Terramoto no Deserto...
quarta-feira, junho 02, 2004
Dizem uns que a História é escrita pelos vencedores, outros que há a tentação de descrever os factos não como eles realmente aconteceram mas como se gostava que eles tivessem acontecido.
É cedo para se fazer a verdadeira História deste Portugal contemporâneo mas o terramoto, o tal terramoto, de que tantos falavam está mesmo a acontecer com uma magnitude e dimensão tão grandes que nos tornam a todos tão ínfimos que quase não reparamos nele senão quando for tarde de mais.
Portugal assiste por estes dias a uma sucessão de coincidências, em número demasiado, e demasiado graves para serem ignoradas.
Em bom português, e sem papas na língua, o que se passou nos últimos dias e horas no seio da PJ - e que Adelino Salvado, esse mesmo, classificou de "limpar a casa" - é de todo intolerável numa sociedade democrática.
A, pelo menos na aparência, maquiavélica gestão de timings que levou à decapitação pura e simples da Directoria da PJ do Porto é absolutamente inqualificável. É público e notório que Adelino Salvado, e outros inmencionáveis, não gostaram da amplitude da Operação Apito Dourado, é público e notório que existiu, como dizia a SIC esta noite, uma quebra de confiança entre a Direcção Nacional e a Directoria da PJ do Porto, pela poética razão de esta ter funcionado bem demais, é público e notório que Adelino Salvado há já algum tempo procurava ortodoxizar o Porto mas a forma encontrada para o fazer bate todos os limites.
Numa sucessão de coincidências notável, a Directoria da PJ de Coimbra acelera, e a fazer fé na imprensa com bastante cobertura aérea, uma investigação sobre familiares do responsável da Directoria da PJ do Porto a qual implica que este sensatamente se demita.
Nada a obstar não fosse logo a seguir os dois adjuntos serem objectiva e inequivocamente exonerados das suas funções, por Adelino Salvadoe a crer no Público e no JN por um único crime ? O Apito Dourado.
Mais espantosa é a singular coincidência de menos de 24 horas depois de em Coimbra Ataíde das Neves coordenar a detenção dos familiares do seu colega do Porto, e que catalizaria a demissão deste, ser o mesmíssimo Ataíde das Neves a ir ocupar o lugar entretanto vago no Porto!
Não havia mais ninguém ? Não passou pela cabeça de ninguém que a coisa pudesse cheirar a esturro, que houvesse uma gestão de oportunidades no mínimo curiosa, ou já ninguém liga a isso ?
A técnica parece ser sempre a mesma, e até já foi ensaiada com sucesso na exuberante mas dedicada Maria José Morgado, decepa-se a cabeça e cerceiam-se (uma juíza e um magistrado do MP sem uma PJ cooperante fazem o quê ?) os recursos e o Processo Apito Dourado - do qual não é preciso ser muito dotado para se perceber que tem a ver, e mexe com muito mais, do que com uns clubezecos de futebol da segunda B - marinará gloriosamente como as investigações a Cruz Silva, a António Preto ou a Isaltino de Morais.
O drama da nossa condição humana é, não sendo deuses, ter de avaliar as coisas como elas parecem ser. E isto tresanda a golpada, deve ser golpada mas quem somos nós, meros mortais, para demonstrar que é golpada ?
Uma última nota sobre as decisões desta segunda relativas ao Processo Casa Pia. Independentemente da acusação, das convições que cada um tem sobre a culpabilidade de um ou de outro, per se, e a solo, o texto exarado é, na análise aos detalhes do mesmo, e aplicando, só e apenas, as mais elementares regras da lógica uma Ode autêntica. Havemos de voltar ao assunto.
N.A. Pede-se encarecidamente ao autor do novel e promissor Direitos para entrar em contacto com esta Venerável Loja via email.
Publicado por Manuel 05:25:00
2 Comments:
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O pormenor de ter embicado com as Filípicas, estonando a tendência para os anglicismos, não é de somenos: é uma marca registada de rigor, parece-me.
Resta-me dar um conselho ao autor: mantenha o anonimato e o tom! E parabéns pela ousadia em se afastar da apagada e vil tristeza das críticas solipsísticas que são apanágio de quem apenas costuma comentar em corredores ou à mesa de café.
Venham mais cinco!
Espanta-me como aquilo que é verdadeiramente forte e grave escapa à maioria. Quem é que fala disto? Dei uma volta pelos blogues políticos e nem um. Estas questões que são estruturais parece que não contam. Não vendem, não servem para caçar votos. Estão todos metidos...