectiva, certamente não coincidente com a opinião da maioria das pessoas que lêem este blogue; todavia, na esperança que apareçam mais discussões sobre temas substanciais, vou começar a visitar-vos mais assiduamente :)

    timshel
    Anónimo said...
    O sr. AAA sofre de cegueira não vale a pena dar-lhe tempo de antena. No meio de tanto lixo neste mundo, algo está a mudar e "seres" como o sr.AAA estão com o seu prazo de validade a terminar...
    Miguel Marujo said...
    Parabéns, Manuel! Pela discordância que manifesto muitas vezes consigo, sinto-me muito à vontade para lhe dizer: touché!
    Luis Gaspar said...
    A questão interessa-me por motivos mais intelectuais que teológicos, admito, por isso não lhe levo a mal que não queira ter a conversa: mas como consegue ser católico e defender, ao mesmo tempo, o uso de contraceptivos? Penso que a sua proibição segue e decorre naturalmente da Bíblia, não há muita volta a dar ao texto. O cardeal Ratzinger não é assim tão duro. Talvez a Bíblia seja (e como católico que é, seguramente não desafia o dogma da infabilidade dogmática do papa, que escolheu e manteve Ratzinger para decidir o que é e não é de fé católica).
    Miguel Marujo said...
    Eu gostava que o Luís Gaspar me explicasse onde é que na Bíblia se proíbe «o uso de contraceptivos»? Onde é que a sua «proibição segue e decorre naturalmente da Bíblia»? E sabe Luís Gaspar que o dogma da infalibilidade papal é do século XIX? A Bíblia não o é, e não creio que lá se diga e que essa infalibilidade decorre naturalmente do que quer que seja!

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