A Anatomia do "Monstro" : O Impacto das Scuts

Publicado hoje no suplemento de Negócios do Diário de Notícias

Sobre as Scut a sociedade portuguesa apenas conhece o seu efeito visível, que se reflecte no não pagamento pela utilização de auto-estradas. Discutir de uma forma coerente as Scut passa não só por relativizar sobre os seus custos, como pela colocação de questões relacionadas com a eficiência de uma política de investimento público, sem qualquer sentido estratégico.

O que na altura, e ainda hoje, os criadores da ideia têm dificuldade em explicar traduz-se em dois pontos-chave O Estado português, devido às restrições orçamentais, não possuía nem possui recursos financeiros para erguer a obra segundo o modelo tradicional. E na escolha pelas Scut muito dificilmente se poderá ter olhado para os cronogramas financeiros de cash-flows necessários ao pagamento do encargo assumido.

Hoje, e sem uma política monetária e cambial descentralizada, o retorno que se obtém do investimento público é algo que se vem apresentando como mais difuso, dadas as externalidades que lhe estão associadas. É ponto assente que a economia portuguesa precisa de melhor investimento público e não de mais investimento público.

O problema das Scut começa exactamente em 2005, atingindo o pico de despesa no quadriénio 2011--2015, altura em que a decisão, tomada em 1996, obrigará o Estado a arrecadar extraordinariamente 750 milhões de euros em impostos ou financiar-se através da emissão de títulos da dívida pública. O verdadeiro problema das Scut ainda mal começou.

Parece-me evidente que a aceitação pública do dever de pagar impostos, apesar de depender em elevado grau da demonstração da qualidade das despesas que o esforço dos contribuintes permite ao Estado realizar, não pode servir como argumento para que se realizem obras desta envergadura e com este impacto financeiro futuro, sem pelo menos acautelar os riscos que lhes estão associados.

A decisão de agora, em 2005, se optar por permanecer com as Scut, mesmo que balizada pelo Governo até às autárquicas, tendo como contraponto o aumento de impostos sobre o combustível para o seu financiamento, remete de forma indirecta para a generalidade dos contribuintes o pagamento das vias. Sendo verdade que a reposição de portagens poderá ter um custo elevado - cerca de 300 milhões de euros -, não é menos verdade, que a teimosia em manter uma promessa custará a toda a economia uma repercussão nos custos, e logo no consumo privado que estava a ser o motor - ainda que pelos piores motivos - do seu fraco crescimento nos últimos 12 meses.

Numa altura em que Portugal enfrenta uma grave crise de finanças públicas, o Governo teima em não compreender que o problema não é o défice, mas sim a forma de conseguir reabilitar a economia portuguesa. As Scut não só oneram em termos de despesa pública, como induzem nas empresas um problema de competitividade ao nível do acréscimo dos custos com combustível.

Se ao aumento do ISP associarmos o aumento do IVA para financiar o problema que a Caixa Geral de Aposentações apresenta, percebemos que as soluções deste Governo são ilusórias e acima de tudo transitórias. É discutível que a solução não pudesse passar por uma redução da carga fiscal para dinamizar a economia, em que o mesmo Governo implementava reformas sectoriais dignas desse nome.

Ora o país que, em 1996, assumiu uma decisão de fundo, como hoje se sabe, sem que a sustentação da mesma estivesse demonstrada não pode tolerar, uma vez mais, que o Governo resista a publicar estudos coerentes que sustentem a decisão de avançar com a Ota e o TGV. Projectos que, salvo demonstração em contrário, são meras fantasias

Publicado por António Duarte 16:35:00  

4 Comments:

  1. Anónimo said...
    depois de ler esta análise do impacto do monstro, veio-me à cabeça uma luta tão cerrada, empenhada e militante, de alguns socialistas de nomeada, sobre as portagens da CREL. O silêncio tem sido de Ouro : Comunicação Social, Partido Socialistas, Autarcas Socialistas da Amadora e Loures, mas acima de tudo da tal super poderosa comissão de utentes da IC19 e afins. "Ai Manuela, Manuela.... tu é que sabias os rosários que cantavas".
    Anónimo said...
    Ao idiota do autor de tal artigo, que julga que a autoestrada da Beira foi feita por favor a partir de Lisboa para a Beira Alta, os beirões perguntam:

    "Por que razão fizeram a autoestrada da Beira Alta para Lisboa (e não de Lisboa para a Beira Alta), e não para Espanha e França? Por que razão ainda não somos independentes ou ainda não nos ligámos a Espanha, já que lá há muito mais autoestradas sem pagar portagem do que cá? Por que havemos de estar a alimentar parasitas de gabinete em Lisboa?"
    Anónimo said...
    ao idiota do anónimo anterior, de outro anónimo beirão:

    será porque em Espanha o estado tem as contas direitinhas e não investe em elefantes brancos? E por isso lhe sobra dinheiro?

    Os parasitas estão em todo o lado. Em lisboa, no Porto, no Algarve, no Minho, em Trás-os-Montes, nas Beiras (Alta, Baixa e Litoral), no Alentejo, nos Açores e na Madeira. E não se encontram só em gabinetes. Estão mesmo em todo o lado, do estado ao sector privado. Transversalmente.

    PS Estou equivocado ou a duplicação do IP 5 fez-se primeiro da Guarda para Espanha?!?!
    Anónimo said...
    Ao anónimo beirão anterior, que rebateu as minhas perguntas sobre a autoestrada da Beira:

    A Espanha, desde há muitos anos, com contas públicas desequilibradas e com 20% ou mais de desemprego, fez todos os "elefantes brancos" que são hoje as suas muitas autoestradas, as suas centrais nucleares, o seu novo aeroporto de Barajas, o mundial de futebol de 1982, os jogos olímpicos de Barcelona, o museu Gugenheim de Bilbau, o TGV de Madrid a Sevilha, a Expo92 de Sevilha, etc., etc.

    Note bem, quando a Espanha tinha contas públicas desequilibradas e uma profunda depressão económica!!!

    Será por isso que agora as tem mais equilibradas e se propõe gastar 250 mil milhões de euros em mais obras públicas, essencialmente no TGV?
    Já reparou que se nós investíssemos como eles em infraestruturas públicas na mesma proporção do plano deles para os próximos dez ou quinze anos teríamos de investir, não 25 mil milhões, mas 50 mil milhões?

    A ignorância e a curteza de vistas pagam imposto em Portugal? Se pagam, acautele-se!

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