"Estád(i)o de Sítio", uma verdeira história de Natal

Pinto Monteiro, o recém-indigitado Procurador Geral da República, merece - plenamente - o título de Homem do Ano de 2006, caminhando a passos largos para bisar em 2007. Infelizmente, consegue-o pelas piores, das piores, das razões. Paulatinamente está a fazer os possíveis, e os impossíveis, para destruir de vez a pouca credibilidade que resta da Justiça Portuguesa, e em particular a do Ministério Público. Não me refiro já a essa episódio que foi a repetição da votação para o seu vice (porque o primeiro resultado não lhe agradou), não me refiro sequer à sua performance, no evento de despedida a Dias Borges, no último fim de semana, onde usou de uma linguagem, e de um estilo, popularucho e demagógico, nunca, jamais e em tempo algum vistos num magistrado de topo. Também não me refiro à sucessão de almoços e encontros de trabalho, até em S. Bento (!), que tem ocupado a sua agenda. Não, nada disso chegava para bater no fundo, mas Pinto Monteiro conseguiu-o, em pleno, com a 'espectacular' nomeação de Maria José Morgado para coordenar (?) a ressaca da investigação ao nosso submundo do futebol.

A nomeação de Maria José Morgado, e as reacções que se lhe seguiram, revelam muito, sobre Pinto Monteiro e sobre o Portugal contemporâneo. Revelam, por exemplo, que Pinto Monteiro que não teve, pura e simplesmente, coragem, nem força, nem autoridade, para 'correr' com Cândida Almeida do DCIAP (o que até tinha sentido, goste-se ou não da senhora (e eu não gosto particularmente) dada a necessidade evidente de refrescar/agilizar aquela estrutura, também a nível humano) e que, por isso, achou mais fácil, criar, ao arrepio de qualquer cobertura legal ou formal, uma meta-estrutura, um DCIAP paralelo, entregue - no caso - a Morgado. Da sua fraqueza, Pinto Monteiro acha que fez força, esquecendo-se que toda a lógica do MP, passa, passou e devia continuar a passar, por ser uma estrutura, uma equipa, hierárquica, onde todos tinham o seu espaço, mas sempre numa lógica global e estruturada. Ora, sendo as coisas o que já eram, em vez de regar e podar o origami de que deveria ser a cabeça e raiz, enquanto PGR, Pinto Monteiro optou pelo mais fácil, puxando pelos sentimentos mais básicos das massas - nomeou alguém que se vê - e é vista - como justiceira, para aplacar a plebe. Confesso que me é irrelevante saber se Pinto Monteiro tem alguma fé, de facto, nos dotes miraculosos da dra Morgado, ou se a nomeou simplesmente, para se 'livrar' de uma 'sombra' (?) incómoda. Tal é, irrelevante, por uma razão muito simples - quando se fizer história ninguém vai querer saber porque é que a Dr.a Morgado foi nomeada mas sim por que é que aconteceu o que aconteceu, e aí, não é a senhora que vai ficar em causa, é todo um aparelho de Justiça que vai sair ainda mais de rastos.

Em primeiro lugar o combate (global) a qualquer tipo de criminalidade não deveria sair nunca do controlo estrito das estruturas funcionais que existem para esse fim. Se estas não funcionam - põe-se a funcionar, ponto! Em segundo lugar, é preciso ser-se verdadeiramente ingénuo para ver a questão da 'bola' como um fenómeno isolado no contexto da nossa 'cultura'. Não é! Os clubes são SADs que metem muito dinheiro, muitos interesses, e por isso devem ser tratados como qualquer outra entidade que prevarica. A simples ideia de criar uma task force especial para combater o crime no âmbito do desporto é em si duplamente absurda - porque o fenómeno está - em sim - intimamente ligado ao colarinho branco 'sentido lato' pelo que, das duas uma ou se combatem e perseguem gambuzinos ou... estamos direitinhos no tal DCIAP ad-hoc e paralelo.

Depois, há - claro - a personalidade da dra Morgado - conhecida pelas frases grandiloquentes e tiradas de largo alcance - que é tudo, e estes dias confirmam-no à exaustão, menos o recato e descrição necessários, que é tudo menos, não a equidistância, mas a serenidade necessária face a fenómenos que mexem com muita gente.

Pior, ao contrário do que julga, a Dr.a Morgado está longe, muito longe, de perceber o fenómeno - ou não se meteria numa situação destas no contexto em que se meteu. A justiça não se credibiliza por alguém de repente aparecer a correr o país em bons carros, com batedores da PJ, e... da imprensa, à frente e atrás, a prometer mundos e fundos (ao magistrado original do Apito deram... um passe de autocarro). A justiça não se credibiliza por alguém aparecer de repente a pedir que confiem em si. Credibiliza-se com resultados, se esses resultados simplesmente aparecessem e, obviamente, que não vão aparecer. Porque não há condições para que apareçam, porque não há estrutura, porque não há organização e porque não há - em bom rigor - ninguém (que saiba) a mandar. A dificuldade extrema da Dr.a Morgado em reunir 'equipa', com recusa atrás de recusa, indicia o mais, de trágico, que ainda há-de vir, a começar por um novo despacho do PGR a aclarar o primeiro, e que colocou em órbita Maria José Morgado. Não há o básico, sequer.

Mas as reacções que se seguiram também dizem muito da nossa imprensa e dos nossos políticos. Da nossa imprensa porque se recusa a pensar, sempre - em algo mais que o próprio umbigo - Foram atrás, em arco, de Morgado porque sabem que esta, impreterivelmente, lhes garante muitas e boas cachas, como antes foram do Dr. Lopes, e como vão da dr.a Cândida. O resto, o essencial, pura e simplesmente não lhes interessa - querem é 'novela' e op resto que se lixe. Dos nossos políticos porque já não conseguem ver a justiça como algo separado e independente, mas apenas e só como uma extensão do seu mundo, com as mesmas regras, a mesma lógica e o mesmo imediatismo.

Enfim, um somatório de irresponsabilidades, de uma série de classes que se julgam, e tomam, por inimputáveis, e que vivem simplesmente para o 'momento', sem qualquer rasgo nem visão, que não seja o minuto, a hora, o dia, a notícia, o telejornal, o caso, o espectáculo, seguintes...

Esta é - contudo - a minha história de Natal, porque só mesmo nesta quadra é que se consegue conceber tanta ingenuidade. Só mesmo nesta quadra para ousar pedir ao Altíssimo para que tudo não passe mesmo de uma 'história', em prol de um milagre, porque - afinal - há muito que se ultrapassou o domínio dos factos estritos e se entrou no domínio na fé.

A todos um bom Natal.

Publicado por Manuel 14:18:00  

8 Comments:

  1. james said...
    Desta vez estou plenamente de acordo consigo.
    Anónimo said...
    Intervenção assaz limpa e certeira, a sua. E todavia arrisco.
    Dizia-se de Souto Moura que era inábil e dono de uma visão do sistema de justiça em geral e do MP em particular que se movia apenas e só na quadratura da norma jurídica. Verdade. Dizia-se de Souto Moura que era um homem bom, para aplainar o débil PGR. Verdade.Dizia-se de Souto Moura que ficou refém do Processo Casa Pia em geral e da acção de João Guerra em particular. Verdade .Dizia-se de Souto Moura que o MP lhe passou ao lado, ou vice versa. Verdade.
    Vem Pinto Monteiro ciciando penhascos, valentias e trovões que não passam a biqueira do sapato e logo surgem setas na imprensa viradas para o céu.
    Interrogado pelos jornalistas que, por ora o afagam, à saída de Belém sobre a “herança que teria na PGR” respondeu lampeiro, com o rasgo que define os visionários e os construtores de pirâmides e, se necessário, como afirmou nas palavras que balbuciou na despedida de Dias Borges, contra o “politicamente correcto” que isso é “como quem muda de tribunal.A herança são os processos que lá estão”. Nada mal. Lúcido, penetrante,audaz. Aguardamos, ansiosos, que o escriba não acumule os processos.
    A agenda no “site” é ridículo e incompreensível. Confunde-se transparência com Voyeurismo, forma com substância, para já não falar do perigoso que é umas reuniões constarem e outras não (como não pode deixar de ser) o que, desde logo, suscita a perplexidade e a suspeita. O que se revela e o que se esconde. O positivo e o negativo. Disto se dirá nos compêndios mais sérios, com algum sabor amargo de injustiça, que estamos perante a “típica gestão saloia de quem não sabe de vindimas” (no dizer de do Grande Anacleto).
    A questão do Vice. “Um duplo Vice, por favor. Mexido mas não agitado” só pode deixar a léguas a inabilidade de Souto Moura. Se isto não é inabilidade é sobretudo ignorância embutida em carbono 12.
    Pinto Monteiro, até ver, não sabe onde mora e duvido que venha a encontrar o carteiro. O “Apito Morgado” é paradigmático da inconsciência e contem a violência dos actos exterminadores.
    Na verdade, independentemente de tudo o que venha a suceder, já todos perdemos. Perdeu a Justiça portuguesa e perdeu o MP. Exactamente pelas razões que o Manuel aduz.
    Veremos nos próximos tempos o estilo Morgado na sua melhor performance: o escapar cirúrgico da informação que interessa pôr nos media para manter o frenesim, o estrelato e continuar a ter os jornalistas em apoio. Muitos deles continuarão, enquanto “compagnons de route” da personagem a suportá-la. O tempo tudo desgasta e outros não deixarão de se interrogar sobre os resultados e os milagres que se anunciavam mas que tardam. O povo desesperará. “Será possível? Nem a justiceira nos salva?”
    Rapidamente se perceberá quem controla e desmanda em comunhão natalícia com os jornalistas. Pinto Monteiro não será. E quando tomar consciência do facto estará refém da fulgurante estrela mediática.
    E aqui, diga-se, de algum modo, Morgado estará para Pinto Monteiro como João Guerra esteve para Souto Moura. Com uma diferença de monta. João Guerra nunca pretendeu o poder, o protagonismo ou sofreu da doentia obsessão pelas luzes. Morgado é uma mosca sempre circulante à volta das lâmpadas e …”tantas vezes vai o cântaro à fonte que queima as asas”.
    A nomeação de Morgado representa, em bom rigor, um simulacro de “facto político” à Marcelo rebelo de Sousa ou uma “aparência de fazer “ à Sócrates. O mesmo é dizer que, na aparência está tudo resolvido, mas na substância, tudo se quedou no exacto momento em que tudo parou.
    Pinto Monteiro não sabe de vindimas. É pena. Caso contrário seria básico que percebesse o quisto que estava a criar na estrutura do MP. O DCIAP não funciona ? Rua com a Cândida (com o que nada se perdia e muito se ganhava) no sentido de se dinamizar e dar conteúdo útil a uma estrutura importante. Optou pela fuga para a frente. Timorata, medrosa. Politicamente correcta e desastrosa.
    Lidar com “certidões” extraídas de processos conduz em geral ao fiasco. Trata-se de algo que se não pode apurar atempadamente pelas mais variadas razões no momento próprio . E vão 3 anos que acrescem mais outros tantos anos reportados à data dos factos. Tudo está mais do requentado, podre, mal cheiroso. Cadáver. Porquê então gastar e desperdiçar recursos em tal avejão? A populaça quer sangue dá-se-lhe a faca e o alguidar. A populaça quer a Justiceira, pois assim seja, nem que isso se fragilize e destrua o que resta do sistema de investigação penal.
    Claro que a estrela de televisão e jornal poderá ter a sorte de dar um pontapé numa pedra e de lá saltar um construtor que enfia uns dinheiros numa Câmara que, por sua vez o enterra, designadamente num clube de futebol. Se assim for não deixará de cantar em sucessivas conferências de imprensa o seu próprio êxito.
    Esquece, porém, pelas razões que o Manuel já expôs , que o cadáver será já, nessa altura, o MP e no mesmo enterro vão com sete palmos de terra a MJ Morgado e Pinto Monteiro.
    Queira Deus esteja enganado. E que um caso que foi “Dourado”, depois “Salgado”, agora “Morgado” descanse, por fim, em paz
    Aristófanes de Alexandria
    josé said...
    alba: as Festas em honra do menino Jesus, decididamente andam a fazer-lhe mal ao bestunto. O qual, diga-se, já não andava por aí além.

    Esse pseudónimo in albis, lembra-me outro nome que deseja boas festas em tom de concórdia.
    Enfim, cada um faz a terapia de que precisa, mas assim vai ser difícil de comentar os seus postais de boas festas.
    Adriano Volframista said...
    José
    Muito interessante o seu post. Acutilante e certeiro, pena é que se tenha "esquecido" de quatro "pequenos" factos:
    Que as certidões retiradas dos processo principal, viajavam desde há quase um ano, de tibunal em tribunal.
    Que Cândida Almeida não lhe foi concedido os poderes especifícos que MJM possui. Nesse sentido, CA tinhe e tem de se cingir às competências impostas pela lei.
    Que o "pobre" do magistrado encarregue do processo "Apito Dourado", foi perseguido por seguranças privados, é pena que só agora tenha dado notícia do facto. É verdade que nos esqueçemos que este mesmo magistrado foi, publicamente adomestado pelo anterior PGR, por falta de vigor e vontade em avançar com o processo.
    Que MJM é o único magistrado do MP que instruiu um processo que condenou efectivamente um dirigente do futebol.
    Veja se assim as "coisas" não ficam diferentes??
    Cumprimentos
    josé said...
    Caro Adriano Volframista:

    O post não é meu. É assinado por Manuel que não se identifica no nome como josé.

    Só respondi em comentário, ao anónimo in albis, porque os insultos direccionados além de gratutitos, vinham assinados por quem me parece que padece de desequilíbrio de raciocínio.
    o anónimo in albis, sendo comentador ocasional, estabeleceu já um padrão que com outro nome, varia.
    Um caso para análise.
    josé said...
    Mas já que relaciona alguns factos, deixe que comente alguma coisa do assunto que geralmente tento evitar.

    1. Se as certidões tinham asas, precisavam de quem lhas cortasse ou de quem lhes desse um tiro certeiro para as abater ao efectivo dos ovnis.
    Só aconteceu agora? De quem é a responsabilidade? Repare que não falo em culpa, mas em simples responsabilidade por este estado de coisas na justiça. Não é certamente dos magistrados que se limitam a aplicar a lei com as interpretações possíveis.

    2. "CA tinha e tem de se cingir às competências impostas pela lei." Pois tem. Como todos têm. O problema é que o DCIAP funciona mal por manifesta falta de meios e aparentemente com rotinas viciadas.
    O que se vê no DCIAP é um vazio de resultados e um mar de lamentos, sempre. É uma evidência que o nome de CA já não se adequa profissionalmente aos tempos que correm. Está estafado o discurso e não se vêem resultados satisfatórios. Se fosse numa equipa de futebol, há muito que teria saído.

    3."O pobre do magistrado" do Apito, chamado Carlos Teixeira, chegou a alertar para os factos que são evidentemeente graves. Quem tem competência para investigar tais factos? Como foram investigados? Se ficarmos apenas pelos factos conhecidos agora e que dão conta de perseguições destrambelhadas de quem deveria ter mais juízo pelas responsabilidades que tem, julgo que pouco haverá a fazer, porque nem sequer se poderá falar em ameaça séria, mas apenas de farronca a sério.

    4.Não me lembro de o magistrado Carlos Teixeira ter sido publicamente admoestado pelo anterior PGR pela inoperância. Não haverá por aí alguma confusão?

    5."Que MJM é o único magistrado do MP que instruiu um processo que condenou efectivamente um dirigente do futebol."

    Talvez seja assim, mas de que estamos a falar? De um burlão que deixou rabos de palha por todo o lado, apesar de tentar escondê-los.
    Vamos a ver se agora, os outros, também terãod deixado tantos assim...

    O que lamento é que MJM não tenha continuado no cargo e que tenha sido corrida por um juiz que estava em comissão de serviço na PJ e de lá foi corrido por ter sido apanhado com as calças na mão de indiscrições várias e vergonhosas.Mesmo que nem tenham sido crime, como sempre o disse por aqui. Se MJM tivesse continuado, talvez tivesse sido apanhado algum peixe graúdo no fisco. Mas havia aparentemente quem assim não quisesse e por isso MJM foi corrida.

    Esta última não descodifico. Fica mesmo assim.
    Anónimo said...
    Tal como já foi dito, acho que esta "loja" cheira mal...

    Não gosta de Pinto Monteiro e defende essa figura obtusa do anterior PGR.
    Azar o seu, parece que vai ter que engolir este PGR
    Anónimo said...
    Dizer que Pinto Monteiro "...está a fazer os possíveis, e os impossíveis, para destruir de vez a pouca credibilidade que resta da Justiça Portuguesa, e em particular a do Ministério Público. Não me refiro já a essa episódio que foi a repetição da votação para o seu vice (porque o primeiro resultado não lhe agradou)" é no minimo um raciocinio desonesto e visa desacreditar pela critica corriviso e destrutiva a figura de alguém que não conhece, além que demonstra uma enorme falha na recolha de informacção sobre aquilo que escreve.

    O seu artigo é uma colecção de raciocinios e argumentos falaciosos, tendencialmente e intelectualmente desonestos.
    Se tivesse o pevilégio de ter Pinto Monteiro como professor como eu tive, certamente pensaria duas vezes antes de disparar em todas as direcções, apenas com o objectivo de abater o passarão que veio por a capoeira em alvoroço.

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