Vasco Pulido Valente - "Na Véspera"
sexta-feira, julho 16, 2004
Em 1995, depois de um longo Governo, Cavaco saiu serenamente, e deixou o País de maneira geral próspero e em ordem. Saiu farto do PSD, da imprensa e da televisão. Com ele acabou uma era. Professor de Economia, Cavaco vinha do Banco de Portugal e tinha sido um excepcional ministro das Finanças. Valia por si próprio no mundo «normal» entre gente «normal». Em 2002, a meio do segundo mandato, Guterres resolveu fugir e deixou o País num estado deplorável. Em 2004, fugiu Barroso, com uma desculpa que absurdamente passou por «honrosa», e deixou o País mais pobre, mais confuso e sem esperança numa adiada e sempre duvidosa «retoma». E, agora, veio o dr. Santana Lopes. Por muito estranho que pareça, num ponto essencial Guterres, Barroso e Lopes não se distinguem: são os três puros produtos partidários. Na vida civil nenhum deles vale coisíssima nenhuma. Tirando um ou outro emprego aos vinte anos, todo o dinheiro que ganharam foi ganho na política ou pela política. Pior: nem na política fizeram nada de notável, antes de chegarem ao poder. Guterres nunca sequer passou pelo Governo; Barroso é o autor do inominável acordo de Bicesse; e Lopes protegeu o «teatro de revista», plantou umas palmeiras na Figueira da Foz (não exactamente um acto heróico) e legou a Lisboa um saco de sarilhos. Sem excepção, os três só mostraram talento para a intriga e a manobra partidária. A partir de Cavaco, Portugal ficou entregue a pequenos conspiradores de pequenas seitas. Ninguém se deve admirar com a irresponsabilidade e o essencial oportunismo que eles constantemente mostraram. Ou com a contínua degradação do País, que eles consentiram, quando não promoveram. Hoje há um ar de irrealidade no advento de Santana Lopes. Ninguém acredita que está a suceder o que está a suceder. É um sentimento comum em véspera de catástrofe.
in DN
Publicado por Manuel 05:24:00
2 Comments:
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Não diria que o Prof. Cavaco foi extraordinário em várias áreas (educação!, saúde! ...). Mas foi o único primeiro-ministro (e aqui VPV devia ter excluído também o "palrador" Soares, como diria o mesmo Prof.) que tivémos que percebia muito de alguma coisa. E viu-se isso mesmo, com os avanços, em muitas áreas do nosso país. E diga-se de passagem que não foi difícil ser melhor que os outros, porque os outros têm sido muito maus e, pelos vistos, vão continuar a ser.
Há uma frase no "A man for all seasons" que me lembro a este propósito e cito de cor: "o povo segue alguém que se agite à sua frente". A verdade é que quem vai a líder partidário tem primeiro que tudo que apaziguar os cola-cartazes e agradar aos chico-espertos locais, a maioria de todos estes tacanhos no saber, na acção e nos princípios. Para dar o salto e ganhar congressos. Cavaco subiu à liderança por acidente. Na crise. Na falta de soluções dos "barões assinalados".
De facto, convencidos os "militantes", o líder não tem que saber de coisa nenhuma, não tem que ser bom em nada e, se for, dirão logo os comentadores que tem pouco peso político porque é um "tecnocrata". Registe-se aqui que os "tecnocratas" são aqueles que sabem de alguma coisa e pecam por não ser como os "políticos" que sabem "um pouquinho mais que nada acerca de tudo". Aqueles que personificam o seu "governo do lugar": "Minister, government isn't about good or evil, it's about chaos and order... keep things going... still being here tomorrow" como dizia Humphrey.
Os comentadores e jornalistas fazem parte do sistema (oops! pareço o Dias da Cunha), e, por isso defendem os políticos "puros", que não têm de ser inteligentes, mas espertalhões; não têm ideias para o país, mas para a vidinha deles e do seu clube; não querem saber se devem ou por que vão para lá, o que interessa é aguentarem-se lá... enquanto forem capazes e estão dispostos a fazer de tudo por isso. Depois de se ser líder, mesmo que não se seja conhecido, procede-se a uma criação mediática que normalmente foi já acontecendo(veja-se o caso do talentoso e honesto ministro da Segurança Social de Guterres; choviam elogios sobre Ferro Rodrigues?!!!!). O líder agita-se, os média e os recrutados spokesmen agitam-no e o povo eleitor segue-o.
Não sei se o sistema inglês ou americano serão melhores e mais democráticos do que o nosso, piores não são de certeza. E que o nosso está podre está.
Por isso, vivam os blogs que dão espaço à expressão de opinião para além das seleccionadas "cartas ao director" e mostram que há por aí muito português com mais lucidez e conhecimento nos comentários que os articulistas "de serviço".