Poder judicial

Um indivíduo ucraniano, detido pela PJ da Guarda, no última Sexta-feira, 20 de Setembro, foi ouvido em interrogatório judicial no dia seguinte e libertado pelo juiz de instrução.
A libertação, suscitou um coro de críticas, pelo facto de o indivíduo ter sido apresentado desde logo como particularmente perigoso e ter na sua posse um "arsenal" que assim o indiciaria.

O CSM, órgão de gestão e disciplina dos juízes portugueses, perante a onda de críticas ao juiz, que pediu a esse órgão de gestão uma intervenção, não se sabe em que termos e com que fundamento exacto, elaborou e publicou o seguinte comunicado, hoje, tirado daqui:

«Após solicitação dirigida ao Conselho Superior da Magistratura pelo Exmo. Juiz de Instrução Criminal do Círculo da Guarda e depois de recolhida a informação tida por pertinente, esclarece-se e informa-se o seguinte:
1.º - Tem sido noticiado na comunicação social que o Sr. Juiz, depois de ouvir em interrogatório um cidadão estrangeiro detido, o libertou, não obstante este ter sido encontrado na posse de grande quantidade de armamento e se tratar de pessoa perigosa e procurada pelas entidades policiais;
2.º - Tais notícias não correspondem, na sua essência, aos factos constantes do expediente processual apresentado ao Sr. Juiz aquando do interrogatório;
3.º - A decisão proferida pelo Sr. Juiz centrou-se nos factos indiciados recolhidos e que lhe foram apresentados e não nos que, efabuladamente, têm surgido depois;
4.º - Porque não é a primeira vez que, nos tempos recentes, sucede uma situação destas, o Conselho Superior da Magistratura pondera solicitar às entidades competentes uma averiguação para determinar a autoria das referidas divergências entre a realidade processual e o que vem sendo noticiado.
Lisboa, 25 de Setembro de 2008
O Vice-Presidente- António Nunes Ferreira Girão, Juiz Conselheiro»
CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA | COMUNICADO 8/2008 | PROC. 2008-1069/D

O comunicado do CSM, de defesa pessoal do juiz de instrução, um órgão de soberania nessa função e titular do poder judicial, nesse caso concreto, diz essencialmente o seguinte:

As críticas dos media, do "povo" em nome do qual se aplica justiça, são injustas, porque a decisão, muito criticada, do juiz de instrução, se baseou em factos diversos ( presumindo-se menos graves ou menos "efabulados" do que os que apareceram depois nos media) daqueles que lhe foram apresentados no expediente para submissão a interrogatório.

Esta defesa corporativa ( é disto que se trata, porque o juiz, titular individual do poder judicial, não a fez sózinho e pediu ajuda do CSM), suscita também ela, várias observações.

Em primeiro lugar, a explicação pouco ou nada explica, para além de dizer que os factos que o juiz de instrução conheceu, não eram aqueles que depois surgiram nos media.
Ora, sobre isto, há que dizer muito simplesmente, que esses media, no próprio dia da apresentação do detido ao JIC ( juiz de instrução criminal), não faziam segredo da perigosidade extrema do indivíduo e mostravam até aos espectadores televisivos o arsenal e explicavam de que se tratava e que receios infundiam tais armas, na posse de tal indivíduo.
Essas informações que podem ser revistas, aqui, em duas reportagens televisivas, revestem importância porque uma delas é anterior ao interrogatório judicial.
Pode e deve ponderar-se sobre isto que o JIC não ouviu notícias, não viu notícias nessa manhã e não soube de nada, a não ser no acto de interrogatório que efectuou. Pode e por isso, pode explicar-se desse modo. Mas ficam outras explicações por dar, já que se deram explicações.

O comunicado do CSM não refere o modo como se efectuam os interrogatórios judiciais, o que permitiria perceber aquilo que poderá ter falhado no caso concreto. Seria um comunicado mais longo, mas daria para entender melhor.

Isto é, torna-se importante saber se o "expediente", citava factos e opiniões das autoridades policiais, como os apontados na reportagem televisiva e anunciados publicamente pelos responsáveis da PJ, antes ainda desse interrogatório e que pelos vistos, só o JIC desconheceria, pelo menos nos termos do comunicado do CSM que nega essa circunstância.

Torna-se ainda importante saber se o MP, primeira autoridade judiciária a quem é apresentado o tal "expediente" e tem obrigação de elaborar o demais expediente para apresentar o detido ao JIC, com a indicação das provas concretas e indiciárias existentes e que justificaram a detenção e imputação das infracções criminais, também conheceria a perigosidade anunciada publicamente.

Finalmente, torna-se essencial perceber se o JIC procurou inteirar-se do caso concreto que lhe foi apresentado, das razões que lhe foram expostas por escrito e verbalmente e se procurou ouvir os agentes de polícia judiciária que se encontravam presentes no acto de interrogatório e se ouviu o que os mesmos sabiam sobre o indivíduo em causa.

Só depois de se saber isto, será possível comunicar com clareza ao "povo", factos como este.
Enquanto tal não suceder, comunicados como estes, configuram ainda mais ruído do que foi levantado em clamor na opinião pública.

Finalmente, não se percebe como é que um Juiz de Instrução não tem "autorização", para esclarecer, ele mesmo, enquanto titular do poder judicial no caso concreto, o povo em geral e o CSM que nem sequer é órgão desse poder jurisdicional, já a tenha e apareça a esclarecer o "povo", em vez do juiz visado.
Isto, não entendo, porque a lógica dos princípios obedece a regras que me parecem neste caso, confusas.

Publicado por josé 22:33:00  

9 Comments:

  1. mm12345678@hotmail.com said...
    O meu comentário deveria ser colocado no Câmara Corporativa, já que o principio reconhecendo isto: ao pé do José, o Miguel Abrantes é apenas um simpático aprendiz da disciplina de destilação-de-ódio-contra-a-judicatura-por-meio-da-desinformação.

    Sempre defendi que a formação dos futuros juízes e dos futuros procuradores no CEJ deveria ser separada, pois no largo do Limoeiro os procuradores-formadores ensinam aos futuros juízes de instrução barbaridades como estas:
    - «em primeiro lugar» (sic) as opiniões e “informações” matutinas veiculadas pelos media - “Diário da manhã”, “Bom dia Portugal”, “Tertúlia cor-de-rosa”, etc. - constituem meios de prova (irrefutáveis, de resto) atendíveis pelo juiz de instrução, designadamente quando fundamentar a prisão preventiva com base na apreciação/afirmação (pela “instância” dos media) da “perigosidade extrema do indivíduo” (sic)...
    - em segundo lugar, o JIC deve tomar conhecimento e fundamentar a sua decisão (também) com base nas «opiniões (sic) das autoridades policiais»;
    - «finalmente», o JIC deve [dar a mão ao Sr. Procurador, às escondidas do Defensor, e] procurar inteirar-se «das razões que lhe foram expostas (...) verbalmente (sic)» («que justificaram a detenção e imputação das infracções criminais») e deve procurar recolher prova incriminatória por sua iniciativa, designadamente «ouvir os agentes de polícia judiciária que se encontravam presentes no acto de interrogatório» e ouvir «o que os mesmos sabiam sobre o indivíduo em causa».

    Já opiniões como esta nem os procuradores formadores do CEJ as manifestam publicamente: «as críticas dos media» (objecto do comunicado do CSM) são coisa igual às críticas «do "povo" em nome do qual se aplica justiça».
    Finalmente, talvez não fosse despropositado abandonar as suas presunções - presume que «um Juiz de Instrução não tem "autorização" para esclarecer» - e admitir que o Conselho Superior da Magistratura interveio porque não houve um “juiz visado”, mas sim um órgão de soberania visado.
    Não o incomodo mais, por forma a não o distrair do seu actual imperativo categórico (!) - “age de tal maneira que possas aproveitar qualquer pretexto para criticar a judicatura” -, agora que parece ter abandonado o seu costumeiro - “age de tal maneira que possas aproveitar qualquer pretexto para louvar HRH Souto Moura”.
    Parafraseando-o, comentários como o seu «configuram ainda mais ruído do que foi levantado em clamor na opinião pública».

    Cumprimentos.

    P.s. Não me recordo, por falta de memória minha, de o ter visto algum dia apelidar de “defesa corporativa” um comunicado esclarecendo o público emitido pela PGR.
    josé said...
    Não li o seu comentário. Comecei a ler e vim já escrever isto:

    Não lhe respondo. Se é juiz, parece-me muito mau juiz. Porque nem sabe ler e interpretar o que se escreve, lendo as suas primeiras frases.
    josé said...
    Mas faça o favor de se identificar para o meu mail:

    jmvc@sapo.pt

    Se tiver coragem para tal.
    josé said...
    E já agora vá ler os meus comentários no InVerbis que o podem esclarecer um pouco mais, não me tomando por aquilo que não sou.
    josé said...
    Mas afinal, depois de ler o seu comentário vou responder-lhe no postal. Enquanto espero pelo debate McCain-Obama.
    josé said...
    Pois é mm:

    A coragem fica por aqui, nestes comentários anónimos e com a acidez de uma azia mal esclarecida.

    Vá lá! Não se acanhe. Revele a identidade que farei o mesmo. Por mail.
    mm12345678@hotmail.com said...
    Ó Sr. José, o Sr. deixou-se afundar neste pântano bloguista e, agora, não consegue sair deste registo.
    É tristemente previsível.
    Porque carga de água estaria eu interessado em conhecer a sua identidade?
    E se eu estivesse interessado em divulgar a minha, já o teria feito. Acha que é o seu desafio pueril que me pode levar a mudar de ideias?
    josé said...
    Não, mm. Não precisa de trocar ficha de identidade.

    Era apenas para saber se estaria disposto a proferir as mesmas atoardas com nome posto.

    Não está.

    "Puerilidade", então?

    "Pântano bloguista", também?

    Vá depressa ao espelho e repita as expressões. Vai ver que lhe ficam bem.
    josé said...
    E afinal, todas as pistas estavam lá, no endereço digitalizado de email. Só faltava uma pequena letra no início e um hífen a separar os mm.

    Enganei-me no género, mas não me enganei no estilo.

    E por isso, vou reincidir por imperativo categórico que a tal me impele e por causa dos alemães que tanto agradam a quem os não entende.

    O papel do JIC ao contrário do que alguns pensam, não é o de dizer "não" ao MP.
    A partir do momento em que um(a) JIC assim pensa, já está enviesada nos imperativos.

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