A extrapolação Mesqui(ti)nha.

O Público de hoje, dá à estampa de primeira página, o título “Testemunha de acusação do processo Casa Pia admite ter mentido”.

Ao lado
, e em letras de contrato de seguro, esclarece que a testemunha

“...admitiu, num interrogatório posterior, ter feito extrapolações quando foi entrevistado por uma psicóloga, durante a perícia de personalidade, feita no IML de Lisboa”.

No interior, o título muda para Testemunha admite ter mentido durante a perícia de personalidade.

Em seguida, escreve-se que ...

“Uma das principais testemunhas de acusação(...) fez extrapolações quando foi entrevistada pela psicóloga A. A. durante a perícia de personalidade, feita há sete meses no IML de Lisboa. O episódio foi abordado com detalhe durante a inquirição de A. A. , ouvida durante todo o dia de ontem, no âmbito da instrução do processo. A psicóloga disse que não conhecia este depoimento da vítima, feito em Novembro de 2003, que lhe foi lido pela juiza.
(...)
“Em declarações aos investigadores, o "braço direito de Bibi" realçou também que o relato feito à perita do IML terá sido "sobremaneira condicionado pelo seu pouco à vontade e pela sua falta de confiança". Esses constrangimentos terão mesmo levado o "braço direito de Carlos Silvino" a faltar à verdade. "Em determinados momentos extrapolou as suas declarações por forma a tornar evidente o seu desagrado", lê-se no relato do depoimento desta testemunha, feito a 18 de Novembro de 2003.”

“As contradições e extrapolações menos curiais do alegado "secretário de Carlos Silvino", nascido em 1985, estão nos autos, quando este foi chamado pelos investigadores a depor em Novembro de 2003. Aos colaboradores da equipa de procuradores, a testemunha - que fez cerca de 17 depoimentos, no espaço de 11 meses - , desmentiu algumas passagens dos seus relatos à psicóloga.

Num caso, negou que tivesse sido violado uma a duas vez por um dos arguidos do processo, como tinha afirmado à psicóloga. Além disso, assegurou que teria sido abusado por uma personalidade que nunca foi interrogada pelo Ministério Público, não em Elvas, mas numa casa em Colares. “

Vamos então extrapolar uma eventual mentirola deste 1 de Abril ...

Quem lê a “notícia”, em determinado ponto interroga-se - mas quando é que foi a “perícia à personalidade” ? E tem que se deitar a adivinhar...

Como o depoimento da vítima foi “feito em Novembro de 2003” e a tal perícia foi “feita há sete meses”, deverá talvez concluir-se que ocorreu lá nos idos de Setembro do ano transacto.

Ora, nas memórias do Público- consta que houve perícias desse género já nos idos de Março do ano passado.

A informação relevante ficou, mais uma vez, no tinteiro do Mesquita... mas em troca, temos mais uma opinião da sua lavra, avalizada pelo seu saber!
 
Qual é ela? Pois... é a afirmação convictamente escrita sobreAs contradições e extrapolações menos curiaisda testemunha!

Esquece o escriba Mesquita uma coisita básica para quem estuda direito penal processual ...

Uma inquirição de testemunha, para além de não ser tecnicamente designada como um interrogatório, também não é equivalente a qualquer depoimento verbal, em entrevista, conversa informal ou teste realizado em sede de “perícia de personalidade”.

Não é equivalente e por isso não há contradições de depoimentos ou coisa que o valha e possa valer como meio de prova, neste caso para anular um ou outro.

Percebe-se o recado que o Mesquita quer dar - a testemunha, como mentiu à psicóloga, é mentirosa e pode ter mentido antes de depois, durante as 17 inquirições, efectuadas em 11 meses.

O que o Mesquita gostaria de escrever era que a testemunha é compulsivamente mentirosa.

Como não chega para tal
, extrapola, ele mesmo. Como a testemunha o terá feito à psicóloga. Deveremos então concluir que o Mesquita é mentiroso ?! Também aí não chega a minha extrapolação...

Por outro lado, há outra perplexidade no artigo do Mesquita - o que é uma perícia de personalidade“?

O Mesquita não diz. E desconfia-se que nem tenha perguntado ou lido o Código.
 
Sendo assim, o leitor do Público gostaria certamente de ser esclarecido dessa circunstância que não é despicienda e remete para as regras de inquirição de testemunhas, que se prevêem nos artigos 128º a 139º do Código de Processo Penal.

No artigo 131º escreve-se que...

“A autoridade judiciária verifica a aptidão física ou mental de qualquer pessoa para prestar testemunho, quando isso for necessário para avaliar a sua credibilidade(...)”

... e no nº 3 do artigo escreve-se ...

“Tratando-se de menor de 16 anos em crime sexual, pode ter lugar perícia sobre a personalidade.”

Foi esse o caso?! A testemunha tinha menos de 16 anos? Como se fez essa perícia?!

Népia, na “notícia” do Mesquita.

A lei refere-se à perícia sobre personalidade no artº 160º do CPP e refere “Para efeito de avaliação da personalidade”. Como isto é matéria de psicologia, a diligência foi deferida a uma psicóloga. Que fez o quê?! Isso também gostaríamos de saber -como se efectuou a conversa com a testemunha; que métodos ou testes se utilizaram e qual o teor do relatório efectuado pela perita. Pouco ou nada disso transparece da “notícia.

Para além disso, deveria o Mesquita pensar e pensar no que a psicóloga escreveu no relatório ...

"Não existe qualquer sistema ou método validado cientificamente que permita afirmar a completa veracidade de um relato ou testemunho."

Mas isso, aparentemente, pouco lhe interessa.

E por isso, o Mesquita confunde alhos de inquirições em sede de prova testemunhal, com bugalhos de relatórios e apreciações periciais. E confunde o leitor que lê primeiras páginas no escaparate e não atenta no dislate!

No fundo, o que o Mesquita tem feito no relato deste processo são “extrapolações”!

Estes jornalistas concorrentes pelo menos, não extrapolam tanto e por isso, as notícias que vão dando, são mais objectivas e menos mesqui(ti)nhas.

Publicado por josé 12:18:00  

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