uma lição

Para melhor compreender certos fenómenos políticos internos convém ir aprendendo com os outros. Convém, por exemplo, meditar no que se passou nas últimas legislativas alemãs. A Sr.a Merkel começou com larga vantagem e acabou ganhando por uma unha negra. Convenceram Merkel que para segurar o centro (que vinha do SPD) não o poderia alienar, apresentando um discurso 'centrista' e cinzentão. Como resultado, muitos deixaram de ver vantagens na CDU, que de tão soft se tornou demasiado parecida - nas propostas e no discurso - com o SPD, o qual acabou com um resultado que inicialmente não esperaria...

Publicado por Manuel 21:14:00  

2 Comments:

  1. António Viriato said...
    Embora com escasso conhecimento da política alemã, julgo que o que terá segurado o apagado Schroeder foi um certo temor da sociedade alemã, outrora e ainda hoje, uma das mais coesas da Europa,em ver destruído ou desmantelado o chamado Estado de Bem-Estar Social, responsável pelo conforto atingido nos países em que foi bem aplicado, sobretudo nas sociedades do Norte e do Centro da Europa. É absolutamente natural que os cidadãos destas sociedades não estejam dispostos a abdicar de qualquer coisa que muito estimam e bem conhecem, em favor de outra cheia de incerteza e precariedade. Por enquanto, ainda não se descobriu nada, em matéria de coesão social, que possa substituir-se ao Estado de Bem-Estar Social Europeu. Pode ser caro, mas a qualidade tem o seu custo...
    NyOrlandhotep, the Chaotic Chaos said...
    Desculpe-me que lhe diga, mas a sua análise está completamente errada. A senhora Merkel tinha tudo a perder em usar um discurso mais à direita.
    Se se tentasse informar acerca das razões da contestação ao governo de Schroeder, descobriria que estas foram causadas sobretudo pelo descontentamento da população alemã com as reformas pró-mercado de Schroeder, reformas essas talvez essenciais, mas extremamente impopulares.
    O "voto de sondagem" na CDU era um voto de contestação, ilustrava apenas o descontentamento com o Governo, e não qualquer inclinação especial para a direita do eleitorado. Naturalmente, o primeiro a ganhar com o descontentamento dos eleitores com o Governo é o maior partido da oposição. Por isso, à medida que a eleição se aproximava, o eleitorado foi interiorizando que o que podia esperar de Merklel eram mais "reformas orientadas ao mercado", que era exactamente aquilo que era temido, sobretudo pelos eleitores da Alemanha de Leste. Por isso, a intenção de voto na CDU diminui rapidamente. E, se olharmos para os resultados finais, o que aconteceu foi na verdade uma transferência do voto do centro-esquerda para a esquerda populista (e "pós"-comunista) representada pelo partido Die Linke.
    E é necessário juntar a isto, claro, a falta de carisma evidente de Merkel que provocou também uma transferência de votos à direita, da CDU para o FDP.
    Mas Merkel dificilmente pode ser condenada por fazer um discurso "centrista cinzentão", antes pelo contrário: arvorou-se em herdeira ideológica de Margaret Thatcher e de Ronald Reagan (a quem citou muito explicitamente durante o debate televisivo com Schroeder) e fez propostas bastante arrojadas de direita neo-liberal, de que é bom exemplo a arrojada proposta de um imposto único, sem escalões.
    A sua análise tenta apenas escusar-se a invectivar os eleitores (como muitos neo-liberais, desde o comentador de política europeia da CNN - falha-me agora o nome - até à revista The Economist) de cobardia e de imobilismo.
    Os neo-liberais fariam bem em compreender certo fenómeno: que as suas ideias não são particularmente populares com largas faixas do eleitorado.

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