Justiça - "Um Programa sem programa"
domingo, julho 25, 2004
O Programa do Governo na área da Justiça é uma amálgama de lugares-comuns.
Não é um bom começo pretender dar ao Ministério Público uma lição sobre o seu dever óbvio de cumprir a política criminal definida pelo Governo. Seria interessante, isso sim, dizer que política criminal pretende ele, o Governo, levar a cabo.
Por outro lado, passar a mão pelo dorso do Conselho Superior da Magistratura, tentando passar a ideia que a “bolsa de juízes” é um acto de gestão aproveitável, é sinal de quem não tem uma perspectiva sobre o que deveria ser uma organização judiciária eficaz.
Evitar tratar as questões polémicas, não se comprometendo com nada que possa indispor as corporações, é a habilidade do Programa.
A formação dos magistrados, a qualificação dos funcionários, a redefinação da geografia judiciária, são matérias, entre outras, que deveriam ter merecido uma particular atenção.
Talvez seja o preço a pagar por quem, há meia dúzia de dias, não sonhava estar no Ministério.
Só assim se compreenderá a existência de tão poucos propósitos para tantos Secretários.
Terá de esperar-se pelos próximos capítulos.
in Direitos
O enigmático autor do Direitos teve a piedade de não citar o mais cómico do novo Programa de Governo para a Justiça - a promessa de continuidade...
Entretanto, e com a vénia devida ao Venerável Irmão José, aqui seguem, com o tradicional espirito de caridade que caracteriza esta Venerável Loja, algumas sugestões bem concretas e tangíveis...
- formação de funcionários deficiente, no que se refere a dactilografia por exemplo (não se vêem filmes americanos?) Que é feito da estenografia, obrigatória, há trinta anos?) e colocação dos mesmos a pedido e segundo regras de concurso, sem atender com quem vão trabalhar e em que sector o vão fazer. É tudo ao calhas.
Formação de magistrados insuficiente em assuntos que extravasam o conhecimento estritamente jurídico. A imensidão das matérias, não dá tempo para mais, mas é essencial que( os juizes) percebam como funcionam as polícias e os organismos da segurança social, pelo menos. É também inportante que se apercebam ao menos do modo de funcionamento das Cãmaras. Sim...das Câmaras!
A sugestão do Boaventura Sousa Santos de os magistrados terem formação complementar mais frequente e eficaz, também é uma evidência. - Definição clara do papel do juiz e do magistrado do MP, a fim de se evitarem as guerras corporativas. Reunião dos Conselhos, num único, como defendia o Laborinho. Extinção da Sindicata dos juizes que não é mais do que um órgão de poder corporativo, espúrio e nocivo e alteração radical do modo de eleição dos juizes para o CSM e dos critérios de escolha para o STJ, atendendo a sugestões já aqui apontadas por Pinto Nogueira. Inspecções dos magistrados mais frequentes e regulares, mas efectuadas aos serviços, sem o actual esquema de inspecção individual pelo inspector "da zona" que em alguns casos já o é, há anos e anos (e quem precisaria de o ser inspeccionado seria ele...).Alteração radical no modo de designação destes inspectores. Amigos, amigos, negócios à parte...
- Legislação mais bem estudade do que tem sido. Os códigos de processo não deveriam ser revistos ou alterados de seis em seis meses, com leis avulsas.
Consulta dos mestres de Coimbra responsáveis pelso actuais e discussão na praça pública da televisão, como se faz em Itália, dos assuntos mais controversos, com convidados que defendam soluções antagónicas e esgrimam os argumentos que detém. Presença dos mestres Figueiredo Dias e Costa Andrade nesses debates, para pessoalmente explicarem o que fizeram como e porquê. Uma perfeita Utopia, como se vê...
- Alteração do modo de funcionamento das Comissões que na AR fazem as leis. Lacões e companhia para a reforma , já! São eles os responsáveis de muita asneira que por aí vai e depois de se repercute em decisões concretas dos tribunais que apanham com o odioso.
- Fim da ausência de liberdade de expressão de magistrados e funcionários. Ainda há um sentimento geral de medo pelo que se diz ou escreve em público; pelas opiniões que se transmitem sobre este ou aquele assunto.
- As hierarquias do MP e os Supremos não estãa habituados a qualquer crítica pública e nem sequer pensam um minuto que seja nas razões que têm para assim se comportarem. A educação recebida no tempo do Salazar e Caetano não explica tudo. Até porque a liberdade plena de expressão está assegurada nos corredores e nos compartimentos do Alfa. Por isso, não pode e não deve ser coarctada a outros que não frequentam essas viagens.
- A gestão do pessoal e equipamentos. Não há estudos sobre racionalização de meios. Saber por exemplo, quantas pessoas e quais são precisas numa secção de serviço externo dos tribunais para fazerem penhoras e/ou indagarem a existência de bens penhoráveis.
- Edifícios e repartição de espaços. Salas e gabinetes. Muita miséria vai por esse país fora.
O Laborinho enquanto ministro deixou obra, porque as carências eram mais do que muitas. Mas ainda falta muito, muito mesmo.
Só este aspecto, daria para ocupar um ministério ou uma direcção geral a tempo inteiro. E a verdade é que por lá pululam engenheiros e engenheiros e engenheiros, aos magotes e que em grupo se deslocam aos locais onde são precisas obras. Dali a três, quatro, cinco anos, começa a falar-se que as obras começam...para o ano que vem.
- Na justiça penal, reformulação do papel do Ministério Público na investigação criminal. Definição e alargamento do conceito de DIAPs, por todo o país, em sedes do distrito, por exemplo (como me parece que era ideia do Laborinho). Formação dos magistrados nessas áreas. Num ápice (alguns anos,meia dúzia, talvez) desapareciam os conflitos com a PJ e os resultados apareceriam, dignos de um país civilizado e não daquele que nos querem impingir como tal. Quem? Os mesmos de sempre e que vivem à custa do roubo descarado do que é de todos...
Temos estruturas judiciárias para responder?! Não! Não! Quem perde? Todos!
Publicado por Manuel 08:01:00
3 Comments:
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Assim, a corrigenda:
em vez de " estenigrafia", estenografia.
em vez de "imspecção", inspecção.
em vez de "...e quem precisava de ser(...), e quem precisaria de o ser.
em vez de " os códigos de processo não deviam", os códigos de processo não deveriam .
em vez de " para o ano que vêm", para o ano que vem.
em vez de "roubo descarado que é de todos", roubo descarado do que é de todos.
Isto, para não falar nas vírgulas e na construção de algumas frases...
Os erros ortográficos, aqui na escrita de blog, já deixaram de me impressionar. Mas tenho pena. O rigor na escrita é um reflexo da disciplina e é um factor de qualificação da estética dos textos e até de quem os escreve.
Escrever em blogs, em especial nos comentários, de rajada e sem revisão, tem os seus custos. É o preço a pagar pelo imediatismo e oportunidade das intervenções.
O comentário do José fez-me recordar este poema de Eugénio de Andrade, que está nos antípodas da escrita em blogs:
"CONSELHO
Sê paciente; espera
que a palavra amadureça
e se desprenda como um fruto
ao passar o vento que a mereça."
in, "Os Amantes Sem Dinheiro", 1950.