c o r p o r a t i v i s m o s

Da TSF...


Todos os juízes formadores do Centro de Estudos Judiciários de Lisboa demitiram-se em bloco em protesto contra a nomeação de Anabela Rodrigues para a direcção do organismo. A Associação Sindical dos Juízes apoia a posição tomada.

De um qualquer site aportuguesado:

Hoje fala-se novamente em corporativismo, mas agora em dois sentidos distintos. O primeiro é uma seqüela tardia do corporativismo fascista. Agora que o Estado não quer, e freqüentemente não pode, regular e controlar as atividades de cada grupo e categoria profissional, são estas categorias que exigem, do Estado, suas regras, seus privilégios e direitos exclusivos, seus monopólios. Sem um Estado forte a autoritário para controlá-las, e sem um mercado competitivo para exigir desempenho e eficiência, as novas/velhas corporações buscam maximizar sua presença na arena política, onde há a ilusão de que os ganhos podem ser fáceis e podem ser conquistados no grito. Desta forma, cada grupo e setor procura garantir seus direitos e privilégios.

Em 1999, por ocasião da escolha de um director para a PJ, na sequência da saída atrapalhada do então juiz Fernando Negrão, hoje ministro do actual governo, as discussões no CSM foram estas, colhidas do antigo site da ASJP, actualmente com cara nova.

Assim, estando na ordem do dia a actividade sindical dos juizes, pergunta-se: Devem os juizes sindicalizar-se?! E no Sindicato, devem fazer o quê?

O actual presidente, Baptista Coelho, sobre o assunto tem algumas ideias...

Enquanto grupo profissional a quem, por força da Constituição, está atribuída a administração da Justiça, os Juízes são pessoas necessariamente atentas à realidade social em que se inserem. Mas a divulgação e o conhecimento público das funções de soberania que em nome do povo os Juízes exercem são também uma exigência de cidadania num Estado de Direito democrático.

A Constituição atribui a administração da Justiça a "um grupo profissional"?

No artigo 9º a CRP diz que é tarefa fundamental do Estado...

Garantir os direitos e liberdades fundamentais e o respeito pelos princípios do Estado de direito democrático

No artº 20º diz...

A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.

O artº 55º. sobre a liberdade sindical diz...

É reconhecida aos trabalhadores a liberdade sindical, condição e garantia da construção da sua unidade para defesa dos seus direitos e interesses.

O artº 56º diz...

Compete às associações sindicais defender e promover a defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores que representem.

O artº 57 garante o direito à greve dos trabalhadores e proibe o lock out.

No artº 202 a CRP abre um capítulo para os Tribunais e diz...

  • 1. Os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo.
  • 2. Na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados.


No artigo 203º assegura que...

Os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei.

No artº 215º a CRP diz...

Os juízes dos tribunais judiciais formam um corpo único e regem-se por um só estatuto.

A seguir a lei enumera a carta dos direitos fundamentais dos juizes...

  • 1. Os juízes são inamovíveis, não podendo ser transferidos, suspensos, aposentados ou demitidos senão nos casos previstos na lei.
  • 2. Os juízes não podem ser responsabilizados pelas suas decisões, salvas as excepções consignadas na lei.
  • 3. Os juízes em exercício não podem desempenhar qualquer outra função pública ou privada, salvo as funções docentes ou de investigação científica de natureza jurídica, não remuneradas, nos termos da lei.
  • 4. Os juízes em exercício não podem ser nomeados para comissões de serviço estranhas à actividade dos tribunais sem autorização do conselho superior competente.


Em relação aos órgãos de soberania, a CRP conhece os seguintes, no artº 110º ...

São órgãos de soberania o Presidente da República, a Assembleia da República, o Governo e os Tribunais.

Sendo os Tribunais órgãos de soberania e os juizes os seus titulares, como constantemente o afirmam e reivindicam, que sentido faz a um órgão de soberania ser representado por um sindicato?!

Só um: enquanto órgão de soberania não podem ser representados, porque isso é um contra senso!

Então se existe uma ASJP, forçoso é concluir que não estamos a falar de juizes enquanto órgão de soberania, mas apenas trabalhadores da função pública administratica do Estado - é o Estado quem lhes paga! Ainda por cima, dependem das decisões do Estado administração, através do Ministério da Justiça, para receberem o dinheiro ao fim do mês, como os restantes trabalhadores.

Assim, as tomadas de posição públicas da ASJP e do seu presidente que significam, neste contexto?

Quixotismos
! Agem na qualidade de juizes que não podem ser, porque juizes são uma categoria de magistrados que constituem um corpo único que se rege por um estatuto próprio - e esse estatuto não é o sindical.

Como o próprio presidente Baptista Coelho disse...

...a divulgação e o conhecimento público das funções de soberania que em nome do povo os Juízes exercem são também uma exigência de cidadania num Estado de Direito democrático.

Divulgação e conhecimento público das funções de soberania?!! Como isso?!

As funções de soberania esgotam-se plena e completamente nas decisões que cada juiz toma, senhor presidente da ASJP!

Que sobra então para a ASJP?

Pois, parece-me que será apenas a reivindicação de... melhores condições de trabalho, enquanto funcionários que também são!

isso, parece-me bem!

E a divulgação dessas funções de soberania pode incluir a pressão sobre outros órgãos de soberania, como flagrantemente existiu no caso do novo director do CEJ?!

Se a divulgação das tais condições, passa pelas tomadas de posição públicas sobre matérias que competem exclusivamente ao Governo - que é outro órgão de soberania! - tomar, como chamar a isso?!

Interferência de um grupo sindical, nas funções governativas?

Não vejo outro nome... porque enquanto juizes não podem fazer e enquanto órgão de soberania é impossível que o façam. Assim, estes episódios de protagonismo da ASJP, parecem-me um assunto bem mais grave do que novela que querem transmitir à opinião pública sobre o PGR...

Aliás, muito mais grave! Porque ninguém se atreve a pôr nomes aos bois...

Publicado por josé 16:48:00  

4 Comments:

  1. Cronista Oficioso da 3R said...
    Muito bem e pertinente recordação...
    Mas tal implica que o problema hoje não seja já de uma leitura sindicalista de funções e órgãos do Estado, mas de autêntica subversão. Uma actuação sindical controversa situa-se num plano apesar de tudo menos grave do que a dos próprios órgãos de Estado. E o CSM que não devia passar de um órgão administrativo (com especiais garantias apenas por força das suas funções) assume-se hoje como o verdadeiro órgão independente do poder judicial, inclusive no pior dos sentidos: irresponsabilidade. E dado o ponto que se atingiu de actividade política irresponsável estamos a caminhar para a degradação do Estado e violação do princípio democrático. Acresce que aquilo que se visava garantir: a independência dos juízes é altamente prejudicada por este poder incontrolado do CSM, perante o qual os juízes estão dependentes e que, pelo menos, os pode afectar nas suas expectativas. CSM que vai proferindo decisões parajudiciais e que se assume como representante dos magistrados judiciais (o quais não sequer podem renunciar a esa representação), havendo uma relação pelo menos pouco transparente entre esse órgão e o sindical. Os dois outros Conselhos de magistraturas também terão problemas, mas parece que existirá uma maior recato, mas o que se demonstra é a necessidade de uma intervenção constitucional urgente (esperemos é que sendo apresentados múltiplos bons motivos a mesma não venha a ocorrer ao serviço dos piores dos fins... mas as cúpulas dos magistrados e os representantes corporativos não têm hoje qualquer legitimidade para a defesa do Estado de Direito).

    E do comunicado da ASJP pode retirar-se uma pergunta juiz formador que não se demita (sozinho ou em bloco) «a contrario» não beneficia da solidariedade do seu sindicato? e do seu CSM? será que estão reunidas condições para o CSM autorizar juízes a trabalhar sobre a dependência de uma leiga?
    E por último: o que é que a (in)dependênia tem a ver com isto?
    Gabriel Silva said...
    Os juizes não são titulares de nenhum orgão de soberania. O Tribunal é o orgão de soberania. O tribunal é constituido por juizes, magistrados do ministério público, advogados, funcionários judiciais e partes. Todos juntos formam o orgão de soberania. O juiz preside. Nada mais.
    Anónimo said...
    "...administrar a justiça em nome do povo"
    Será que alguém é capaz de explicar qual é o papel que o Povo tem nessa história?
    Por associação de cogitações: Um dia ainda se definirá a retribuição dos juízes pela popularidade das sentenças proferidas..."Viva a mão invisível do mercado!"
    A propósito do associativismo vs corporativismo: já falta pouco para se constituirem os novos Sindicato dos Presidentes de Câmara e o Sindicato dos Deputados da Nação e o Sindicato das Celebridades, com estatuto inamovível e vitalício!!

    Ass.Maria da Fonte II
    josé said...
    O desembargador Baptista Coelho, presidente da ASJP diz numa entrevista ao O Diabo desta terça-feira:

    " (...) Um magistrado judicial não é um mero fundionário público que cumpre um horário fixo e depois despe a sua veste e acabou-se. Um juiz é um representante do Estado num órgão de soberania e tem uma função fundamental na orgânica de uma sociedade organizada."

    Tirem-se as conclusões lógicas, desta confusão de conceitos que vai na ideia do desembargador, presidente de um sindicato...e veja-se bem como é que "isto" anda!

    Ponham um tipo que tirou um curso de direito e aprende( se aprende) na vida, como toda a gente; dêem-lhe o poder de julgar, segundo a lei e sem responsabilidade pessoal;digam-lhe que é titular de um órgão de soberania ( sim, caro Gabriel, a maior parte deles assim pensa e não são teses mirabolantes- basta ler certos livros e artigos publicados)e depois peçam.lhe opiniões sobre os assuntos do "Estado". Como é que a pessoa, com este background, não os há-de dar? Até lhe ficava mal...

Post a Comment