Vasco Pulido Valente
"Democracia e Semi-Democracia"


Santana Lopes resolveu anteontem protestar contra o "universo paralelo" que a "comunicação social" perversamente cria. O " país real", segundo ele, é outro. Presumo que a diferença (uma "grande diferença", segundo Santana) está em que o "país real" o adora e ama e o "universo paralelo" não tem por ele a mesma imoderada estima. Não há político que, tarde ou cedo, não venha com isto. Não há político que entre a adulação da gente que o rodeia e o exame crítico, e até hostil, da imprensa ou da rádio não decida logo que o "país real" está na adulação. De resto, costuma acontecer que à medida que a distância aumenta entre o "país real" e o "universo paralelo", mais "real", para o político, se torna o "país real" e mais "paralelo" o "universo paralelo". Não admira que Santana Lopes se convença que a sua corte e os jantarinhos meio histéricos do PSD são a única e autêntica realidade e que o mundo cá de fora não passa de uma fantasia, fabricada por um bando oculto de inimigos.

Mas Santana, na sua infinita capacidade de auto-ilusão, leva a coisa mais longe. Para ele, a existência do "universo paralelo" prova incontestavelmente que vivemos numa "semidemocracia". Certos jornais, por exemplo, "fazem campanha ao lado" de certos partidos. Por outras palavras, não "fazem campanha" ao lado dele. A Santana este facciosismo não parece aceitável. Nunca pareceu, aliás. Logo que se viu primeiro-ministro tratou de correr com Marcelo da TVI e de arranjar um jornal de confiança. Tudo por bem, claro: para introduzir o "país real" no "universo paralelo" e remover o "semi" da semidemocracia. A democracia plena, suponho, seria a miraculosa multiplicação de Luís Delgado pelos média, em que de estagiário a director não escapasse um lugar. Na impossibilidade prática de chegar, por enquanto, a essa espécie superior de liberdade, que o seu colega e adepto João Jardim já instituiu na Madeira, Santana lamenta com certeza o "país real" onde nasceu e cresceu: o país da "Máxima", da "Caras", da "Lux" e do "24 Horas"; o maravilhoso país da Cadeira do Poder. O destino quis que ele caísse dessa essência da pátria num "universo paralelo" de anões malignos que o detestam. Por mais que disfarce, Santana não se resigna a este sofrimento. A sua natureza "combatente" não o deixa abandonar a democracia dele. A nossa é "semi".

in Público

Publicado por Manuel 10:17:00  

0 Comments:

Post a Comment