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quinta-feira, outubro 09, 2003
Ainda há alminhas lúcidas em Portugal ... Miguel Coutinho hoje no Diário Económico é hoje uma delas:
A libertação de Paulo Pedroso será explicável à luz do Direito e da cadeia de recursos que estão à disposição dos arguidos.
Mas, por muito que se invoque o normal funcionamento da Justiça, não deixará de causar perplexidade no cidadão comum que diferentes juízes decidam de forma radicalmente distinta com base na mesma matéria de facto.
No plano jurídico, a passagem de uma medida de coacção máxima – a prisão preventiva – para uma medida de coacção mínima – o termo de identidade e residência – surge como um legítimo exercício de quem aplica a Justiça.
Mas não nos iludamos: numa sociedade que tem motivos recorrentes para descrer do sistema judiciário, a discrepância de critérios e de interpretações, ainda mais quando está em causa a alegada prática de um crime de pedofilia, será facilmente reduzida por uma maioria, numa abordagem simplista mas genuína, como uma pirueta inexplicável.
O Direito não é, por natureza, uma ciência exacta ou infalível. Nem as decisões dos juízes estão isentas de erros processuais ou de falhas de interpretação sobre os factos. Mas um processo de pedofilia, pela sensibilidade e gravidade que comporta, exige um dever de cuidado extremo na avaliação da prova e dos factos.
É neste quadro que a prisão preventiva de Paulo Pedroso durante quatro meses e meio e a sua posterior libertação, independentemente do acerto ou desacerto das decisões, terá efeitos eventualmente devastadores na percepção e na relação de confiança dos cidadãos com a Justiça.

Da mesma forma, a vertigem mediática em torno do caso de pedofilia permitiu excessos e precipitações inaceitáveis. Com a mesma leviandade, criou- -se a convicção de que a prisão preventiva de Paulo Pedroso fazia dele culpado e que a sua libertação poderia ser encarada como uma prova inequívoca da sua inocência. Em ambos os casos, prevaleceram os mesmos instintos básicos, ou nem tanto, de ignorância jurídica e de aproveitamento político.
Há coisas simples e elementares que devem ser lembradas: hoje, ninguém poderá dizer que Paulo Pedroso, ou qualquer outro dos acusados no caso de pedofilia, é culpado ou inocente. É, simplesmente, um arguido. Que tem o direito de ser presumido inocente, mas que terá contra ele, a menos que o sistema tenha enlouquecido, indícios de prática criminosa.
Compreende-se a torrente de emoções que tomou de assalto a quase generalidade do Partido Socialista. As lágrimas de Ferro Rodrigues e as palavras emocionadas de Manuel Alegre, além de genuínas manifestações de solidariedade, devem também ser entendidas num contexto de libertação de um longo pesadelo que diminuiu a direcção do PS e condicionou a capacidade de intervenção política do principal partido da oposição.
Todavia, é bom recordar que Paulo Pedroso ganhou apenas uma batalha jurídica, mas não deixou de ser arguido. E que o PS não registou nenhuma vitória política.
Não há, pois, motivos para festejos. Como não havia, antes, motivo para uma condenação antecipada.

Entretanto Vasco Gonçalves ressuscitou
Este País não tem emenda!
Publicado por Manuel 09:01:00
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