Especial Euro 2004 (XV)

O Rui Costa era aquele que já não valia nada, não era?

Pois é. Os profetas da desgraça que se apressaram a augurar o desastre andam tão baralhados que muitos deles foram festejar para as ruas a passagem de Portugal para as meias-finais do Euro 2004.



A selecção portuguesa assinou esta noite a melhor exibição de todas as que se mostram no grande evento do futebol europeu já realizaram desde o início do torneio. A única
selecção que jogou quase tão bem foi a República Checa diante da Holanda.

Mas este duelo entre Portugal e Inglaterra encheu as medidas aos amantes do bom futebol. Foi f-a-n-t-á-s-t-i-c-o!! Nas notas que a Grande Loja tem dado desde o início, Portugal quase chegou ao primeiro 19. Fica-se pelo 18, apenas por aquela desatenção imperdoável a cinco minutos do dim do prolongamentom, quando o mais difícil já estava feito. Depois de um jogo memorável, com uma reviravolta no marcador, era uma pena deixar fugir o pássaro. Felizmente, a fortuna soube ser justa e deu a vitória a Portugal nas grandes penalidades.

Há tanto para dizer que o melhor é organizar a análise desta partida por tópicos. Aqui vão eles:

1. Portugal tem feito um europeu em plano ascendente: começou com uma derrota, embora mostrando já nesse primeiro jogo ter armas para dar a volta; com a Rússia ganhou, atacou bem, mas faltou-lhe ainda alguma organização de jogo; com a Espanha assinou já uma bela exibição, embora tenha voltado a cometer de ligação entre os sectores que poderiam ter deitado tudo a perder; com a Inglaterra, chegou finalmente ao plano da excelência: só dois erros, que custaram o sofrimento de só resolver a coisa nos penalties. Mas no jogo jogado, Portugal foi muitíssimo superior à Inglaterra.

2. A chave da vitória voltou a estar na enorme alma que Scolari conseguiu incutir na equipa. Sem esse factor, Portugal teria desacreditado a meia-hora do fim. A nossa equipa carregou nos ombros 86 minutos sempre a perder e nunca desistiu de ser feliz. Saiu premiada, porque percebeu que, ao longo de toda a partida, jogou melhor e procurou mais a sorte.

3. Scolari voltou a acertar em cheio nas substituições. Com a Grécia, as melhores unidades saíram do banco ao intervalo: Deco e Cristiano Ronaldo. Com a Rússia, Rui Costa entrou para marcar; com a Espanha, Nuno Gomes saltou do banco para resolver; hoje, Simão e Postiga entraram. O primeiro centrou, o segundo cabeceou para o empate. Rui Costa também saiu do banco e marcou um golo soberbo - talvez mesmo, o melhor do Euro até agora.

4. E por falar em Rui Costa... Não foi sobre ele que tantos disseram que já estava acabado? Que não tinha lugar na selecção? Que já não podia com uma gata pelo rabo? Que era 'uma vergonha' continuar a pô-lo a jogar só pelo estatuto que possui? Que já estava velho? Que dirão esses autênticos peritos em futebol depois de ver aquele golo fabuloso que o reggista do AC Milan apontou em pleno prolongamento? Será que depois disto, ao menos depois disto, essas pessoas descobrem, finalmente, que NÃO PERCEBEM NADA DE FUTEBOL??



5. Entendamo-nos: É um facto que Rui Costa talvez já não tenha andamento para estar 90 minutos ao mesmo nível; totalmente de acordo em pôr Deco titular da selecção (tem-no merecido inteiramente). Mas é preciso que as pessoas comecem a perceber que uma equipa se faz com opções, com alternativa, e um maestro como Rui Costa é sempre uma mais-valia. Rui Costa é o segundo jogador português mais cotado da sua geração. Quando se transferiu da Fiorentina para o AC Milan, tornou-se no quarto jogador mais caro do Mundo. Será que as pessoas não têm memória ou falam e... não pensam?? Era escusado terem que engolir tantos sapos...

6. Em matéria de.. deglutição de sapos, a Grande Loja, no que se refere à selecção nacional, está perfeitamente à vontade: é um facto que já criticámos muito Scolari e as razões que nos levaram a fazê-lo mantêm-se válidas. Continuamos a achar que Vítor Baía daria mais segurança à baliza do que Ricardo. Mas no resto, o tempo tem-nos dado razão: sempre defendemos a titularidade de nomes como Ricardo Carvalho, Deco e mesmo Maniche (que talvez tenha sido o golpe de asa de Felipão na convocatória e em todo este Euro). E para quem tem memória curta (a maior parte das pessoas que opina sobre futebol em Portugal), recordamos que depois da derrota com a Grécia fomos das poucas vozes a dar o benefício da dúvida à selecção.

7. «A equipa de Scolari esteve abaixo do que lhe era exigido mas convém referir, logo de início, que o balanço não nos parece ser tão negativo como o resultado deixa antever. Claro que lá voltamos a estar reféns dos últimos jogos, das contas de máquina calculadora na mão e, malfadada sina lusa, proibidos de cometer deslizes na recta final. Mas a verdade é que se houve jogo em que Portugal teve azar, muito azar, foi neste com a Grécia.

A equipa das quinas criou, sobretudo nos últimos 25 minutos de jogo, oportunidades mais do que suficientes para sair vencedora. Mas nunca pôde jogar de forma serena e tranquila. Começou o encontro nervosíssima, foi vítima de um erro infantil (inexplicável?) de Paulo Ferreira - logo ele, que quase nunca erra - e quando começou a desenvolver o futebol de que mais gosta, já estava a perder por 0-1.

E não nos podemos esquecer que do outro lado estava uma Grécia muito forte, muito organizada, que pode surgir como a grande surpresa deste grupo A. Os gregos aproveitaram ao milímetro quadrado as falhas portuguesas e mostraram ser um conjunto muito pragmático, com uma defesa consistente (Seitaridis fez um grande jogo, o FC Porto, de facto, não dorme...) e um contra-ataque venenoso».

Scolari, que já tive a oportunidade de criticar veementemente nesta Venerável Loja, não me parece ter, desta vez, grandes culpas no insucesso - foi corajoso a lançar Ronaldo e Deco logo no início da segunda parte e estes mostraram-se as melhores unidades potuguesas nessa metade. O seleccionador não teve medo de mudar o sistema a meio do jogo e foi com dois pontas-de-lança que Portugal se mostrou mais perigoso.

O golo obtido no fechar do pano traz uma réstia de esperança. Não nos deu qualquer ponto, mas num grupo tão equilibrado como este, quem sabe se não nos será útil nas contas finais a fazer dia 20...»

(post publicado após a derrota com a Grécia)

8. E antes da encontro decisivo com a Espanha:

«Os pessimistas profissionais que descansem, talvez a Espanha esteja um pouco mais forte do que Portugal. Mas um jogo é um jogo e um cenário de qualificação é perfeitamente possível. Ganhar a esta Espanha está ao alcance de Portugal, desde que a selecção esteja ao seu melhor nível (o que já não acontece há mais de um ano...). Mas nós, portugueses, bem sabemos que é nestas alturas que conseguimos surpreender tudo e todos».

9. Como vêem, a Grande Loja acreditou desde a primeira hora neste sucesso português. No jogo com a Inglaterra, ele deveu-se, em grande parte, às fantásticas exibições de jogadores como Deco, Cristiano Ronaldo, Ricardo Carvalhio (esse é sempre...), ou Maniche. Como já referi, os três que saltaram do banco entraram muito bem. E acima de tudo, fica a ideia de uma nova mentalidade portuguesa, que o FC Porto de Mourinho já foi mostrando nos últimos dois anos: é possível ganhar a qualquer equipas, desde que se esteja concentrado, se seja rigoroso, que se acredite até ao fim.
Talento não nos falta. Faltava-nos, até há uns dias, fio de jogo, mas Scolari foi inteligente e aproveitou a máquina do FC Porto (o meio-campo da selecção, neste momento, é o triângulo mortal Deco-Costinha-Maniche)

10. A propósito, sobre o falhanço de Costinha, ao oferecer o golo a Owen (muito mérito do avançado inglês, atenção), dizemos precisamente o mesmo que dissemos quando Paulo Ferreira ofereceu o golo a Karagounis: um erro não pode apagar jogos e jogos ao mais alto nível. É claro que Costinha deve continuar no onze.

11. A Inglaterra beneficiou desse erro e pôs-se a ganhar muito cedo. Mas essa vantagem acabou por inibir os britânicos de explorarem o ataque (sendo que é esse o sector mais forte). A lesão de Rooney desincentivou ainda mais os ingleses a procurarem o golo e confesso que me surpreendeu a aparente facilidade com que Portugal pegou no jogo. A batalha do meio-campo foi, claramente, ganha por nós. Com excepção de Lampard (que grande jogador!), os restantes homens de combate perderam o norte perante a superioridade técnica portuguesa.

12. O jogo foi intensíssimo, de parada e resposta. Será, certamente, recordado no futuro, na história dos Campeonatos da Europa. Chegámos às meias-finais e agora tudo é possível. O facto de estarmos a jogar cada vez melhor, de jogo para jogo, e, claro, o facto de estarmos a jogar em casa, podem ser trunfos preciosos. Entre Suécia e Holanda, preferia a Holanda, mais ao alcance do jogo português. Os suecos têm um colectivo mais coeso e um ataque quase tão temível como os holandeses. Qualquer um deles será difícil, mas qualquer um deles será possível de bater. Aconteça o que acontecer, Portugal já fez um grande europeu.

13. Contas feitas, Portugal merece 18 (quase, quase 19...); a Inglaterra um 17 (o quarto consecutivo)



Publicado por André 23:01:00  

1 Comment:

  1. Alexandre said...
    já reparaste que nem uma única vez citas o Figo?

Post a Comment