A última tentação segundo Miguel Sousa Tavares
sexta-feira, outubro 24, 2003
Há muitos anos atrás, um engraçadinho, creio que francês, decidiu escrever um livro, nada mais nada menos que sobre a Bíblia.
Pretendia demonstrar que todos os milagres citados na Bíblia, Antigo e Novo Testamento incluídos, tinham explicações "ciêntíficas".
Não interessa para o caso que algumas das naturalíssimas explicações arranjadas fossem mais mirabolantes e implausiveis do que os "milagres" que se pretendiam desmontar em sí.
O homenzinho acabou por ficar na história não pelas explicações mas, só e apenas, pela ausência de explicação para um único milagre : a conversão de São Paulo a caminho de Damasco.
Vem isto a propósito do texto de hoje, publicado no Público, por Miguel Sousa Tavares. Confesso que o título, o pomposo "Algumas reflexões rigorosamente inúteis", convida pura e simplesmente a passar à frente e ignorar a ignóbil prosa.
Mas, o que lá está escrito é demasiado grave para passar em claro.
Demasiado grave porque revela não ignoráncia mas má fé. Demasiado grave porque apela ao que de mais baixo na natureza humana - a sobrevivência a qualquer preço. Demasiado grave porque o bravo, e corajoso, Miguel Sousa Tavares se revela no fundo um mero cobarde, que se esconde atrás de linhas e linhas, sem coragem de assumir o óbvio. Demasiado grave, porque Miguel Sousa Tavares, na sua auto proclamada qualidade de profeta, convida o País a caminhar alegremente em direcção ao abismo.
Mas vamos por partes:
O segundo arrasou a defesa do arguido, subscreveu por inteiro a posição do MP e do juiz, mas foi ainda mais longe: numas insólitas e deslocadas considerações, dedicou-se também a arrasar o carácter do suspeito, num tom de ódio que se percebe extensível a toda a classe política.
Mais do que decidir que a prisão preventiva era legal, os desembargadores passaram directamente à sentença condenatória, acrescentando-lhe o enxovalho do arguido e um panfleto político para destinatários certos.
Socorrendo-me do "Dicionário da duplicidade quotidiana", de Pacheco Pereira, confesso que "nunca antes" tinha visto tal coisa.
Mas os tempos vão, de facto, para coisas nunca antes vistas.
Aprecie-se a esperteza saloia do Tavares : O primeiro acordão, o da libertação, não é questionado nem por um nano-segundo, isto apesar de todo o País saber hoje as circunstâncias peculiares que rodearam a sua elaboração: o Processo não foi consultado, não foi aprovado por unanimidade, aproxima-se mais de um manifesto planfletário destinado a consumo da comunicação social e deíficação do Pedroso, etc, etc.
O segundo, aprovado por unanimidade, por gente que se rebaixou ao ponto de - magna heresia - consultar o processo, quando, a inocência de Pedroso e a ausência de pressões saltam à vista de todos, é esse sim enxovalhado.
Miguel Sousa Tavares pode não ter qualificações para mais nada, mas só pelo ponto 1, tem de certeza qualificações para ensinar jornalismo na Coreia do Norte ...
Passe a anedota que é o introito, o Processo é de facto "inócuo" : já fez correr mais tinta que todo e qualquer processo nos últimos 100 anos - mas é tão inócuo que nem se percebe aliás porque razão se dá o Tavares ao trabalho de escrever por causa dele. De qualquer modo, e só por este introito, quando o Berlusconni precisar de um novo ministro da Justiça aquí o nosso Tavares tem as credenciais exactas para substituir o actual lá do sítio.
De seguida o Tavares, muito pouco criativo, decide entrar na mesma linha do Prado Coelho no dia anterior, e indigna-se pela história do "senhor Paulo". Infelizmente para Tavares todos somos iguais perante a Constituição independentemente do título, seja ele conde, doutor, Tavares ou deputado. É uma chatice para a costela monárquica do Tavares mas a igualdade perante a Lei, às vezes pelo menos existe!
Aquí o Tavares, ensaia uma de Mephistofoles de vão de escada, tentando seduzir o PSD e o Governo não para a tese da cabala, mas para a tese do pântano, já soberanamente desmontada pelo Francisco José Viegas ...
Passando à frente da questão dos 900 km/hora do Marçal de vamos directos ao que realmente interessa: Ou o Tavares sabe algo sobre o Processo do Mike de Oeiras que nós não sabemos, e aí devia explicar, ou está na melhor linha do muitomentiroso, a atirar lama para o ar e a difamar as instituições! Quem é o Tavares ?
Para finalizar ainda sobra tempo ao Tavares para perorar sobre Carrilho e o PS. Sobre o PS já aquí dissemos que a questão da liderança é um problema estrito dos seus militantes embora seja dramático ver um País com um Governo, globalmente, rasca com uma oposição à rasca . Sobre Carrilho, e independentemente dos seus timings e motivações, tem uma dignidade e uma coragem que o Tavares nunca teve ...
Há muitos Tavares neste País, especialistas sobre tudo mas nunca dizendo nada, mas sempre com uma perfeita noção de timing. Para este Tavares, o timing é tudo. É a arte de nunca dizer mal, nem antes nem depois do tempo, é a maldicência elevada à categoria de um bocado de cortiça. E agora, meus caros, o timing é o de apelar ao bom senso, a uma certa auto-censura do sistema judicial, não directamente que isso queima, mas lançando o medo, a incerteza e a dúvida.
Se o Tavares fosse um Homem, com tudo no sítio, dizia, alto e a bom som, aquilo que ele e muitos pensam em surdina : Que é preciso, imperativo até, acabar com as investigações, à canelada, ou de que forma for, para que muitos que hoje são "heróis" não acabem "enterrados" como vulgares criminosos. Afinal é a isso que se resume o seu texto depois de espremidos ...
Mas Tavares é um cobarde, limita-se a atirar as pedras e a esconder as mãos ...
E infelizmente não só "existe" como há gente que se deixa levar por ele ...
Publicado por Manuel 22:04:00