referendar ou "apenas" baralhar e dar de novo...

A ideia de Referendo traz-me à memória as tentativas falhadas, e ainda recentes, dos referendos sobre a regionalização e a interrupção voluntária da gravidez.

Falhadas , não porque o meu ponto de vista tenha prevalecido mas, porque a adesão, a participação dos portugueses e a forma como os governantes da época lidaram com os dois referendos ficarão para sempre associada a um misto de nexo sem causalidade.

Os referendos, ainda que não vinculativos, exigiam aos portugueses, cansados de manifestarem vontade em participar mais activamente na vida política, apenas que votassem.

Ao Governo em questão, pedia-se na questão da IVG, cuidado na forma como se colocava de um lado ou de outro. A questão da IVG é delicada e merece decidamente uma reflexão na sociedade portuguesa, isenta de hipocrisias e de falsos moralismos. A tudo isto o primeiro-ministro da altura, prometeu abster-se em voto, deixando a decisão para os portugueses.

Na questão da regionalização, cometeram-se demasiados erros, desenharam-se mapas em função do número de cargos que se queriam empreender, sendo que o pecado capital aqui foi primeiro desenhar e só depois explicar quais os benefícios de descentralizar.

Mas e porque referendar significa, muito casuísticamente, submeter a sufrágio algo de importante e delicado o nosso governo de coligação ter-se-á lembrado que tinha chegado a hora de referendar, nada mais, nada menos que a nova Constituição Europeia.

Perdida que foi a importante jornada de campanha para umas eleições, curiosamente... europeias para clarificar alguns aspectos importantes relativos a nova Europa, para discutir abertamente com o país num diálogo franco, quais as implicações da nova Constituição Europeia na sociedade portuguesa e não só, perdida que foi essa oportunidade, entendeu o Governo referendar algo que muito dificilmente conseguirá explicar, por muito crente que seja a convicção de quem explica.

Ainda que exista um compromisso entre os vinte cinco membros da UE de que deverá haver referendo desde logo se levanta a questão da pergunta que vai ser escolhida.

Alguns sábios deverão durante algumas semanas reunir-se e chegar à conclusão que a única pergunta que garante hipoteses de o SIM ganhar não pode fugir das linhas desta...


Está esclarecida, livre e conscientemente a favor da Constituição Europeia ?


O problema, que já Guterres enfrentou, trata-se de um problema de memória e ao qual Jorge Sampaio decidiu hoje dar novo alento. Diz Jorge Sampaio que

Deve haver um momento em que uma consulta sobre a questão europeia deve ser feita, e que foi "dos muito poucos" a entender que o Tratado de Maastricht devia ter sido objecto de uma consulta popular.

Por muito diferente que possam ser as convicções, ou somos a favor do projecto europeu ou somos contra, pois a terceira via que o PP envereda, apenas traz problemas de consciência aos seus dirigentes. Consciência não pelo que disseram no passado, mas por aquilo que hoje são obrigados a assinar em nome de uma coligação.

E é exactamente esse pequeno facto, levantado por Jorge Sampaio, que me deixa de todo desiludido.

Ao fim de 18 anos de pertencermos a União Europeia, ao fim de 18 anos de recebermos fundos comunitários, e perdoem-me aqui o facto de assumir o meu europeísmo, é que achamos que deveriamos referendar a integração europeia? Se na altura refenderar o Tratado de Amesterdão soava a má língua pois a moeda única para além de constar no Tratado de Roma, ratificado por Portugal na adesão, constava em objecto e procedimentos no Tratado de Maastricht, que Portugal e bem, ratificou, referendar Maastricht na altura, como diz hoje Jorge Sampaio ser um segredo quase só seu, e ainda bem que assim o é, seria o desacreditar de Portugal num projecto europeu.

Hoje referendar a constituição europeia, constítui não um retrocesso na matéria europeia mas sim um sinal de imaturidade política.

Imaturidade porque um país atento não deixa passar 18 anos para alertar que se deveria referendar a integração europeia.

Imaturidade porque um Presidente da República, de um Estado membro de pleno direito, deveria ser o primeiro a alertar para o problema, se realmente ele existir.

Não que referendar seja mau, antes pelo contrário, mas sim porque, primeiro discute-se, depois referenda-se, tudo isto antes da aprovação. E como uma casa quando vai no telhado não se lhe podem mudar as escoras...

Ainda que mal pergunte, mas se o "Não" ganhar, e com eleições autárquicas três meses depois, o que fará o Governo? Respeita a vontade dos eleitores e coloca-se à margem do processo europeu, ou pelo contrário não respeita a vontade dos mesmos, e arrisca-se a ganhar apenas as autarquias de Gondomar e Águeda ?

Publicado por António Duarte 00:34:00  

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