jogos de espelhos ...
quinta-feira, novembro 27, 2003
Há uma terrível tentação, em política e na nossa política, de ver as coisas não como elas realmente são mas como gostavamos que elas fossem ou tivessem ocorrido.
É alias esta obsessão que permite a popularidade dos comentadores políticos - casta criada pelo antigo criador de factos políticos, hoje já em decadência, Professor Marcelo Rebelo de Sousa.
Vem isto a propósito do texto de José Pacheco Pereira no Público, sobre a "resignação" portuguesa quanto ao déficit do eixo franco-alemão, assim como das reações e análises que um pouco por todo o lado surgiram.
É público e notório que não nos revemos na politica de MFL, é tambem público que nunca vimos, em bom rigordsuspeitamos até que nem a própria se vê, MFL como uma espécie de salvadora da Pátria (ainda me recordo de uma crónica completamente tresloucada de António josé Teixeira na TSF nas vésperas de um Congresso do PSD em que este antevia MFL como potencial líder daquele Partido) mas como escreviamos há dias as acções de MFL "são indissociáveis das do primeiro-ministro (como muito bem notava ainda recentemente um editorial do Diário Económico) pelo que pedir a cabeça de Ferreira Leite implica agora, nesta fase, pedir a queda do Governo, pelo que convinha ser consequente".
Pacheco tem razão ao criticar, ainda que encapotadamente Durão, em abono da verdade o grande causador dos sarilhos em que MFL está metida.
Foi Durão que impôs essa coisa inenarrável, da cota do BES, chamada Miguel Frasquilho a MFL, foi Durão que pediu e exigiu rigor a MFL e foi Durão quem sistematicamente deu cobertura a todo o tipo de excepções que resultaram sempre e em última instância na desautorização de MFL. Para quem anda a dormir a última teve a ver com os regimes especiais de excepcão derivados dos fogos desde verão.
O grande erro de MFL não foi tentar domesticar o déficit, o erro de MFL foi não ter exigido condições objectivas, uma ditadura de Ministro das Finanças para o poder fazer.
Quanto à questão do voto a favor ou contra tambem não se tratou de uma simples questão de realpolitik, de príncipios ou falta deles - Portugal tinha de votar a favor.
As artimanhas encontradas sistematicamente para garantir o cumprimento dos objectivos do deficit (sempre através de engenharias financeiras exóticas - como a de pedir à PT para pagar impostos em adiantado) são tão rascas que Portugal não se podia arriscar em armar-se em duro sobe pena de sair feito em carne picada...
Dito isto, há análises que são puro delírio e a de Carlos Abreu Amorim, hoje é uma delas. Durão não pode afrontar Cavaco muito menos despachar MFL, quanto muito tem que rezar para que ela queira saír e de mansinho. O problema de Durão não é Cavaco, que por muito arrependido que hoje esteja o lançou, mas sim o nó cego em que se meteu com a troupe de Santana que tem em José Luís Arnaut um aliado de peso.
O que nem Carlos Abreu Amorim nem José António Lima perceberam é que as presidenciais não são o plano A de Santana. O ego de Santana impele-o a querer ser Presidente mas há gente inteligente a investir demasiado em Santana.
Santana Lopes tem hoje o aparelho do PSD na mão, tem melhor relacionamento com Paulo Portas do que alguma vez Durão há-de ter e se se exceptuar a JSD, onde por razões históricas e conjunturais Santana está condenado a perder apoios gradualmente, mas que não conta para o totobola, Santana pode, em tese, fazer o que quiser com o PSD. Em tese até pode ir a um Congresso, abalrroar Cavaco e fazer-se eleger candidato presidencial, mas é um risco muito grande. As bases não são o aparelho e Cavaco só ganhava com isso.
A estratégia de Santana é outra : é fazer-se caro, um bluff aquí, um bluff alí, deixar ir Cavaco, rezar para que este perca (a convergência estratégica e de bastidores com João Soares, em curso, visa isso mesmo) , e a tempo e horas demarcar-se de Durão para em conluio com Portas fazer um take-over ao PSD antes das próximas legislativas ...
O problema de Santana é que a descrição não é o forte dele e nós somos um dos seus maiores pesadelos.
Publicado por Manuel 19:00:00