A insustentável leveza dos deputados





































No Portugal Contemporâneo, Pedro Arroja, atira-se a um whizz-kid, sem grandes maneiras no vestir, do grupo parlamentar do Bloco de Esquerda que ocupa lugar em S. Bento, por designação partidária, sem ter sido eleito. Atira-se ao kid, pelas figuras que o mesmo faz, em público na tv, com ar de "maltrapilho" e de queque da comunidade urbana do Porto.

O problema aflorado no postal de PA, no entanto, é muito mais vasto e preocupante do que o de um tal whizz-kid de 24 anos, a debitar ideias feitas, para a nova juventude de uma Esquerda florida.

A Visão da semana passada, trazia um tema sobre os deputados que elegemos, para perguntar onde estariam e para concluir que apenas três dos deputados eleitos nas últimas legislativas, mantiveram o lugar cativo. Os demais, deambularam por aqui e ali, no aerópago político do sistema que temos e que eles mesmos delinearam.

A reportagem, assinada por Sónia Sapage, ( que se pode ler acima, com clique na imagem), dava conta de 227 substituições de parlamentares, desde que o actual Governo tomou posso, ou seja, na presente legislatura.

Dos 227 indivíduos que não foram escolhidos directamente pelo povo, em eleições legislativas, com listas connhecidas, onde os nomes que figuravam eram considerados como "elegíveis ou não ilegíveis", alguns acabaram mesmo eleitos...pelos directórios partidários que se crêem autorizados democraticamente a decidir, em nome do povo.

A substituição e escolha serôdia destes deputados de lugares recuados na lista, depende da vontade dos parlamentares, e dos directórios partidários que neles mandam, porque a lei, generosa e que os mesmos gizaram, o autoriza e permite, mesmo eticamente.

A Comissão de Ética, tem a palavra e geralmente, a escolha é ratificada pelo grupo que se substitui assim, ao povo eleitor. Na maior das legalidades. E na maior das desvergonhas, é preciso dizê-lo, porque os próprios o assumem.
Pedro Mota Soares, nem tem dúvidas: É preciso acabar com o deputado-locomotiva que surge à frente nas listas e depois desaparece". O CDS, partido de que faz parte, entretanto, já mudou 11 vezes, o nome do único deputado que elegeu por Viana do Castelo, por exemplo...

As razões da saída dos deputados inicialmente eleitos, foram elencadas pela Visão, com direito a retrato dos mais notórios e que acabaram por ir para outros lugares, políticos e de relevo institucional, ou mesmo para " a privada" que rende sempre um pouco mais, quando rende através da experiência adquirida.
A maioria desses deputados, são conhecidos, não fizeram outra coisa na vida senão deputar, administrar em nome do Governo, politizar gestões públicas e convocar boys and girls para a polinização do sistema.

Um caso singular, é o de Paulo P., deputado escolhido da lista de não eleitos, hoje figura de capa da revista Pública, do Público. A entrevista parece definitiva quanto ao "problema" e a entrevistadora é outra da para-classe política: Anabela Mota Ribeiro, um dos elementos da grande Câmara Cooperativa da actual inteligentsia nacional.

Torna-se interessante a introdução à conversa com Paulo P., assim:

" Entrou na vida política por via das associações de estudantes e teve no irmão um modelo. O resto é do domínio público. Estudou sociologia. Foi delfim de Ferro Rodrigues. Foi Secretário de Estado, ministro do Trabalho e da Solidariedade, porta-voz do PS. Tinha uma carreira promissora. Teve a vida interrompida. Foi envolvido num escândalo sexual que abalou o país .Esteve preso quatro meses e meio. Voltou ao Parlamento . Deprimiu. Saiu de um país que então lhe era demasiado pesado .Há cerca de quatro meses o Estado foi condenado a pagar-lhe uma indemnização de cem mil euros. Ganhou a Acção que interpôs por prisão ilegal no âmbito do processo Casa Pia. Um erro grosseiro.

Portanto, Paulo P. acha-se completamente reabilitado no espaço público, político, para assumir funções de representação do povo. Não foi eleito, em lugar elegível, mas entende-se com direito próprio a ocupar lugar de eleitos. Não foi ainda completamente ressarcido de coisa alguma, pelo Estado, porque o Estado ainda não foi condenado em nada. Não ganhou a acção, ainda. A condenação é provisória, pode ser anulada e o Estado nada ter que pagar, por a nada poder ser condenado, e afinal não haver erro grosseiro algum, a não ser de quem condenou o Estado.

Por outro lado, não ficou desvanecida a dúvida que, bem ou mal, ficou lançada na reputação pessoal, porque a decisão da Relação que o libertou definitivamente do fardo de ter de responder penalmente, considerou, com um voto de vencido de um desembargador, que subsistia no seu caso uma "dupla e insanável dúvida" "quanto à veracidade das imputações feitas ao arguido" e "quanto à pretendida inocência deste"."Assim sendo e porque na dúvida, o MP não deve acusar nem o juiz deve pronunciar, tem de concluir-se que não se encontram reunidos indícios suficientes de o arguido haver cometido os imputados crimes".

Desde essa altura, Paulo P. ficou ilibado penalmente, não podendo ser responsabilizado por isso, em termos criminais. Agora, não se contesta a decisão sequer, e muito menos se afirma o contrário. Mas o contrário não é o que parece e Paulo P. imputa por vezes a quem sobre isso escreve, não admitindo outra coisa senão o atestado de ilibação completa, impingindo intenções torpes a quem o não segue.
Está enganado, e por muito que lhe custe, lá do seu banco corrido onde insulta pessoas, tidas como anónimas, tem de admitir essa discussão, porque se encontra no espaço público, e de lá parece não querer sair, assumindo lugar de representação popular.

E essa discussão, decorre não por causa da inocência comprovada ou pela culpabilidade por comprovar, mas apenas por causa do princípio de direito penal, interpretado de foma lata, do in dubio pro reo que nem sequer foi aplicada em sede de julgamento, lugar do tira-teimas penal, mas no âmbito da instrução decidida por uma única juiz, numa decisão sufragada depois por mais dois juizes de um colectivo de três.
No âmbito das acções penais que interpôs contra os acusadores, perdeu sempre o confronto. O que vale num caso, deve por isso valer no outro. Ou seja, se os acusadores, para Paulo P., são mentirosos e efabuladores, a justiça nunca lhe deu razão nesse ponto. E o empate, derivado da dupla e insanável dúvida, continua. Como aliás, o próprio confirma, ao referir que houve momentos em que até os cooperantes correligionários, duvidaram. Por causa dos media envenenados, segundo explica.

A propósito da investigação penal que a esse resultado conduziu, Paulo P. adianta algo mais interessante na entrevista a Anabela Mota Ribeiro. Acha que o nosso sistema de justiça funciona em última instância e que produz decisões justas, cinco, dez anos depois. Acha, provavelmente como o cidadão comum acha. Aliás, todos sentem isso, em todos os casos mediáticos que envolveram políticos, directa e indirectamente. Ou seja, que foi sempre feita justiça...em última instância. É esse o sentimento geral da população que Paulo P. corrobora, sem dúvida alguma.

Depois, coerentemente, acha que o mal, está na "cultura de investigação criminal". E exemplifica: " por que é que a investigação criminal construiu um caso, o meu caso, sem que houvesse quaisquer elementos que o justificassem; por que é que o manteve; e por que é que impediu que se investigassem as origens. (...) O sistema de investigação criminal é preguiçoso e negligente."

E termina a entrevista com uma declaração espantosa:

" Olho para a política como uma intervenção cidadã e sem qualquer ambição de nenhum género. Sou hoje de terceira, quarta linha partidária."

E deixa uma hipótese de desistência da política, por não pertencer à primeira.

Pois bem, já aqui o escrevi e reescrevo. Paulo P. devia abandonar definitivamente a actividade política, seja de primeira, seja de décima linha. A não ser que quem o acusou com factos, lugares e nomes, se retracte, pedindo desculpas e assumindo as consequências de uma mentira, como aconteceu em Outreau. E então, sim, questionar abertamente o sistema que tal tornou possível. Foi esse o sentido de um pedido de investigação aos métodos de investigação, efectuado pelo sindicato dos magistrados. Por causa do problema das cabalas que é recorrente e aconteceu no caso Camarate ( continua a saga das cabalas bombistas) , das FP25 ( Otelo achava que vinha tudo tocado do lado do PC) do sangue contaminado ( cabala imensa do MP de Cunha Rodrigues, contra a honra impoluta de uma ministra) , do ministério da saúde ( outra cabala do mesmo género e proveniência) e agora da Casa Pia, (com urdidura montada por forças obscuras de cabeleira loira).

Porém, até lá, haverá sempre quem acredite nos ofendidos, nos investigadores, ditos negligentes, nos magistrados ditos preguiçosos, e que afinal são dezenas, para desgraça de Paulo P. que tal não aceita nem compreende. Mas será sempre inevitável e perfeitamente legítimo, porque também é a honra dos mesmos que está em causa e a lógica processual assim o admite, não podendo Paulo P, impedir a discussão nestes termos.

E por isso, nada adianta sobrepor o princípio geral de inocência presumida, porque o princípio também funciona a favor de quem age de boa-fé, para apontar estas perplexidades fundamentadas.
Os seus apaniguados e correligionários da grande Cooperativa político-mediático-partidária, acham ainda que tudo se tratou de uma enorme e obscura cabala que um dia ainda vai ser esclarecida. Mas nada aparece de concreto e positivo, a não ser as denúncias tipo muito-mentiroso.

E então, enquanto esse dia não chega, do almejado esclarecimento geral e necessário, entendem o regresso de Paulo P. à actividade política, para já, de terceira linha, como natural e normalíssimo, nesta democracia.

Há neste entendimento um problema que entronca naquele primeiro, enunciado no artigo da Visão: o modo de funcionamento do sistema político-democratico que temos.
Muitas são as vozes que proclamam já a falência desse sistema pelo descrédito que engendra e pelos escândalos que encobrem, contemporizando com práticas que mais tarde descobrem inadmissíveis: o caso das viagens-fantasma ( este ano, o Orçamento reserva-lhes verba substancial para conhecerem mundos e fundos), o caso das remunerações suplementares pela pertença a comissões e adjacências e ainda por reflexo, o caso das atribuições de casas e casinhas a quem não precisa, no âmbito autárquico, protagonizado por políticos saídos do mesmo alfobre e sistema. Isso para não falar, das compatibilidades éticas entre advocacia privada e negócios, públicos, de deputados
Estes problemas éticos, são relegados para a normalidade do funcionamento do sistema, tal como as renúncias, substituições e suspensões de mandatos, como os apontados.

As substituições, suspensões e admissões, na Assembleia da República, dependem por isso deste sistema que identifica a ética com a lei republicana e a moral com conceitos privados cada vez mais deletérios.
O resultado final de tudo isso, resume-se e assimila-se à retórica do Plenário e uma endogamia, cada vez mais evidente, no interior dos partidos representativos da democracia e do modo como designam os seus.

Se algo e alguém desacredita a democracia, como sistema de governo geral, é isso que se enuncia e enumera, por muito que isso custe a ler aos Paulos P. e a todos os que fazem parte da Cooperativa.
Mesmo aqueles que por distração sobre os princípios que enunciam, entendem haver imprescindíveis na política.

Publicado por josé 15:59:00  

6 Comments:

  1. lusitânea said...
    É assim mesmo.O PP bem pode andar a dar-nos música.Nós é que deveremos meter no mesmo saco de principios todos aqueles que derem cobertura ao sr.O PS acha-o bom?Então abandone-se o PS...
    OSCAR ALHINHOS said...
    Para que saibam que nós sabemos, bastará dar uma vista de olhos pela SIC Notícias, enquanto não apagarem -, para vermos as onversas entre os nossos políticos proeminentes ( Ferro Rodrigues, PP, António Costa, etc, e perceber o polvo ).

    Quanto à presunção de incoência, sendo válido este princípio, ainda hoje li num jornal que Maria das Dores, clama a sua incoeâcia e tb o Vale e Azevedo diz que é inocente... Enfim!...
    Justiça, à portuguesa!
    OSCAR ALHINHOS said...
    Para que saibam que nós sabemos, bastará dar uma vista de olhos pela SIC Notícias, enquanto não apagarem -, para vermos as onversas entre os nossos políticos proeminentes ( Ferro Rodrigues, PP, António Costa, etc, e perceber o polvo ).

    Quanto à presunção de incoência, sendo válido este princípio, ainda hoje li num jornal que Maria das Dores, clama a sua incoeâcia e tb o Vale e Azevedo diz que é inocente... Enfim!...
    Justiça, à portuguesa!
    josé said...
    Entendamo-nos:

    O referido Paulo P. pode estar inocente e não sou eu que direi o contrário, porque nunca o disse.

    O mesmo Paulo P. nunca entendeu isso e já me insultou no blog, por causa disso.

    O que eu digo claramente, é o que sempre disse:

    Alguém que por qualquer motivo, é apanhado num caso destes que não foi arquivado liminarmente e permitiu a instalação de uma dúvida que o próprio tribunal da Relação reconhece, no acórdão que o libertou de prisão preventiva, não deve permanecer em cargos de confiança política que sejam púlicos e tenham relevância pública, como é o de deputado.

    Para mim, é uma vergonha que isso aconteça, porque a ética devia ser outra.

    É uma opinião que não pressupõe um juízo de culpabilidade ou não culpabilidade.

    E por isso, o Paulo P. tem sido incapaz de perceber estes postais sobre o mesmo assunto.

    Pressupõe apenas que é preciso uma ética política diferente da que existe.

    E também acrescento que Jaime Gama nunca, mas mesmo nunca deveria ter sido escolhido para presidente da AR.

    Pelos mesmíssimos motivos éticos.
    Laoconte said...
    Em vez da inocência do ex-arguido PP, acredito mais na imparcialidade do MMº Juiz Rui Teixeira ou na veracidade dos depoimentos das vítimas. Aliás, não são as palavras dessas mesmas vítimas que levaram os restantes arguidos do caso à barra?
    Gostei muito do artigo.
    zeladorpublico said...
    Sem comentários...tudo dito

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