Sampaio no País nas maravilhas...

A sessão comemorativa dos 25 anos do Estatuto do Ministério Público que hoje ocorreu em Lisboa, e onde a Grande Loja esteve bem representada fica marcada por dois discursos emblemáticos e reveladores, do actual status quo, o do Procurador-Geral e o de Jorge Sampaio.

Souto Moura, com a humildade que lhe é reconhecida, veio dizer que o "mundo da justiça", leia-se o MP, tem convivido com "evidentes dificuldades" à crescente mediatização do sector.

É um começo para quem lida com um universo onde também se pensa que


a esmagadora maioria dos magistrados não precisa da comunicação social para fazer bem o seu trabalho, para progredir na carreira, em suma, para se realizar profissionalmente

...só que se Souto Moura já percebeu que um problema não é de todo líquido que a percepção que já tem do mesmo abarque toda a amplitude e complexidade da matéria...

Com efeito, o MP não pode estar dependente da boa ou má formação jurídica da comunicação social, da boa ou má fé dos agentes informativos ou, muitas vezes, até da sorte.

Tal como à mulher de César não basta parecer séria tambem ao MP não pode bastar fazer bem o seu trabalho na penumbra dos seus gabinetes. Tem que ser claro e inequívoco, para a população, que não só o MP faz bem o que lhe compete como é - de facto - o seu legítimo representante no que à defesa dos seus direitos diz respeito. Tal é fundamental para a sanidade do nosso Estado Democrático.

A Magistratura não pode ser encarada como um modo de vida quase monástico, hermético e distanciado das realidades mundanas mas antes como algo aberto, no sentido em que está próxima, de uma forma acessível e compreensível, dos cidadãos.

Dito isto, a última coisa que o sistema judicial precisa é de, tal como nos clubes de futebol, passar a ter, tribunal a tribunal, mediadores - porta-vozes - entre os agentes judiciais e a comunicação social. A hipotética criação de um layer adicional apenas vai aumentar os níveis de ruído já existentes e não iria resolver um único problema de raíz. Uma decisão judicial - qualquer que seja - tem que ser defensável, e compreensível, per se, e pelos seus autores.

Não faz sentido por um lado que nas faculdades de direito e no CEJ - cujo director anda há já algum tempo a pedir para ser demitido - não se estude adequadamente a nova realidade social dos qual os media são indissociaveis e, por outro lado que por parte da classe establecida, e que é suposto manter-se up to date, não haja uma clara adaptação - em massa - à realidade presente.

Por outro lado o dito atrás não impede que a PGR deva, e tenha que, ter uma politica¸de comunicação eficaz e coerente que tem que ultrapassar em muito a actual "reactividade"...

Já o Presidente da República fez um discurso ao nível a que sempre nos habituou, desta vez sem grandes comoções, que vale pelo que foi dito, pelo que não foi dito e pelo timing em que foi dito.

Sampaio bem disse que

não vale a pena fazer-se a demagogia de afirmar que só a inclusão de notáveis suscitou a intervenção dos responsáveis no alerta para as disfunções do sistema, quando o Presidente da República privilegiou, desde o início do seu primeiro mandato, a abertura do ano judicial, para, sessão a sessão, ir chamando a atenção para os males da Justiça, designadamente na área criminal

...mas desgraçadamente esqueceu-se de referir e enunciar a sua própria evolução discursiva sobre a matéria...

Mas não se esqueceu de enunciar pérolas como que ...

O último ano veio evidenciar como é frágil a nossa cultura dos direitos fundamentais e como os agentes da Justiça, sem excepção, esquecem, com demasiada frequência, a comunidade de valores essenciais que lhes cabe promover e cedem, amiúde, a meras preocupações de defesa de estatuto e de posições relativas de poder

e que relevam de facto para uma questão pertinente mas que lhe passou ao lado - é que sendo ele, Sampaio, o Supremo Magistrado da Nação tal aplica-se antes de mais a ele...

Esquecendo por momentos este lapso à Frei Tomás deliciemo-nos com a elipticidade de algo como ...

uma particular atenção ao reforço, nos vários níveis, da estrutura hierárquica do Ministério Público que, descentralizando responsabilidades, torne mais eficaz o funcionamento e o desempenho e controlo de cada grau e evite indesejáveis afunilamentos e fulanizações.

...ou com a inocência de uma frase como...

...ninguém de bom senso pensará que a frágil cultura dos direitos fundamentais se tenha manifestado apenas por se tratar de notáveis ou de poderosos.

Jorge Sampaio com certeza nunca ouvir falar no sr. João Cebola - o único empresário português preso por não descontar à segurança social e fuga ao IVA (e para pagar aos seus trabalhadores), etc, etc... Jorge Sampaio de novo com a candura que o caracteriza não se esqueceu de referir um ...
adequado regime de responsabilização, que proteja os cidadãos contra os danos injustificadamente causados pelo sistema de administração de Justiça.

Algo que curiosamente já existe. Ora atendendo que não consta que a decisão de não pronúncia de Paulo Pedroso seja já definitiva, o GOL não é a TRL e vice-versa supõe-se, e atendendo a que o mais mediático caso que se conhece de "injustiçados" que desejem ser ressarcidos é o de Paulo Pedroso não deixa de ser manifestamente infeliz esta preocupação - neste momento - do Presidente da República. Mas, como disse o conhecedor, e por experiência própria, Cunha Rodrigues...

dossiers envolvendo personalidades do mundo político perturba(ra)m enormemente as relações de poder.

Quem sabe, sabe...

Publicado por Manuel 19:44:00  

1 Comment:

  1. Luís Bonifácio said...
    Sei como Jorge Sampaio não falou!
    Só não sei como falou!
    Não falou como presidente de todos os Portugueses.
    Estou indeciso se estava a falar como advogado que é, ou como presidente dos socialistas Portugueses.

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