as coisas pelos nomes...

A Nova Justiça
Por EDUARDO DÂMASO
Sábado, 01 de Maio de 2004

Procurando superar os evidentes embaraços que o caso "Apito Dourado" veio criar ao Governo e ao PSD, Durão Barroso tem oscilado entre o silêncio ruidoso e comentários de circunstância sobre uma espécie de nova justiça, que não olha a nome nem condição social e política dos arguidos, e que, supõe-se, terá nascido com o seu Governo.

Não há nenhuma nova justiça criada por este Governo mas, no quadro da luta política, é compreensível que Durão Barroso o insinue porque, na verdade, tem muito pouco a dizer sobre processos judiciais, tendo em conta a separação de poderes consagrada constitucionalmente.

As suas palavras configuram meramente à superfície da conflitualidade partidária uma débil tentativa de apropriação política do facto de meramente existirem investigações judiciais sobre eventuais crimes de corrupção, tráfico de influências, abuso de poder, peculato, nas esferas políticas e económicas mas isso é o que há muito se tornou habitual esperar dos dirigentes políticos, seja qual for o partido que está no poder.

Nestes casos desencadeados pelo "Apito Dourado" e, agora, pela acusação do processo de Felgueiras, as novidades, como já aqui se disse em relação aos dois inquéritos, são outras. A mais grave, no imediato, tem sido o lamentável espectáculo dado por sectores da Polícia Judiciária, incluindo o seu director nacional, e do Ministério Público, que exibem em surdina ou através de outras vozes, a raiva quase incontida de estes serem processos que lhes passaram praticamente à margem, ou seja, não foram por eles controlados.

O processo de Felgueiras, aliás, é um verdadeiro caso de estudo, tal como o "Apito Dourado" ameaça ser. O "saco azul" foi investigado quase contra tudo e contra todos. Com escassos meios humanos e periciais, desbloqueados a ferros, este inquérito só foi mesmo investigado porque andou sempre bem longe de todo o tipo de hierarquias policiais e judiciais. O "Apito Dourado" resultou da plena autonomia da Polícia Judiciária do Porto e só faltava mesmo era que agora viessem dizer que, afinal, só estragou um "processo maior", certamente mergulhado há uns bons anos na opacidade, no mistério, no cinzentismo dos muitos depósitos deste país para processos que aguardam prescrição... Só faltava, também, que os magistrados e os polícias que nele trabalham levassem agora uns processos disciplinares por não terem avisado ao que iam na execução dos mandados de busca e detenção. Em Portugal é assim: quem trabalha só incomoda...

A outra novidade importante é para Durão Barroso. Tal como Cavaco Silva e António Guterres, o actual líder do PSD e primeiro-ministro está confrontado com os tradicionais problemas que os aparelhos partidários colocam: financiamentos de duvidosa legalidade (para sermos generosos...), ligações promíscuas ao futebol e aos empreiteiros, adjudicações de obras públicas "a la carte", cunhas, favores, jeitinhos e toda a espécie de "facilidades" que o Estado concede a quem o domina. É a vida. E é má para todo o líder que se limite a receber o partido em herança e não mude as regras internas de poder e financiamento, que não se desligue das muitas formas de caciquismo que o dominam e da voracidade de poder e benesses dos seus homens. Enquanto assim for, ninguém resistirá a 15 mil horas de escutas telefónicas, e será sempre necessário dizer que um partido não é uma máquina e tem os seus afectos... Topo de Página

Celeste Cardona ainda é Ministra da JustiçaAdelino Salvado e Artur Pereira ainda continuam na PJ e Cândida Almeida ainda paira pelas bandas do DCIAP. Barroso, Arnaut, Ferro, Sócrates e Coelho, e muitos outros ainda continuam a fingir que não se passa nada. Vai passar e, já se começa a ter uma ideia de quando...

Publicado por Manuel 15:07:00  

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