rosa ...

Acabou o Congresso do PS. José Sócrates é agora formalmente líder da oposição e putativo candidato a primeiro-ministro.

Um destes dias o João Morgado Fernandes escrevia ...


Dou-me cada vez pior com os lugares-comuns. Deve ser falta de paciência, uma forma educada de me referir à minha própria idade. Um dos lugares-comuns em que mais tropecei nas últimas semanas respeita à corrida para a liderança do PS. Que foi uma troca de insultos, ouvi. Que foi um deserto de ideias, li. Que nada de novo trouxe, disseram. O lugar-comum: a política caiu no vazio. Discordo. Como raras vezes antes, discutiu-se política. Com ideias, com propostas marcadamente diferentes. Com propostas construtivas, no caso, de uma alternativa. Até com elevação, apesar das picardias normais, e até desejáveis, nestas coisas. Parece-me que, nestes longos meses de campanha, ficou claro que Alegre e Sócrates têm um PS bem diferente um do outro na cabeça [parece que havia um terceiro candidato...]. A política de alianças, o papel do Estado, o aborto... uma data de coisas em que divergem e sobre as quais se pronunciaram. E tudo isto foi feito em público, com clareza de linguagem. Pela parte que me toca, estava bastante curioso acerca do desfecho, embora não tivesse dúvidas sobre o vencedor. Mas, pela primeira vez, ia ser esclarecido acerca do que pensa e que quer o eleitor médio do PS - parto do princípio de que os militantes são, de alguma forma, representativos do eleitorado. Após o recentramento da era Guterres, interessava-me saber que PS temos, onde exactamente se coloca ele no espectro partidário. Sobre isso, esta disputa pela liderança foi clarificadora. Como poucas vezes na política portuguesa. E é por isso que não entendo os comentadores.

Estive quase, quase, mesmo quase, para replicar na hora mas, por uma vez, esperei. Esperei pelo Congresso, pela entronização, a ver se se consumava algo que me tivesse passado ao lado. Não me parece que tenha passado.
Eu lembro-me de João Soares (aquele que falou vagamente em nacionalizações (!)) insinuar que Sérgio Sousa Pinto, apoiante de Sócrates, teria dito que os resultados seriam sempre num mesmo sentido, lembro-me de Alegre se queixar do peso excessivo da estrutura no universo eleitoral do PS, lembro-me de umas polémicas por causa da existência ou não de debates entre os candidatos e em que termos, e até me lembro das picardias ocorridas no final de um no Porto. Eu constatei a falta de speed de Sócrates na recta final (que antecedeu as directas) que fez voltar à ribalta a máquina de Coelho, o qual cobrará a seu tempo bem caro o elevado score que a sua gente conseguiu a Sócrates, também me lembro de um texto vago e nebuloso publicado no Público antecedido por um outro publicado no DN, lembro-me de isso tudo. Mas debate sobre temas concretos, reais, substantivos, projectos, reformas ? E sei que a esmagadora maioria dos militantes do PS que votaram em Sócrates o fizeram por uma, e uma só, razão bem prosaica - por o considerarem, só e apenas, como o mais bem colocado para recolocar o PS no poder, independentemente das teses, projectos e ideias que defenda que isso é secundário. O PS não virou à direita, ao centro ou à Armani, o PS simplesmente prepara-se para tentar reconquistar o poder e Sócrates estava. Hoje, ouvi atentamente o discurso da vitória de Sócrates, como ontem tinha ouvido o de Gama, e está lá tudo. O que devia estar, e o que se calhar não devia. Está lá a sede de poder, o desejo de vencer, está lá a energia, como está lá toda a tropa, e todos os vícios, da era Guterres. Sócrates não é líder, Sócrates é, por enquanto, quanto muito o farol. É ver o olhar reluzente de Coelho, o sorriso de António Costa ou a monumental lata do Tó Zé Seguro que negociou a sua continuidade na liderança do grupo parlamentar pelos jornais, o à vontade dos pesos pesados que apoiaram Alegre para se perceber que Sócrates é chefe, mas pouco. Até no caso da inclusão de Narciso Miranda e Manuel Seabra, o duo dinâmico de Matosinhos, nos orgãos nacionais, Sócrates perdeu ocasião de brilhar - foram os senhores que sairam pelo seu próprio pé, não o líder que disse alto e bom som que os não queria lá... Quanto ao discurso final no que tem de diagnóstico objectivo até eu o subscrevo em boa parte, no estilo é e apenas um guterrismo new age, nas propostas, bem, nas propostas, vamos ter uns novos Estados Gerais, por outro nome, mas de substantivo nada, rigorosamente nada. E eu até nem sou muito exigente, só queria saber o que pensa, e o que propõe, José Sócrates em matéria de políticas económicas e financeiras, só e apenas. Revê-se no SPD alemão ? nas políticas do senhor Zapatero ? nas até há bem pouco tempo do senhor Chirac ? A mim bastava-me, não queria mais. Estou-me nas tintas para saber se o PS está mais à esquerda ou à direita, afinal se tal questão não preocupa o PCP que esperou que Sócrates fosse eleito para anunciar a sua disponibilidade para "acordos" então não preocupa ninguém logo e por muito que custe a Alegre todo o putativo debate em torno desta foi puro vapor... Muito provavelmente vai haver eleições antecipadas, muito provavelmente Sócrates terá boas hipóteses de as ganhar, ao contrários destes que estão no poleiro não está publicamente queimado e a memória é curta, mas substantivamente continuo sem saber o que irá realmente fazer muito menos quem será o seu Ministro das Finanças. Talvez o João Morgado Fernandes me saiba dizer...

Publicado por Manuel 18:45:00  

5 Comments:

  1. Rui MCB said...
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    Rui MCB said...
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    Rui MCB said...
    *****
    Anónimo said...
    Bem visto e bem escrito mas merececia a foto do cheio de tiques Richard Geere vestido à Armani e não a q foi escolhida.
    gin said...
    Bom, bom ... na verdade tem algum interesse saber se virou à direita ou se se manteve à esquerda, porque é isso que ainda hoje permite distinguir algumas opções. Mas como dizes, nada de novo foi ali dito, nada de importante foi dito porque ainda se terá que negociar com os barões do aparelho.
    Pouco percebo de triquices partidárias, para além daquelas que são óbvias, mas desconfio que propostas inovadoras de governação não há, apenas o desejo de substituir aactual maioria.

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