Minority Report

Durão Barroso , concedeu ontem ao único canal generalista da televisão pública, a primeira grande entrevista de 2004. Num ano onde o nome de Portugal irá ter uma enorme exposição mediática em todo o mundo, quer devido ao Euro-2004, quer devido a realização do Rock in Rio, era importante aferir qual a posição do líder governativo, face a questões relacionadas com a segurança, com a robustez da economia, com as Presidenciais.

Durão não é um orador nato, e por vezes transmite uma ideia, que não está suficientemente bem preparado para aflorar assuntos mais técnicos, refugiando-se sempre nos seus ministros. Se por um lado pode ser sinal de maturidade política por outro lado, os tempos distantes de Cavaco Silva no poder, deixam-nos certamente saudades pela forma como este intervinha e não deixava ponto sem nó.

Conjuntura Económica

A economia portuguesa não se encontra neste momento em recessão, mas a robustez e rapidez da retoma, são as questões mais importantes no momento.

Como e bem Manuela Ferreira Leite, referiu a falta de instrumentos de política económica torna cada vez mais dificil mexer numa economia com tantos desiquilibrios. Os sindicatos não percebem que os salarios não podem crescer acima da produtividade, mas continuam a marcar greves as sextas feiras, a função pública continua sem a tão ansiada reforma de fundo, que não implica objectivamente mais desemprego, mas sim uma maior racionalidade dos custos empregues, com consequente aumento de produtividade.

Com a vantagem de ter o défice de 2003, fechado em 2,80 % , e os dois primeiros meses do ano, com uma consolidação orçamental dentro do esperado, mas descendo o défice em termos homologos a 2003, quase 52 %, ainda que por via de situações muito excepcionais que infelizmente não se verificarão no resto do ano, Durão partia com o sentido que qualquer crítica a sua política orçamental seria rebatida pelos números acima. Afinal para a esquerda e para a direita os números são números. Pode muito bem a esquerda espernear com filmes de terceiro escalão, mas passamos de um crescimento da despesa pública corrente de 7,00 % para 3,50 % , ainda assim acima do valor desejado, que seria crescer abaixo da inflação.
A consolidação orçamental é um facto, os efeitos na economia também.

A única falha nesta matéria de conjuntura económica, foi não ter relacionado a inflação com o desemprego. O desemprego que se verificou durante os governos PS foi alimentado artificialmente pelo Estado, a luz da melhor teoria keynesiana de pleno emprego. Neste momento em que se experimenta uma consolidação orçamental, é economicamente preferivel ter uma inflação mais baixa que um desemprego baixo, mas por outro um elevado desemprego, obriga a um maior custo com as remunerações a título de fundo de desemprego e inerentes consequências sociais. Não por ser esta a visão liberal, mas porque uma inflação galopante nesta altura iria eliminar todos os ganhos obtidos e estrangular ainda mais o deteriorado poder de compra.

Segurança

Após os atentados de Madrid, foi prometido um reforço das medidas de segurança em Portugal. As fronteiras essas ao contrário do que agora se escreve já iria ser encerradas a luz do que a Bélgica e a Holanda fizeram no Euro-2000, levantando os acordos de Schengen. Durão aqui esteve perfeito. É que a cedência ao terrorismo é a única resposta que não é possível.

Nenhum país democrático pode permitir que a Al-Qaeda determine a sua política externa. A Espanha, que conhece melhor do que ninguém a cobardia e a imoralidade do terror e que foi exemplar na defesa do seu Estado de Direito contra a ETA, nunca o poderia consentir. Sejam quais forem as críticas à política americana contra o terrorismo, seja qual for o grau de rejeição da guerra no Iraque, da sua inutilidade e das suas consequências, as bombas de Madrid vieram provar - a quem ainda pudesse duvidar - que o terror não distingue entre "bons" e "maus" ocidentais. E que a Europa também é um alvo. O terrorismo islâmico, como qualquer fundamentalismo, odeia o Ocidente porque odeia a democracia, a liberdade individual, a tolerância, as nossas sociedade livres e abertas. Como todos os totalitarismos, como todos os nacionalismos extremos.

O que me preocupa quanto a segurança interna, não são tanto as ameaças reais, mas sim a falta de coordenação visível entre os ministros e organismos responsáveis. Uma boa coordenação garantirá a partida melhores resultados mesmo dentro de uma tragédia, e Portugal não possui nenhum plano deste género, como se viu no Verão passado aquando dos incêndios. Fica o recado.

Privatizações

Esteve no seu melhor e no seu pior. Falou de mais na TAP, falou em alianças globais, mostrou o incomodo pelos resultados terem sido divulgados sem o conhecimento da Administração. Já sabemos que Fernando Pinto está de pedra e cal, e que cumpriu com o prometido há 3 anos atrás, mas quem serão os parceiros da aliança global ?

Faltou quanto a mim a pergunta que se impunha : Passamos de anéis para dedos ? A ideia de o Estado náo possuir terrenos e explorações agricolas nao me escandaliza dai que a alienação da companhia das lezirias não seja de todo impraticável, mas o esquecimento da REN, levantaria questões de posicionamento estrategico muito fortes. Ao seu melhor na defesa da teoria da escolha pública. Um governo deve imuscuir-se da presença massiva na economia, apostou forte na presença do Estado na economia, mas como regulador e não como agente económico. Falta agora passar das palavras aos actos

Investimento

Ao afirmar que que “ao contrário dos velhos do Restelo, dos vencidos da vida e da nossa oposição, os bons empresários e bons investidores nacionais apostam em Portugal” , ficaram no ar os recados para alguns “Continentes” deste país. A API conseguiu em apenas 15 meses cerca de 1250 milhões de euros, e até 2010, 40 % do diferencial da produtividade entre Portugal e a União Europeia virá destes novos investimentos.


Caso Bombardier

Corrigindo as suas declarações da tarde, onde afirmou já saber do desfecho há 1 ano. A Empresa decide fechar porque não é rentável. O Estado não pode apoiar uma empresa privada só porque é o principal cliente da mesma. Contraria todas as regras de mercado.
Afirmou que mais investimentos na area ferroviária vem a caminho, o que mais uma vez contraria a versão da empresa,de que se assistiria uma estagnação do sector em Portugal.
Para já afirma tentar a via diplomática, o que revela uma vontade inerente em resolver o problema.

Congresso e Presidenciais

Durão estava lá como primeiro ministro e não como líder partidário, pelo que deveria ter marcado a diferença, mesmo respondendo as questões. Quanto ao congresso fica a ideia que foi antecipado para que Durão possa sair do mesmo vitorioso e com isso ganhar popularidade a porta das eleições. Na questão presidenciais revelou um distanciamento de Cavaco Silva, que este certamente agradecerá. Não apoiou ninguém mas sabe que Cavaco tem capital para avançar sozinho deixando o PSD na iminência de o apoiar ou concorrer contra ele. Fica mesmo que diga o contrário refém da decisão de Cavaco. Da gestão deste caso pode depender a sua continuidade a frente do PPD/PSD.


De um modo geral, reforçou a ideia que o governo trabalha diariamente em prol do país, teve algumas aproximações a algumas políticas sociais, e assumiu-se entre um democrata moderado e um republicano moderado. Durão Barroso no seu melhor.

Fica no ar a ideia que este Governo poderá levar um abanão caso as eleições europeias não lhe corram de feição. Um resultado positivo irá traduzir-se num acumular de capital, um resultado negativo terá implicitamente uma maior pressão do eleitorado sobre o Governo. E este Governo já mostrou que sobre pressão não funciona bem, mete os pés pelas mãos, diz-se e contradiz-se. Esperemos então por Junho.

Publicado por António Duarte 11:49:00  

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