Montanhas de ...ratos
quinta-feira, março 18, 2004
O Jornal de Notícias de hoje dá conta, pela pena da repórter Tânia Laranjo, do facto de a fraude fiscal nas Finanças ter sido um rato parido pela montanha.
Quanto à montanha, parece que a mesma foi devidamente identificada, sem grandes dificuldades, para o GPS de um Rui Canas, de um Saldanha Sanches ou mesmo aquele que o vulgar cidadão, empresário de sucesso ou não, usa no seu dia a dia de contacto com organismos do Estado, designadamente as Finanças.
A montanha está bem aninhada no seio da Administração Fiscal, a nível superior! Os indícios são já muitos e impunha-se, como é bom de ver para quem defenda a coisa pública, uma investigação profunda e a preceito.
Porém, verifica-se agora que deve haver alguns GPS avariados e que deveriam estar a funcionar melhor do que os outros: os que estão no governo de todos nós e administram a coisa pública!
De facto, os GPS usados no actual Ministério da Justiça e eventualmente no gabinete do director da Polícia Judiciária, parecem ser marca Roskof: detectam ratitos, mas não indicam de onde vêm. Vêem algumas árvores, mas não conseguem discernir a floresta onde estão.
Só assim se compreende a investigação que acabou por se efectuar e que agora se concluiu. Porém, será de louvar a extraordinária capacidade de visão do actual director da Polícia Judiciária, o juiz Adelino Salvado. Muito antes da investigação começar a sério e tendo sabido das intenções da responsável pelo sector, Maria José Morgado, em avançar com uma investigação a preceito, vaticinou: o processo não vai dar nada! Isto, é de génio de investigação criminal. O FBI que se precate. A CIA que o contrate! Temos aqui um Salvado feito Zandinga, como homem certo para o combate à criminalidade! Antes da investigação, já sabe no que ela vai dar. Neste caso, em nada. Como deu!
Contudo, valerá a pena, a este propósito, voltar atrás e num breve flash back lembrar Maria José Morgado, a intrépida magistrada que não tem poupado esforços na sua denúncia de um cancro social: a corrupção!
Em 5 de Novembro de 2002, na sequência da demissão de uma equipa nomeada, apenas três meses antes, para a PJ, para a área do combate ao crime económico, financeiro e fiscal, foi aquela magistrada ouvida em sede de Comissão Parlamentar na A.R. sobre o assunto.
E disse ...
A questão dos arrependidos ou dos agentes colaboradores ou como lhes queiram chamar, tem um quadro legal previsto, mas o quadro legal não faz milagres, pois é preciso haver confiança nas instituições e em quem está a trabalhar naquele momento. É uma matéria que precisa de alguém que lidere o processo e faça a ligação entre a Polícia e o Ministério Público e com o próprio colaborador.
(...)
De facto, isso estava previsto mas não faço ideia sequer se o Dr. Adelino Salvado sabe isso ou não , porque como digo, ele mostrou sempre pessimismo a respeito deste processo. Disse-me que achava que este processo não ia dar nada! É claro que estes são processos terríveis , são do mais difícil que há, suscitam oposição de toda a parte e se não há apoio de um director nacional nesta matéria é o desânimo!
(...)
Até pode ser que não dê em nada! Só a evolução da investigação, o demonstrará. Porque, quando me pediram para pedir a demissão ninguém me deu aquilo que o sr. Director Nacional pediu aqui na 1ª Comissão na A.R. que foi tempo!
Estava no princípio de um trabalho, estava a ensaiar novos métodos, que nunca se tinham ensaiado neste país, porque aquilo que se está a fazer no crime económico só se fazia no tráfico de droga e no banditismo; nunca se fez no crime económico, Nunca houve operações com recolha de prova, com buscas e detenções. Nunca!
E nós fizemos mais de 100 detenções na DCICCEF, todas, todas consideradas legais e confirmada pelos juizes de instrução criminal.
E mais: conseguiu-se em menos de um ano, julgamento de fraudes gravíssimas com o caso Vale e Azevedo, que era um símbolo da impunidade neste país, como o caso de fraude ao IVA em carossel que é dos processos mais difíceis que estiveram em tribunal neste país e que houve condenação em Junho.
Isto conseguiu-se em menos de um ano!
Alguma coisa isto deve querer dizer, apesar de tudo!
É claro que não fiz metade daquilo que me propunha fazer, aquilo que foi feito foi muito pouco, mas houve de facto uma viragem, houve mudança e houve percepção disto por parte da opinião pública. Houve prestígio para a Polícia Judiciária!¿
De facto, quem não concorda com estas declarações?
Só consigo discernir no meu GPS intencional e metafórico, aqueles cujas investigações prejudicam: interessados directos, por estarem envolvidos e indirectos por beneficiarem dessa endémica mentalidade corrupta.
Apesar de tudo, há quem ganhe muito dinheiro com a corrupção e não a faça directamente. Os nomes, nem adianta pôr aqui, porque não precisam de instrumento para localização.
Como de facto, a montanha da corrupção nas Finanças pariu um ratito, é fácil de ver que provavelmente até este vai escapar das malhas da justiça. Basta esperar um pouquito e ver o que acontece assim que entrarem em jogo as garantias processuais, os recursos e contra recursos a que já estamos habituados.
Porém, importa desde já e enquanto é tempo que os cidadãos se interroguem sobre o caminho percorrido para chegar aqui.
Como se vê pelas declarações da MJM, uma pessoa pode fazer toda a diferença e quem manda sabe muitíssimo bem disso.
Então vejamos quem mandou no processo, sendo certo que são essas pessoas que devem explicar o que se passou. E as respostas a determinadas perguntas seriam bem úteis para a compreensão do modo como se investiga em Portugal.
Sabemos o que a intrépida Morgado faria. E pela minha parte, tomo partido a favor da sua posição, porque me parece a mais correcta e profícua.
Aparentemente há pessoas no Governo actual (e futuro?) que têm medo das ideias da Morgado. Mas não deveriam ter, porque já se demonstrou à saciedade e para quem tem olhos de ver, que é pessoa que respeita a legalidade, estritamente. O que só vem demonstrar também que o problema não está nas leis que existem.
Está na vontade! Na ética e nos princípios que se defendem e cumprem.
Assim, as perguntas necessárias:
Quem dirigiu efectiva e na prática, a investigação, na PJ, após a saída da MJM? A PJ ou o MP?
Se foi a PJ, como tudo indica - quem manda na DCICCEF! É que nem sequer está identificado no sítio onde deveria estar.
Dantes sabia-se quem era. Actualmente, alguém sabe quem é e de onde vem o responsável dessa Directoria?! Para além de se saber que é um magistrado do MP, tendo passado antes pela comissão disciplinar da Liga de futebol, sabe-se alguma coisa mais?
Não deveria saber-se?
Porquê? Há alguma razão especial para o secretismo? A pessoa não fala à comunicação social, porquê? Não se sente na obrigação de dar explicações sobre o que se passou?
Por outro lado, o referido processo, em determinada fase, foi alvo de polémica jurídica sustentada entre os responsáveis do MP, Cândida de Almeida e a juiza Mata-Mouros. Houve discordância grave quanto à qualificação dos factos e até quanto à investigação e análise das provas.
A juiza discordou abertamente da investigação e conclusões do Ministério Público e terá criticado asperamente essa investigação, o que motivou recurso judicial.
Talvez seja altura de saber as razões e principalmente saber se estão ligadas à própria investigação.
Quanto a esta, importa saber se foi realizada nos moldes defendidos pela MJM e se não o foi por que razão.
Quem estará disposto a responder e a dar a cara?
Chega de perguntas. Seria muito bom termos as respostas. Para bem da transparência tão apregoada e da imagem das polícias e das instituições judiciais.
Que, é bom lembrar, são instituições de todos nós - e não apenas feudo de alguns.
Publicado por josé 14:18:00