Na senda da cepa torta II
o jornalismo tipo AAM

Tal como o queijo da serra comporta "tipos" que se portam como meros sucedâneos dos produtos originais, assim certas actividades carregam com tipos que se destacam pela originalidade na desvirtuação do que devia ser genuino e fiável. No jornalismo, o paradigma do genuino e do sucedâneo pode ser encontrado lado a lado, no Público. Este jornal publicou um Livro de Estilo em que se escreveu um manual resumido do jornalismo ético e se mostrou um espelho do rigor na informação.

Entre outras recomendações de estilo, encontra-se esta:


Os casos de natureza militar, política, ideológica ou partidária, como também os de ordem económico-financeira, prestam-se a frequentes campanhas de manipulação e desinformação pura. Os jornalistas do PÚBLICO garantirão sempre o recurso aos indispensáveis mecanismos da objectividade: pluralidade das fontes, investigação, ausência de ideias preconcebidas, abertura a situações inesperadas e a perspectivas novas, contraditórias ou não com as convicções de cada jornalista.

Vem isto a propósito da "notícia" de hoje, assinada pelo jornalista António Arnaldo Mesquita, já aqui verberado pelas opiniões que verte nas entrelinhas de cada artigo que escreve sobre o caso da Casa Pia, fazendo-as passar como verdades assumidas pela consciência colectiva.

Hoje, o Público titula: "Souto Moura criticado por juizes e advogados" e na pág. 2 :"Souto Moura novamente debaixo de fogo cerrado". Tal e qual!

Já aqui se escreveu que o papel de Souto Moura, enquanto PGR, pode e deve ser criticado por quem o entenda fazer. Porém, há um aspecto essencial, que se torna incontornável para que as críticas sejam justas: demonstrar que o actual PGR não cumpre a lei que temos e de caminho demonstrar que distingue as pessoas conforme o seu grau de influência na sociedade. Essa característica essencial ao magistrado é, para muitos, insuficiente, pois reclamam do PGR a sua definição como político. Para mim, é um erro, embora aceite poder estar errado.

A Casa Pia tornou-se a pedra de toque para lhe atirar pedras , servindo para tal qualquer pretexto, mesmo os artificiais.

Na "notícia " do Público, AAM começa logo por escrever que a declaração do PGR em Badajoz gerou "estupefacção nos meios jurídicos". Creio bem que estupefactos devem estar alguns dos citados ao lerem a crónica...

Os citados são um juiz sindicalista e loquaz e três candidatos a bastonário da Ordem dos advogados.
Baptista Coelho, juiz desembargador que tem passado longas horas a falar para a comunicação social sobre n´importe quoi, em nome da Associação Sindical dos Juizes, diz ao jornal que "se houve falhas na investigação do processo( ...) elas são imputáveis ao MP que era a entidade que dirigia o inquérito". Ou seja, sacode a água que o seu capote comporta.

Talvez para permitir a aferição do grau de coerência do cronista e do citado, a seguir cita-se o mesmo como dizendo que " se as leis tem mecanismos que podem ser pervertidos o que há a fazer é reformá-las" !

Cita-se Rodrigo Santiago, escorado despropositadamente em Figueiredo Dias, o principal autor do muito criticado CPP e que fala pouco. O advogado de defesa de um arguido excelentíssimo diz que a instituição que o PGR chefia "saiu muito ferida das pseudo-investigações que levou a cabo"! Este advogado, na crónica, chega a atribuir a culpa da não realização das declarações para memória futura ao... juiz Rui Teixeira e ao MP que estariam mancomunados na investigação!

Claro que esta afirmação gratuita e ignominiosa até para os próprios juizes que prezam a independência, aparentemente não suscita qualquer reparo. Dá a impressão que dali pode sair a maior bojarda verrinosa que ninguém se importa...

Porém, segundo esta fonte, no acórdão do STJ, que se pronunciou sobre o assunto da audição das testemunhas para memória futura, escreveram os juizes...

O incidente de recusa de juiz (Rui Teixeira) não tem a mínima consistência jurídica e constitui um mero expediente dilatório com vista a impedir a tomada de declarações para memória futura, que fora designada pelo juiz de instrução criminal, para ter lugar no dia 1 de Setembro.

Rodrigo Santiago deveria lembrar-se disso e um bom jornalista, fora de uma crónica, também.
Outro citado exuberantemente é Marinho Pinto para dizer uma enormidade do tamanho da vozearia populista, onde nem falta a referência ao futebol...

(...) existe uma cultura de fundamentalismo justiceiro na cúpula hierárquica do MP!

Marinho Pinto deve saber bem o que isso significa. Em Junho de 2003, foi destituido do cargo de presidente da Comissão de direitos humanos da Ordem dos Advogados, pelo bastonário, por causa da sua proverbial sensatez na análise do estado da Justiça em Portugal. Também tem sido fortemente aplaudido pela Associação sindical dos juizes sempre que se pronuncia sobre assuntos que os envolvem enquanto corporação.

Por outro lado, em tempos escreveu um artigo vitriólico num jornal do centro de Portugal, acerca de investigação criminal a casos de corrupção. É por isso um indivíduo de uma isenção a toda a prova e que conhece os meandros dos problemas na justiça como poucos. Dará um óptimo bastonário, certamente.

Contrastando com estas declarações incendiárias vindas das habituais fontes da sensatez, temos as de Rogério Alves. Que diz o candidato a bastonários sobre a declaração de Souto Moura?
Que é uma ...

... crítica e uma auto-crítica, quer ao segredo de justiça e à forma como ele é maltratado, quer aos defeitos que são patentes nas investigações e relações entre aqueles a quem compete guardar o segredo e a comunicação social

No quadro da lei e da ética, o advogado tem a obrigação de utilizar todos os meios admitidos para a cabal defesa do que julga ser de Direito.

Bem, quanto a isto, o STJ já se pronunciou , como vimos acima.

Quanto às figuras públicas...
...o ser famoso e conhecido não pode ser motivo de vantagem nem de prejuízo".

Toda a gente concorda, não é assim?! Toda a gente sabe que o arguido famoso e o político foram tratados como toda a gente. São afinal, gente comum, como se viu na recepção calorosa na Assembleia da República aquando da gloriosa libertação da sua condição de preso... político!

Rogério Alves
aconselhou ainda o PGR a divulgar...

as medidas que sugere na área da sua competência para corrigir os defeitos que assaca agora à condução destes processos.

É também altura de o poder político, que se deve manter alheado dos processos em concreto, ter uma palavra a dizer na forma como em Portugal se investiga.

Ora muito bem!

No entanto, parece-me que estas afirmações poderiam dar um outro título à peça. Por exemplo:
A investigação criminal está mal. Mas o jornalismo do Público não está melhor!

Esse é que seria um título e peras!

Assim, apetece-me escrever agora mesmo: hipócritas!

E ainda mais: já se tornou notório que o Público, pela pena de António Arnaldo Mesquita, quer correr com o actual PGR. Será legítimo? Um jornalista deve interferir na política de destituição e escolha do PGR? Assim, despudoradamente?!

Pois então que o faça, mas claramente! Assumindo as "notícias" como crónicas. E que saiba ao menos escrever com coerência e saber, respeitando o Livro de Estilo...

Assim, como o tem feito, é típico de jornalismo sucedâneo. Subproduto, portanto.

Publicado por josé 11:26:00  

2 Comments:

  1. Anónimo said...
    Que alivio ver novamente os Veneraveis Irmaos a comentar outros assuntos. Ja cansava so dar Manuel a destilar odio contra o Primeiro-Ministro...
    Manuel said...
    Ora Eça! ódio ao PM ?! Para isso era preciso que tivessemos um...

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