Seis = Medidas = Seis
domingo, maio 01, 2005
Segue um postal, de mangadalpaca©, alusivo a uma faena...
O engenheiro José Sócrates veio anunciar na Assembleia da República seis medidas – seis, destinadas a «desbloquear o sistema judicial» por haver situações de «bagatelas processuais» que não teriam dignidade para que os Tribunais delas se continuassem a ocupar.
- 1. Reduzir as férias judiciais de dois para um mês.
Muito já foi dito. Acredita-se que, sendo uma medida emblemática de uma certa «teimosia política», apanágio do engenheiro Sócrates, poderia até ter algumas virtualidades, desde que enquadrada num pacote mais vasto de medidas: vamos ver se não terá resultados contra-producentes. A lógica de produtividade dos tribunais não tem a ver só com o(s) tempo(s) de trabalho. Poderia pensar-se em consignar algum tempo das férias judiciais para a necessária formação dos magistrados. Mas, isso nem sequer esteve nas argutas cogitações do governo (sabendo-se que a formação contínua dos magistrados é cada vez mais necessária). Por outro lado, se os trabalhadores judiciais não podem ser favorecidos, também não poderão ser prejudicados, face aos demais trabalhadores.
- 2. Aumentar o limite da não punibilidade dos cheques sem provisão para € 150,00.
Não parece mal, mas não pode ser verdade que esse tipo de processos ocupe o número de magistrados anunciado. O crime de cheque sem provisão perdeu expressão estatística (embora tivesse tendência para um recrudescimento). Por outro lado, aí apenas se constatará uma transferência de processos, do foro criminal para o foro cível, sem grande alcance para o sistema.
- 3. Suprimir a renovação automática das apólices de seguros.
Essa medida contrariará directivas internacionais em matéria de defesa de consumidores, e irá contrariar ainda mais os interesses das seguradoras. Vamos ver a sua viabilidade e eficácia.
- 4. Pulverizar por todas as comarcas, em função do domicílio do consumidor, o foro de apreciação das questões relacionadas com o (in)cumprimento de obrigações contratuais.
Esta medida não terá qualquer impacto, podendo até, nalgumas comarcas, perturbar o seu funcionamento, ao mesmo tempo que a sua redução nas comarcas «colonizadas» pelas empresas prestadoras de serviços (telemóveis, crédito ao consumo, etc.), que, de certa forma, se haviam «especializado», não será relevante.
- 5. Aumento do valor do procedimento de injunção para € 15.000,00.
O despacho dos processos transitará do juiz para as secretarias judiciais.
- 6. Conversão de transgressões em contra-ordenações.
As poucas que ainda existem, não são, de forma alguma, bloqueadoras do sistema.
Se se está a pensar nas transgressões de passagem na Via Verde sem pagar, não vão faltar recursos e as subsequentes execuções das coimas, pois que essas dificilmente consentirão o pagamento no acto (para isso, teriam que posicionar vários carros-patrulha da BT em cada portagem).
Em suma - Não serão significativos os impactos destas seis-medidas-seis. Trata-se de um primeiro pacote, é certo. Mas o que não se pode é deixar de constatar uma clamorosa contradição de princípio: o engenheiro Sócrates queixou-se de que o sistema judicial prejudicava a eficácia (ou eficiência? Acho que ninguém sabe!) do tecido económico e empresarial. Mais uma providencial descoberta para justificar sucessivos erros de políticas económicas e fiscais, para não falar da falta de modernização dos empresários (continua a ser a única categoria profissional sem exigência de um mínimo de qualificações) e das empresas, mas enfim, o que é preciso são apoios do Estado e fundos da U.E., para não se entrar em colapso económico, tudo por culpa do sistema judicial…
Simplesmente, estas anunciadas medidas, se bem repararem, não são nada amistosas da instrumentalidade que o sistema judicial era suposto assegurar «ao serviço da economia». Pelo contrário. Vão ser altamente lesivas dos interesses de muitas empresas.
P.S. Há tempos, escrevemos um post sobre o «Esplendor do Direito Penal do Inimigo», criticando a proposta de rusgas policiais acompanhadas por magistrados, anunciada pelo ministro A. Costa (o outro, o ministro de Estado). Ao que parece, o dr. Costa veio fazer mea culpa, reconhecendo que, afinal, tinha «laborado em erro». Regista-se, com justiça, a assunção do erro, a ser sincera…
Daí que se diga: um pouco mais de coerência. Ou, pelo menos, de reflexão.
mangadalpaca©
Publicado por josé 14:17:00
2 Comments:
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Um abraço
Carlos Lima
a estreia do Socrates no parlamento, pelo que já consegui saber o rapaz, cada vez diz mais vacuidades, que ninguem percebe onde quer chegar, chequei a tempo de ver o Marcelo, dar-lhe com a chibata. Mas afinal os tontos que foram a correr votar no PS, ainda precisam de mais demonstrações para veriificar, que o homem não è mais que um saco de palha? e mais grave, parece que cada o devia ajudar não è emelhor..........