O musgo de Roseta

O simpático e erudito Dr. Pedro Roseta, que usa o título de Ministro da Cultura, é como pedra que não rola: cria musgo.

Na área do património cultural, o Ministro parece estar a treinar para homem-estátua. A Lei do Património Cultural (LPC), que entrou em vigor em Novembro de 2001, continua a não passar de um conjunto de boas intenções, por carecer da regulamentação que deveria ter sido aprovada no prazo de um ano. A fusão do IPA com o IPPAR, anunciada em Maio de 2002, debaixo de forte polémica, continua por concretizar. Já se perdeu a conta ao número de vezes que o MC adiantou publicamente datas para a consumação desta fusão, todas sucessivamente adiadas para o trimestre seguinte, a pretextos vários.

Quando muitos já vaticinavam que o Ministro teria arrepiado caminho, por ter descoberto a confusão em que se ia meter, veio Roseta declarar ao Público de 20 de Abril que: "a fusão do IPA e do Ippar está na lei e vai ser cumprida. O como e o quando é que estão a ser estudados". Ou seja, dois anos depois, o MC continua a estudar um dossier sobre o qual tinha tantas certezas e que constituiu uma das suas primeiras iniciativas políticas. Para além do carácter recorrente, tal estudo aparece envolto em mistério. Afirma o Público que “o Ministério da Cultura continua sem ouvir os especialistas e sem avançar quaisquer pormenores sobre a estrutura do futuro instituto”. O próprio Director do IPA diz desconhecer o teor do projecto em preparação. No site do MC nada consta.

"Não me parece que este seja um dos principais problemas do país", defende-se Roseta. Talvez não seja, mas será certamente um dos principais problemas a cargo de um Ministro da Cultura que já cumpriu metade da legislatura.
Curiosa noção das responsabilidades políticas!

À espera da anunciada fusão, os institutos – em especial o mais frágil, o IPA – estão compreensivelmente à deriva. Com indefinição de políticas e de lideranças, sem planeamento a médio e longo prazo, afectados por cortes orçamentais cegos, deixam de cumprir até as obrigações mais básicas que a Lei lhes impõe.

Constitui particular dever do Estado e das Regiões Autónomas aprovar os planos anuais de trabalhos arqueológicos”, dispõe o n. 2 do artº. 76º. da LPC. “Anualmente, e na sequência de publicitação adequada nos órgãos de comunicação social, poderão ser apresentadas candidaturas à obtenção de financiamento no âmbito do Plano Nacional de Trabalhos Arqueológicos”, garante o nº. 3 do artº. 4º. do Regulamento de Trabalhos Arqueológicos aprovado pelo D.-L. n.º 270/99. A estes comandos legais dá o IPA pós – Roseta o seguinte peculiar cumprimento: com as restrições orçamentais conhecidas, não será viável proceder à abertura de novo concurso para financiamento do PNTA no corrente ano económico”. Porém, em paralelo, o MC continua alegremente a gastar dinheiros públicos em múltiplas acções que – independentemente dos seus méritos – não correspondem a particulares imposições legais.
Curiosa aplicação do princípio da legalidade!

Igualmente curiosa é a situação relatada no Público de 8 de Abril (p. 41 – link não disponível). Nomeado em 2002, em regime de substituição, o actual Director do IPA só poderia ter exercido funções por um período não superior a seis meses, improrrogável. Não obstante, mantém-se em funções, na mesma situação, face ao arrastamento da reorganização institucional do sector. O gabinete do MC diz que a regularização do caso está em curso, acrescentando, segundo o mesmo Público, que “é possível a nomeação com efeitos retroactivos que ratifica os actos praticados”.

Não poderá ser negado o carácter fortemente original desta gestão por omissão do Ministério da Cultura, associada a uma reconstrução do passado, afinal tão próxima da prática arqueológica.

Dentro da mesma ordem de ideias, talvez seja chegado o momento de Durão Barroso recorrer ao empossamento, quiçá também retroactivo, de um novo Ministro da Cultura, sob pena de o Palácio da Ajuda ficar oculto debaixo de um espesso manto de musgo...

Publicado por Gomez 23:05:00  

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